Muitos astrônomos aguardam, com ansiedade, a chegada desta época do ano. É que esse é o melhor momento para usarmos nossos melhores telescópios para dar uma espiada em nossa vizinha mais bela e misteriosa. É claro que eu estou falando da Galáxia de Andrômeda! A galáxia espiral mais próxima da Via Láctea, é um objeto de estudo fascinante, que nos ajuda a desvendar os segredos do Universo e a compreender melhor a nossa própria galáxia. Nossa vizinha cósmica é cheia de mistérios e curiosidades que intrigam cientistas, e já esteve no centro de algumas das mais importantes descobertas da Astronomia. 

Andrômeda é uma verdadeira celebridade no mundo da astronomia, tanto entre os profissionais quanto entre amadores. A “apenas” 2,5 milhões de anos-luz de distância, e com cerca de 200 mil anos-luz de diâmetro, ela se torna um alvo fácil para telescópios, mesmo os mais modestos, proporcionando um espetáculo visual de tirar o fôlego. É importante dizer que observar Andrômeda é como contemplar uma janela para o passado. Graças à distância em que ela está de nós, a musa que observamos por essa janela, hoje está uns 2 milhões e 500 mil anos mais velhinha. Mas certamente, continua linda!

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[ Galáxia de Andrômeda ou Messier 31 registrada por um astrônomo amador – Créditos: Kanwar Singh ]

Assim como a Via-Láctea, Andrômeda é uma galáxia espiral barrada, o que significa que ela é formada por braços espirais unidos por uma estrutura central em forma de barra. Só que Andrômeda é uma gigante quando comparada à nossa galáxia, tem mais que o dobro do tamanho e cerca de um trilhão de estrelas, contra “apenas” 400 bilhões da Via Láctea. É a maior galáxia do Grupo Local, mas nossa vizinha é “saradona”, sendo apenas um pouco mais massiva que a Via Láctea.

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O mais antigo registro de Andrômeda ocorreu no século X, quando o astrônomo persa al-Sufi descreveu em seu “Livro das Estrelas Fixas”, uma uma “pequena nuvem” no céu, na direção da Constelação de Andrômeda. Notem que al-Sofi observou a galáxia bem antes da invenção do telescópio. Sim, a Galáxia de Andrômeda é uma das poucas galáxias visíveis a olho nu. Só que sem o auxílio de instrumentos ópticos, nossa vizinha é vista apenas como uma manchinha. Tanto que até 100 anos atrás, ela era conhecida como “Grande Nebulosa de Andrômeda”.

[ Primeiro registro da Galáxia de Andrômeda, representada como um aglomerado de pequenas estrelas e descrito como uma nebulosidade no desenho da Constelação de Andrômeda de Al-Sufi – Imagem: Bodleian Library, Oxford ]

Em 1924, o astrônomo Edwin Hubble, utilizando o então maior telescópio do mundo, o telescópio Hooker de 2,5 metros, conseguiu observar estrelas individuais e identificar  algumas variáveis cefeidas naquela nuvem. Elas foram a chave para que Hubble, utilizando o método desenvolvido por Henrietta Leavitt, medisse a distância de Andrômeda. Ele concluiu, de forma decisiva, que aquele objeto não era um aglomerado de estrelas e gases dentro da nossa Via Láctea, mas sim uma galáxia inteiramente independente a uma distância significativa da nossa. Essa descoberta revolucionou a astronomia, expandindo nossa visão do Cosmos, e foi fundamental para o desenvolvimento do conceito de um universo em expansão, levando à formulação da teoria do Big Bang.

Esse amor por nossa vizinha espacial pode até parecer platônico, meio à distância, mas é por “pouco tempo”. Estudos mostram que existe uma atração correspondida entre Andrômeda e Via Láctea. As duas galáxias se aproximam a uma velocidade de 110 quilômetros por segundo, o que pode nos levar a um encontro caloroso daqui uns 4 bilhões de anos. 

Tecnicamente, esse encontro é chamado de “colisão” ou “fusão” de galáxias. Mas calma, pessoal, não precisa entrar em pânico, nem comprar um capacete galáctico! Colisões entre galáxias são eventos relativamente comuns no Universo. Andrômeda e a própria Via Láctea são resultados de colisões entre outras galáxias menores no passado. Devido ao enorme vazio entre as estrelas, elas não devem se chocar durante a colisão de suas galáxias. Invés disso, o que deve ocorrer é uma majestosa dança gravitacional, com as estrelas das duas galáxias se misturando e se reorganizando, formando uma nova e gigantesca galáxia, que alguns astrônomos já apelidaram de “Milkomeda”!

[ Série de imagens que simulam a colisão entre as galáxias de Andrômeda e Via Láctea vista da Terra – Créditos: NASA; ESA; Z. Levay, R. van der Marel, STScI; T. Hallas, A. Mellinger ]

Seria uma visão incrível se pudéssemos ver a Galáxia de Andrômeda se aproximando e se fundindo com a Via Láctea. Mas tem um problema… É que mesmo que a humanidade não se auto-destrua nem inviabilize a vida na Terra até lá, nosso Sol provavelmente terá feito isso. Em 4 bilhões de anos, o Sol já deverá ter chegado à sua fase de Gigante Vermelha e transformado o nosso planeta num inferno. Então, se ainda existir, a humanidade ou qualquer civilização que tenha herdado a nossa paixão pelo Universo, terá que assistir a esse fabuloso encontro galáctico, de um novo lar em Marte ou em alguma lua de Júpiter.

Além disso, estudos recentes, sugerem que essa colisão pode não acontecer tão cedo quanto se pensava. Observações realizadas com o telescópio espacial Gaia, da Agência Espacial Europeia, indicam que Andrômeda está se movendo de forma mais lenta e em uma direção ligeiramente diferente do que se estimava anteriormente. Isso significa que a colisão pode acontecer em um futuro ainda mais distante, talvez daqui a 6 bilhões de anos, ou até mesmo que as duas galáxias apenas passem “raspando” uma da outra, sem se fundirem completamente.

Há séculos a humanidade se apaixonou por essa manchinha esfumaçada no céu. E desde que contemplamos sua magnífica silhueta através de telescópios, não pudemos deixar de nos maravilhar com o mistério e a grandiosidade que ela representa. A galáxia de Andrômeda nos fascina não só pela sua beleza, mas por tudo que ela revela sobre o Universo, e pelo futuro que ela nos propõe. Por enquanto, seguimos espiando a nossa vizinha cósmica, sonhando com o encontro futuro entre nossas galáxias. Um encontro marcado, mas para um tempo tão distante que a humanidade, como a conhecemos, provavelmente não estará mais aqui para testemunhar.