Algo está mudando no primeiro buraco negro fotografado na história

Observações mostram que a polarização dos campos magnéticos ao redor do buraco negro se inverteu ao longo de quatro anos
Rodrigo Mozelli16/09/2025 17h19, atualizada em 16/09/2025 18h43
A primeira imagem de um buraco negro já capturada pela humanidade mostra um anel de plasma girando em torno do M87.*
A primeira imagem de um buraco negro já capturada pela humanidade mostra um anel de plasma girando em torno de M87.* (Imagem: Event Horizon Telescope)
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O Telescópio Horizonte de Eventos (EHT, na sigla em inglês) divulgou novas imagens surpreendentes do buraco negro supermassivo localizado no centro da galáxia M87. Conhecido como M87*, o objeto foi o primeiro buraco negro já fotografado pela humanidade, em abril de 2019, e, agora, revela mudanças que intrigam os cientistas.

As observações mostram que a polarização dos campos magnéticos ao redor do buraco negro se inverteu ao longo de quatro anos. Localizado a cerca de 55 milhões de anos-luz da Terra, o M87* também apresenta sinais característicos de um jato de matéria emergindo de sua região, cuja base está conectada ao anel brilhante que circunda o horizonte de eventos.

Imagens do buraco negro supermassivo no coração da galáxia M87, obtidas pelo Telescópio Horizonte de Eventos, mostram a mudança de polarização do seu campo magnético
Imagens do buraco negro supermassivo no coração da galáxia M87, obtidas pelo Telescópio Horizonte de Eventos, mostram a mudança de polarização do seu campo magnético (Imagem: EHT Collaboration)

“O fato de o padrão de polarização ter mudado de direção entre 2017 e 2021 foi totalmente inesperado”, afirmou Jongho Park, pesquisador da Kyunghee University (Coreia do Sul), em comunicado. “Isso desafia nossos modelos e mostra que ainda há muito que não entendemos perto do horizonte de eventos.”

O que as novas imagens revelam sobre o buraco negro?

  • As imagens revelam que, em 2017, o anel de plasma superaquecido e altamente magnetizado girava em uma direção, estabilizou-se em 2018 e, em 2021, passou a espiralar no sentido oposto;
  • Apesar disso, o tamanho do anel permaneceu consistente ao longo dos anos, confirmando a previsão da Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein;
  • “O que é notável é que, enquanto o tamanho do anel se manteve estável, o padrão de polarização mudou significativamente”, destacou Paul Tiede, co-líder da equipe e astrônomo do Center for Astrophysics | Harvard & Smithsonian;
  • “Isso nos mostra que o plasma magnetizado próximo ao horizonte de eventos está longe de ser estático; é dinâmico e complexo, levando nossos modelos teóricos ao limite.”

Os cientistas acreditam que a reversão possa estar ligada à estrutura magnética do plasma, combinada com efeitos externos. Além disso, as novas imagens permitiram observar pela primeira vez, com o EHT, a base do jato de partículas emitido pelo M87*. Esses jatos, que viajam a velocidades próximas à da luz, têm papel fundamental na formação e evolução das galáxias ao injetarem grandes quantidades de energia em seu ambiente.

Novas imagens de M87* mostram os campos magnéticos ao redor do buraco negro girando em uma direção em 2017 e depois em outra em 2021
Novas imagens de M87* mostram os campos magnéticos ao redor do buraco negro girando em uma direção em 2017 e depois em outra em 2021 (Imagem: colaboração EHT)

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Evolução na captura das imagens

As mudanças também refletem a evolução do próprio EHT. A imagem final, capturada em 2021, apresenta maior nitidez graças à inclusão de dois novos telescópios: o Kitt Peak, no Arizona (EUA) e o Northern Extended Millimeter Array (NOEMA), na França. Ao todo, a rede do EHT conta com 25 instrumentos baseados na Terra e no Espaço.

“Esses resultados mostram como o EHT está se tornando um observatório científico completo, capaz não apenas de produzir imagens sem precedentes, mas de construir uma compreensão progressiva e coerente da física dos buracos negros”, afirmou Mariafelicia De Laurentis, cientista do EHT e astrônoma da Universidade de Nápoles Federico II (Itália).

Segundo a equipe, futuras imagens do EHT devem ser ainda mais detalhadas, graças a melhorias em dois de seus telescópios: o Greenland Telescope e o James Clerk Maxwell Telescope. “Ano após ano, aprimoramos o EHT — com novos telescópios, instrumentação atualizada, novas ideias para explorações científicas e algoritmos inovadores para extrair mais dos dados”, explicou Michael Janssen, co-líder do projeto e pesquisador da Universidade Radboud (Holanda).

Esta animação mostra como a imagem polarizada de M87* em diferentes épocas dependeria do ângulo de um polarizador hipotético colocado em frente ao buraco negro (Imagem: Colaboração EHT [2025]; Animação: I. Martí-Vidal [Univ. Valência])

“Para este estudo, todos esses fatores se combinaram de forma ideal, trazendo novos resultados e novas perguntas que certamente nos ocuparão por muitos anos.”

Os resultados da pesquisa foram publicados na edição de agosto da revista Astronomy & Astrophysics.

Rodrigo Mozelli é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) e, atualmente, é redator do Olhar Digital.