A NASA anunciou nesta quarta-feira (10) que o rover o Perseverance encontrou possíveis indícios de vida passada em Marte. Autoridades da agência revelaram os detalhes sobre essa descoberta em uma coletiva de imprensa. A pesquisa foi publicada na revista Nature.
Em um comunicado prévio, a agência havia informado que o evento traria novidades sobre uma amostra de rocha coletada pelo rover em julho de 2024 na Cratera Jezero, região que ele vem investigando desde que pousou no planeta, em 2021. Esse local é considerado um dos mais promissores para buscar sinais de vida antiga no Planeta Vermelho – e agora novas descobertas chamam atenção.
Segundo o artigo, o rover encontrou minerais curiosos na borda oeste de Jezero, em uma área chamada Neretva Vallis, um antigo vale do rio que, bilhões de anos atrás, transportava água para dentro da cratera. Esses minerais aparecem em rochas ricas em argila, que na Terra estão frequentemente ligadas à presença de matéria orgânica, substância relacionada a organismos vivos.

Estes são os sinais mais fortes até agora de vida antiga em Marte
A conferência contou com a participação de Sean Duffy, administrador interino da NASA, Nicky Fox, administradora associada de missão científica, Lindsay Hays, cientista sênior de exploração de Marte, Katie Stack Morgan, cientista do projeto Perseverance, e Joel Hurowitz, cientista planetário da Universidade Stony Brook.
Embora as descobertas representem um dos sinais mais fortes até agora de vida antiga em Marte, isso ainda não é uma prova direta. Segundo os cientistas, são necessárias análises mais profundas para entender se esses minerais são “bioassinaturas” ou resultado de processos químicos não biológicos.
Ainda assim, a descoberta é importante, ao mostrar que Marte já passou por reações químicas complexas, orgânicas ou não, indicando que o planeta teve condições capazes de criar composições minerais sofisticadas. Esse tipo de informação ajuda a reconstruir a história de Marte e aumenta a compreensão sobre seu passado geológico e potencial para vida.
“Esta descoberta é o resultado direto do esforço da NASA para planejar, desenvolver e executar estrategicamente uma missão capaz de entregar exatamente este tipo de ciência – a identificação de uma potencial bioassinatura em Marte”, disse Nicky Fox.
Segundo ela, “com a publicação deste resultado revisado por pares, a NASA disponibiliza estes dados à comunidade científica em geral para estudos mais aprofundados, a fim de confirmar ou refutar o seu potencial biológico.”
Rover encontra minerais intrigantes no “Anjo Brilhante”
Os minerais mais intrigantes foram encontrados na formação chamada “Bright Angel” (o Anjo Brilhante), na margem norte de Neretva Vallis. Dentro dessa área, um afloramento rochoso chamado Cataratas de Cheyava chama a atenção por suas manchas pequenas e pontilhadas, parecidas com sementes de papoula ou pele de leopardo.

“Essas manchas são uma grande surpresa. Na Terra, características assim costumam estar associadas a fósseis de microrganismos subterrâneos”, disse David Flannery, astrobiólogo da Universidade de Tecnologia de Queensland, na Austrália.
“A combinação de compostos químicos que encontramos na formação Bright Angel pode ter sido uma rica fonte de energia para o metabolismo microbiano”, disse Hurowitz. Segundo o cientista, se existiram microrganismos, eles poderiam ter usado os elementos da rocha – carbono orgânico, enxofre e fósforo – como fonte de energia.
Em julho de 2024, o Perseverance perfurou as Cataratas de Cheyava, coletando uma amostra chamada Cânion Safira (a 25ª amostra recolhida pelo rover). “Descreveria essa amostra como misteriosa. Vemos sinais de química que podem envolver compostos orgânicos, mas não sabemos ainda se indicam vida ou processos puramente químicos”, afirmou Morgan Cable, cientista da equipe, na época.

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Na coletiva de imprensa, as autoridades da NASA explicaram que a formação Bright Angel apresenta nódulos e partículas enriquecidas em fosfato e sulfeto de ferro, minerais associados a carbono orgânico. Essas substâncias parecem ter se formado após a deposição de sedimentos, em condições de baixa temperatura, possivelmente por reações químicas chamadas redox, em que ocorre transferência de elétrons entre elementos químicos.
Segundo os pesquisadores, na Terra microrganismos reduzem sulfatos a sulfetos em lagos frios e sem oxigênio, e algo semelhante poderia ter ocorrido em Marte há bilhões de anos, caso micróbios antigos estivessem presentes na Cratera de Jezero.
Além disso, as manchas esverdeadas observadas na argila podem conter vivinita, e as áreas em marrom ou preto, greigita, minerais que ajudam a entender melhor essas reações químicas. No nosso planeta, a vivianita aparece em sedimentos, turfeiras e ao redor de matéria orgânica em decomposição, enquanto a greigita pode ser formada por microrganismos.
A presença conjunta desses minerais sugere que reações químicas entre a matéria orgânica e o sedimento possam ter produzido energia, como fariam micróbios vivos. Porém, esses minerais também podem surgir de processos chamados abióticos (sem vida), como altas temperaturas ou acidez.
Recuperação das amostras para análise na Terra enfrenta desafios
Os autores do estudo ressaltam que trazer amostras como a Cânion Safira seria a melhor forma de compreender os processos químicos e avaliar a presença de compostos orgânicos. “Análises em laboratórios na Terra podem revelar se Marte teve química pré-biótica (e até biológica), aumentando nossa compreensão sobre a possibilidade de vida em outros mundos”, concluem os cientistas.

Apesar da empolgação, há um limite: para confirmar qualquer evidência de vida, as amostras precisam ser trazidas à Terra. O programa de Retorno de Amostras de Marte da NASA ainda enfrenta desafios complexos de logística e orçamento. Até lá, os cientistas dependem da análise remota feita pelo rover, que, embora poderosa, não substitui estudos em laboratórios terrestres.
Com essas descobertas, Marte se mantém como um dos lugares mais fascinantes e promissores do Sistema Solar para a busca de vida antiga, e cada nova amostra aumenta a esperança de respostas para uma das perguntas mais antigas da humanidade: será que já existiu vida em outro planeta?