Novas evidências sugerem que a Lua pode ter sido vulcanicamente ativa muito mais recentemente do que se imaginava – e talvez ainda seja. Pequenas contas de vidro encontradas na superfície lunar, trazidas à Terra pela China com a missão Chang’e 5 em 2020, revelaram traços dessa atividade vulcânica, levantando questionamentos sobre a evolução geológica da Lua.

Estudos anteriores já indicavam que o satélite teve vulcanismo em seu passado distante. As áreas escuras que formam a ilusão do “Homem na Lua”, região composta por grandes planícies vulcânicas (mares lunares), se consolidaram entre três e 3,8 bilhões de anos atrás – e, por muito tempo, pensava-se que essa era a última vez que o astro havia sido vulcanicamente ativo. 

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No entanto, as amostras da missão Chang’e 5 trouxeram uma nova perspectiva, sugerindo erupções vulcânicas ocorridas há apenas 123 milhões de anos, com uma margem de incerteza de 15 milhões de anos.

A cápsula de retorno Chang’s 5 da China com amostras da lua é vista após o pouso na Mongólia Interior, China, em 17 de dezembro de 2020. (Crédito da imagem: CASC)

Esse período pode parecer antigo em termos humanos, mas no contexto geológico, é bastante recente. Isso sugere que a Lua pode ter permanecido ativa ao longo de sua história e, potencialmente, ainda estar em atividade vulcânica. 

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A descoberta foi feita a partir de três pequenas contas de vidro, de um total de três mil, encontradas em 1,7g de amostras de solo lunar. Essas contas foram cuidadosamente analisadas por uma equipe liderada por Bi-Wen Wang e Qian Zhang, do Instituto de Geologia e Geofísica da Academia Chinesa de Ciências, em Pequim. Os resultados foram publicados este mês na revista Science.

De acordo com o estudo, essas contas de vidro podem se formar de duas maneiras. A mais comum é por meio de impactos de asteroides, quando a rocha derrete e se transforma em vidro devido à intensa pressão. Isso é visível nas inúmeras crateras lunares.

Apresentação da cápsula Chang’e-5 após reentrada na Terra carregando amostras lunares. Crédito: Shanshan/Shutterstock

Há também contas que podem se formar a partir de erupções vulcânicas, e essas já foram observadas em amostras anteriores. A novidade trazida pela missão chinesa é que as contas de origem vulcânica descobertas datam de uma época geologicamente mais recente, o que desafia as teorias anteriores sobre o resfriamento do interior lunar.

A equipe utilizou a técnica de datação por urânio-chumbo para determinar a idade dessas contas vulcânicas. Esse método mede a proporção de urânio que se transformou em chumbo, um processo que ocorre ao longo de milhões de anos. Quanto maior a quantidade de chumbo presente, mais antiga é a amostra.

Técnicos removem o recipiente de amostra da espaçonave Chang’e 5 da China, que coletou poeira e rochas da Lua, trazendo à Terra em dezembro de 2020. Crédito: Observatórios Astronômicos Nacionais/CAS

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Outras evidências reforçam essa nova visão da atividade vulcânica lunar. Em 2014, o Lunar Reconnaissance Orbiter (LRO), da NASA, identificou cerca de 70 formações chamadas “manchas irregulares de mare” (IMPs, na sigla em inglês), que são áreas vulcânicas suaves e redondas. Algumas dessas formações são estimadas em menos de 100 milhões de anos, com a possibilidade de serem até mais jovens, com apenas 50 milhões de anos. Essas áreas demonstram uma atividade vulcânica muito mais recente do que se pensava.

Embora os IMPs tenham sugerido um vulcanismo mais recente, as contas de vidro trazidas pela Chang’e 5 fornecem uma evidência ainda mais concreta. Isso contraria os modelos anteriores que previam que o interior da Lua teria esfriado completamente após sua formação, há cerca de 4,5 bilhões de anos. 

A equipe de pesquisadores propõe que a presença de elementos geradores de calor, como potássio, tório e lantânio, pode ter contribuído para a manutenção do vulcanismo lunar em certas regiões, ao gerar calor suficiente para derreter rochas no manto lunar.

Relatos de “fenômenos lunares transitórios” (TLP), como luzes e névoas vistas na superfície lunar por astrônomos, podem agora ter uma explicação plausível. A liberação de gases vulcânicos, antes descartada, pode ser uma das causas desses fenômenos, considerando a nova evidência de atividade geológica recente.

Ainda que muitas questões permaneçam sem resposta, esse estudo sugere que a Lua pode não estar tão geologicamente inerte quanto se pensava. Se confirmado, o vulcanismo lunar poderia até mesmo ser aproveitado por futuros astronautas em missões de colonização.