Em cavernas de calcário sob uma floresta no México, lagos escuros como breu abrigam os chamados peixes cegos das cavernas – animais que nascem com olhos vestigiais, que desaparecem à medida que crescem, deixando órbitas oculares preenchidas por gordura e cobertas de escamas.

Segundo um estudo publicado este mês na revista Communications Biology, essa não é a única transformação facial peculiar que esses animais podem experimentar ao longo da vida. Quando eles nascem, suas papilas gustativas são semelhantes às dos seus parentes próximos da superfície, no entanto, à medida que crescem, elas começam a se espalhar para outras áreas, como o rosto e o queixo.

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Peixe cego das cavernas. Crédito: Andrew Higley/UC Marketing + Brand

Os peixes cegos das cavernas não são considerados uma espécie distinta, apesar de sua aparência peculiar. Eles pertencem à mesma espécie do tetra mexicano (Astyanax mexicanus), um peixe que habita riachos e rios próximos à superfície. 

Enquanto os tetras de superfície possuem escamas prateadas e olhos grandes e redondos, os peixes das cavernas são pálidos e sem olhos. Apesar das diferenças físicas, as duas populações permanecem geneticamente semelhantes e podem se cruzar, produzindo descendentes férteis.

Peixes de superfície colonizaram cavernas

Pesquisas anteriores sugerem que as características das cavernas surgiram várias vezes através da evolução convergente, em que peixes de superfície colonizaram diferentes cavernas, formando populações isoladas que se adaptaram de maneira semelhante às condições escuras. 

A perda de olhos nesses animais é um exemplo clássico de evolução regressiva, que ocorre frequentemente em espécies que habitam cavernas. Embora muitas criaturas cavernícolas desenvolvam sentidos não visuais aprimorados, pouco se sabe sobre como esse processo ocorre.

Micrografia confocal de um embrião cego de peixe das cavernas. Crédito: Monica Folgueira e Steve Wilson/Creative Commons

Em um comunicado, Joshua Gross, biólogo da Universidade de Cincinnati, nos EUA, e autor sênior do estudo, destaca que, enquanto a perda de visão e pigmentação é bem documentada, as bases biológicas para o desenvolvimento de novas características sensoriais ainda são pouco compreendidas.

A descoberta de papilas gustativas adicionais na cabeça e no queixo dos peixes cegos das cavernas foi feita na década de 1960, mas até recentemente, pouco se sabia sobre os mecanismos genéticos ou de desenvolvimento por trás desse fenômeno. 

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Pesquisa focou em duas cavernas no nordeste do México

No novo estudo, os pesquisadores focaram em duas populações, das cavernas Pachón e Tinaja, na Sierra de El Abra, no nordeste do México. Eles queriam entender quando essas papilas gustativas extras surgem ao longo da vida dos peixes.

As observações indicaram poucas diferenças entre os peixes de superfície e os peixes das cavernas nos primeiros quatro meses de vida. No entanto, por volta dos cinco meses, os peixes das cavernas começaram a apresentar um aumento significativo no número e na distribuição das papilas gustativas, que se espalharam da boca para a cabeça e o queixo. Esse processo continuou até a idade adulta, com alguns peixes ainda desenvolvendo novas papilas gustativas após 18 meses.

Esses peixes podem viver bem mais que isso, tanto na natureza quanto em cativeiro, e possivelmente continuam a desenvolver papilas gustativas à medida que envelhecem. Além de oferecer perspectivas sobre a biologia desses peixes, o estudo também contribui para a compreensão mais ampla da evolução e desenvolvimento dos órgãos sensoriais.