Os desafios de uma viagem espacial são bem diferentes daqueles enfrentados em nossos deslocamentos pelo globo terrestre. Uma das informações mais importantes para os viajantes, tanto no espaço quanto aqui na Terra, é a localização. Por aqui, mesmo antes da invenção do GPS, nossos ancestrais eram capazes de navegar por longas distâncias, quase sem se perderem, utilizando apenas uma bússola e as estrelas. Mas lá fora, a coisa é bem complicada.

Já imaginaram a dificuldade de se localizar em um lugar sem pontos de referência, sem ruas, sem placas e sem sinal de GPS? No espaço, não existe acima nem abaixo, as distâncias são astronômicas e até mesmo a Terra, nosso ponto de referência mais familiar, se torna um pontinho azul distante cercado pela imensidão do vazio cósmico. Então, como nossos cientistas conseguem determinar a localização e a orientação das nossas naves espaciais em suas jornadas pelo cosmos?

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A resposta está em uma combinação fascinante de física, matemática e engenharia de alta precisão. As espaçonaves, mesmo em suas viagens solitárias pelos confins do Sistema Solar, não estão à deriva no espaço. Elas estão sempre orbitando algo, seja a Terra, o Sol, ou um asteroide que está estudando. Até mesmo as Voyagers, que deixaram nosso Sistema Solar, agora estão em órbita do centro da nossa galáxia, a Via Láctea. E para garantir que essas espaçonaves cheguem aos seus destinos, os cientistas precisam traçar trajetórias precisas, monitorá-las constantemente e corrigi-las sempre que necessário.

[ Sondas Voyager, lançadas em 1977, alcançaram os limites do Sistema Solar – Créditos: NASA ]

No coração dessa tarefa monumental está o trabalho da equipe de navegação espacial, que se divide em três áreas principais: o design da trajetória de referência, a determinação da órbita e o controle da trajetória de voo. É como planejar uma viagem de carro: primeiro, você define o destino e traça a rota no mapa (trajetória de referência). Durante a viagem, você precisa saber onde está e se está seguindo o caminho certo (determinação da órbita). E se você sair da rota, precisa fazer correções para voltar ao caminho planejado (controle da trajetória de voo).

A trajetória de referência é o plano de voo da espaçonave, um roteiro detalhado que leva em conta as leis da física, a posição dos planetas, a influência gravitacional do Sol e outros fatores que podem influenciar a viagem. Nós já vimos anteriormente que essa trajetória é a chamada órbita de transferência, calculada a partir das leis da física e da matemática para utilizar da melhor forma a energia gravitacional do Sol.

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Mas, assim como em uma viagem de carro, imprevistos podem acontecer. A espaçonave pode se desviar da rota planejada devido à influência gravitacional de outros corpos celestes, à pressão da radiação solar ou até mesmo a pequenas falhas nos seus sistemas de propulsão. É aí que entra a equipe de rastreamento.

Utilizando dados enviados pela espaçonave, como sinais de rádio e imagens, os cientistas conseguem determinar a posição exata da nave no espaço. Para isso, eles se utilizam principalmente da telemetria. A espaçonave envia sinais de rádio para a Terra, que são captados por antenas gigantes, como as do Deep Space Network, da NASA. A partir da análise destes sinais captados por essas antenas, os cientistas conseguem determinar a distância da espaçonave, a velocidade e a sua direção.

Outra técnica utilizada é a Interferometria de Linha de Base Muito Longa(VLBI). Essa técnica utiliza múltiplas antenas de rádio para observar a espaçonave simultaneamente, combinando os sinais recebidos para obter uma localização ainda mais precisa. É como triangular a posição de um objeto utilizando múltiplos pontos de vista.

[ Ilustração do VLBI utilizado para localização de sondas no espaço – Créditos: NASA ]

E, assim como nossos ancestrais utilizavam as estrelas para se localizar, algumas espaçonaves são equipadas com câmeras que podem capturar imagens de estrelas e planetas. Um sistema de software é capaz de comparar essas imagens com mapas estelares para determinar a orientação da espaçonave no espaço. Essa técnica, chamada de Navegação Óptica, é especialmente útil para missões em que a precisão na orientação da nave é fundamental. Graças à Navegação Óptica, que a sonda DART da NASA, atingiu o pequeno asteroide Dimorphos a cerca de 22 mil quilômetros por hora.

Mas conhecer e manter a orientação de uma sonda durante uma viagem espacial não é importante apenas para missões de precisão. Imaginem, por exemplo, se depois de captar as imagens fantásticas de Saturno e suas Luas, a sonda Cassini não conseguisse apontar suas antenas para a Terra para nos transmitir esses dados preciosos. A orientação correta da nave é fundamental para sua comunicação com a Terra, mas também para a correta captação de dados e realização das suas manobras. 

Para se orientar no espaço, as espaçonaves utilizam uma combinação de sensores, como giroscópios, acelerômetros e sensores estelares. Os giroscópios medem a rotação da nave, os acelerômetros medem as mudanças na sua velocidade e os sensores estelares identificam estrelas conhecidas, como se fossem pontos de referência no céu. Com base nesses dados, o sistema de controle de atitude da espaçonave ajusta a sua orientação utilizando pequenos propulsores ou rodas de reação, garantindo que a nave esteja sempre “olhando” para a direção correta.

[ Ilustração da sonda Cassini em órbita de Saturno – Créditos: NASA ]

Esses métodos, combinados com softwares de navegação espacial cada vez mais sofisticados, permitem aos cientistas guiar nossas espaçonaves com precisão milimétrica em suas jornadas pelo cosmos. É como ter um GPS interplanetário, capaz de nos levar aos confins do Sistema Solar e além.

E assim, guiados pelas estrelas como nossos ancestrais há milhares de anos, navegamos agora pelos oceanos cósmicos. A conquista do espaço é um testemunho da engenhosidade humana, da nossa incansável busca por desvendar os mistérios do universo e da nossa capacidade de utilizar a ciência para alcançar o que antes parecia impossível. Cada sinal de rádio recebido de uma espaçonave distante, cada imagem capturada de um planeta longínquo, cada manobra realizada com precisão milimétrica, nos aproxima um pouco mais da compreensão do nosso lugar na vastidão do Cosmos.—