Fezes de 1.000 anos são ‘cápsulas do tempo’ de povos antigos

Pesquisa identificou uma gama diversificada de parasitas intestinais, muitos deles nunca haviam sido detectados em fezes antigas
Por Bruna Barone, editado por Bruno Capozzi 23/10/2025 07h30, atualizada em 23/10/2025 08h02
fezes mexico
Fezes antigas são uma fonte valiosa de informações sobre parasitas intestinais de populações passadas (Imagem: Johnica Winter/Divulgação)
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Pesquisadores da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, identificaram patógenos que assolaram os antigos povos mexicanos a partir da análise de DNA presente em fezes secas datadas de mais de 1.000 anos atrás. As dez amostras foram coletadas na Caverna dos Meninos Mortos (La Cueva de Los Muertos Chiquitos), no Vale do Rio Zape, no México, escavada em 1957 e 1960.

Fezes antigas são uma fonte valiosa de informações sobre parasitas intestinais de populações passadas, práticas alimentares, migração humana e exposição a patógenos. Sabe-se que o DNA microbiano sobrevive em amostras, mas a análise de fezes antigas tem sido historicamente limitada pela degradação do DNA ao longo do tempo. No caso da caverna, a baixa umidade ajudou a preservar os fósseis.

“Trabalhar com essas amostras antigas foi como abrir uma cápsula do tempo biológica, com cada uma revelando insights sobre a saúde humana e a vida diária de mais de mil anos atrás”, disse Drew Capone, um dos autores do artigo publicado no periódico de acesso aberto PLOS One.

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DNA microbiano sobrevive em amostras de fezes fossilizadas (Imagem: Patrick Hatt/iStock)

O que foi descoberto?

A pesquisa identificou uma gama diversificada de parasitas intestinais, muitos deles nunca haviam sido detectados em fezes antigas, como o protozoário Blastocystis e diversas cepas da bactéria E. coli.

A maioria das amostras continha patógenos, incluindo oxiúros, um dos vermes mais comuns no intestino humano – há um debate sobre se outros helmintos além do oxiúro estavam circulando entre as pessoas nas Américas antes do início da troca colombiana em 1492, sem conclusões definitivas.

A alta prevalência de parasitas intestinais nesta amostra pode indicar que infecções intestinais e saneamento precário eram comuns entre o povo de Loma San Gabriel, que vivia na região na época.

No entanto, os autores observam que este é um estudo limitado, que analisou apenas dez amostras e teve como alvo uma lista restrita de patógenos bem estudados. Pesquisas futuras com amostras maiores poderão fornecer uma avaliação mais completa dos patógenos que assolavam culturas antigas.

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Alta prevalência de parasitas intestinais pode indicar saneamento precário na região do Vale do Rio Zape (Imagem: New Africa/Shutterstock)

Além disso, o artigo oferece uma prova de conceito para o uso de análises de DNA de última geração para identificar parasitas intestinais de populações humanas passadas. O fato de alguns desses patógenos serem específicos de humanos, incluindo oxiúros e Shigella, também corrobora essas análises como um método para distinguir fezes humanas dos dejetos de outras espécies.

“Há um grande potencial na aplicação de métodos moleculares modernos para subsidiar estudos do passado”, afirmou Joe Brown, um dos autores. “Ensaios direcionados, altamente sensíveis e específicos, podem complementar abordagens de sequenciamento quando alvos específicos são de interesse. Estamos ansiosos para continuar este trabalho colaborativo para entender melhor a presença e o movimento de patógenos em amostras antigas.” 

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Passado reescrito

O fóssil fecal humano mais antigo de que se tem conhecimento é datado de 50.000 anos atrás e foi encontrado em um sítio arqueológico a céu aberto chamado El Salt, em Alicante, Espanha. A descoberta ajudou a compreender a dieta dos neandertais, que viveram de cerca de 230.000 a 30.000 anos atrás. 

Historicamente, o homem das cavernas é retratado como um supercarnívoro – uma imagem que se desenhou a partir da descoberta de ossos de carne abatidos e ferramentas de caça em sítios arqueológicos, bem como análises químicas de dentes fossilizados. Era também uma estratégia para manter seus metabolismos acelerados e sobreviver nos climas gélidos do norte da Europa e da Ásia.

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Fóssil fecal humano mais antigo de que se tem conhecimento é datado de 50.000 anos atrás (Imagem: Reprodução)

No entanto, um artigo publicado em 2014 sobre as amostras da Espanha mostrou não apenas subprodutos químicos criados por bactérias no intestino na digestão do colesterol da carne, mas também esteróis e estanóis, que são lipídios em plantas semelhantes ao colesterol. O estudo envolveu pesquisadores da Universidade de La Laguna e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).

Bruna Barone
Colaboração para o Olhar Digital

Bruna Barone é formada em Jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero. Atuou como editora, repórter e apresentadora na Rádio BandNews FM por 10 anos. Atualmente, é colaboradora no Olhar Digital.

Bruno Capozzi é jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero e mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP, tendo como foco a pesquisa de redes sociais e tecnologia.