Nos últimos meses, gigantes da tecnologia como Google, Microsoft e Amazon têm adotado abordagens inovadoras para garantir os melhores talentos e tecnologias de startups de inteligência artificial (IA) sem efetivamente adquirir essas empresas.

Em vez de comprar as startups, essas Big Techs estão licenciando suas tecnologias e contratando seus principais funcionários, em uma estratégia que evita o escrutínio de órgãos reguladores e, ao mesmo tempo, permite que elas se posicionem na corrida pela liderança em IA.

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O caso da Character.AI e Google

Um exemplo notável dessa estratégia é o acordo entre o Google e a Character.AI, uma startup fundada por ex-funcionários do próprio Google, Noam Shazeer e o brasileiro Daniel de Freitas. Após deixarem a empresa por acreditarem que ela se movia lentamente no desenvolvimento de IA, Shazeer e De Freitas fundaram a Character.AI, que rapidamente atraiu investimentos de quase US$ 200 milhões.

Recentemente, os fundadores da Character.AI anunciaram seu retorno ao Google, junto com cerca de 20% dos funcionários da startup, em um acordo que também inclui o licenciamento da tecnologia desenvolvida pela Character.AI.

logo da Character.IA
Relação entre Google e Character.IA é exemplo da estratégia de ação das big techs. (Imagem: Ascannio / Shutterstock.com)

Contudo, o Google não comprou a startup. Em vez disso, a empresa concordou em pagar US$ 3 bilhões para licenciar a tecnologia, sendo que US$ 2,5 bilhões dessa quantia serão usados para comprar as ações dos investidores da Character.AI. O que restar da startup continuará operando sem seus fundadores e investidores.

Leia mais:

Investir em startups de IA sem adquirir é a estratégia das big techs

  • O Google não é o único gigante da tecnologia a adotar essa tática. A Microsoft e a Amazon também fizeram movimentos semelhantes.
  • Em março, a Microsoft pagou mais de US$ 650 milhões para licenciar a tecnologia da startup de IA Inflection e contratar quase todos os seus funcionários, incluindo o fundador Mustafa Suleyman, que agora lidera os negócios de IA de consumo da Microsoft.
  • Da mesma forma, a Amazon fechou um acordo com a Adept, outra startup de IA, trazendo para seus quadros muitos dos funcionários, incluindo o fundador David Luan, por mais de US$ 330 milhões.
  • Parte significativa desse valor foi usada para reembolsar os investidores da Adept, que haviam aportado US$ 414 milhões na empresa.
  • Esses acordos não tradicionais são impulsionados pelo desejo das Big Techs de evitar o escrutínio regulatório em um momento em que estão sob intensa vigilância de órgãos como a Federal Trade Commission (FTC) dos EUA e a Autoridade de Concorrência e Mercados do Reino Unido.
  • Essas entidades estão investigando se essas gigantes estão sufocando a concorrência ao adquirirem startups de forma direta.
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Amazon e Adept entraram em mais um acordo que não resultou em uma aquisição. (Imagem: T. Schneider / Shutterstock.com)

Impacto nas startups e investidores

Esses acordos têm gerado retornos rápidos para investidores e proporcionado recursos substanciais para os fundadores das startups, mas também deixaram para trás funcionários que não participaram dos lucros desses acordos. Muitos funcionários das startups envolvidas nesses acordos continuam trabalhando em entidades corporativas “órfãs”, onde os fundadores e investidores já seguiram em frente.

O futuro dessas startups é incerto. Algumas, como a Character.AI e a Adept, passaram a operar sob novas lideranças e buscam novas oportunidades de licenciamento de suas tecnologias. Outras, como a Inflection, foram quase completamente absorvidas pelas gigantes da tecnologia, deixando poucos funcionários na empresa original.

O aumento desses acordos não tradicionais indica que mais startups de IA podem seguir esse caminho à medida que enfrentam dificuldades para competir com as grandes empresas de tecnologia. O resultado é um ecossistema em que fundadores e investidores podem se beneficiar rapidamente, enquanto funcionários e a própria estrutura do Vale do Silício podem enfrentar desafios para manter seu dinamismo e inovação.