Nvidia: jornal revela bastidores do “não” de Trump à China

Decisão teria sido tomada pouco antes de reunião entre presidente dos EUA e o líder chinês, Xi Jinping
Rodrigo Mozelli03/11/2025 22h01
Bandeira da China ao fundo com uma mão segurando um smartphone que mostra, em sua tela, o logo da Nvidia
Pequim está impedida de adquirir chips Blackwell da gigante dos EUA (Imagem: Saulo Ferreira Angelo/Shutterstock)
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Autoridades do governo Donald Trump teriam sido as responsáveis pelo ato do presidente dos Estados Unidos de barrar uma iniciativa da Nvidia para exportar chips avançados de inteligência artificial (IA) à China, após avaliarem que a medida representaria um risco à segurança nacional.

A decisão teria sido tomada pouco antes de uma reunião entre o presidente dos EUA e o líder chinês, Xi Jinping, realizada em 30 de outubro em Busan (Coreia do Sul), segundo fontes do governo atual e anterior que conversaram com o The Wall Street Journal.

Por que e quem impediu o “ok” de Trump à Nvidia e China?

  • Donald Trump havia considerado discutir com Xi o pedido do CEO da Nvidia, Jensen Huang, para liberar as vendas dos chips Blackwell, nova geração de processadores de IA da empresa;
  • A autorização representaria uma mudança significativa na política dos EUA, ao permitir que a China, principal rival geopolítico do país, tivesse acesso à tecnologia de ponta;
  • Huang, que mantém contato frequente com Trump, vinha fazendo intensa pressão para manter o acesso ao mercado chinês;
  • Entretanto, autoridades de alto escalão, incluindo o secretário de Estado, Marco Rubio, argumentaram que as exportações fortaleceriam os centros de dados de IA chineses e poderiam prejudicar os interesses estratégicos estadunidenses;
  • Também se opuseram ao pedido o representante de Comércio dos EUA, Jamieson Greer, e o secretário de Comércio, Howard Lutnick, responsáveis por negociações comerciais com Pequim;
  • Diante da oposição quase unânime de seus conselheiros, Trump decidiu não abordar o tema dos chips durante o encontro com Xi;
  • A decisão foi considerada uma vitória para Rubio e outros assessores sobre Huang, líder da empresa mais valiosa do mundo;
  • As exportações dos chips Blackwell poderiam render dezenas de bilhões de dólares à Nvidia e consolidar sua influência sobre as empresas chinesas de IA.

Close do rosto de Donald Trump olhando com expressão séria para frente
Trump não deixou chip Blackwell serem adquiridos pela China junto a Nvidia (Imagem: Joey Sussman/Shutterstock)

Chip Blackwell não foi liberado, mas um menos potente pode ser

Atualmente, a Nvidia aguarda autorização do governo estadunidense para comercializar uma versão menos potente do chip Blackwell no mercado chinês.

O modelo, segundo a empresa, é o mais avançado já desenvolvido: servidores equipados com a GPU B200 seriam três vezes mais poderosos que os baseados no chip anterior H100 para o treinamento de modelos de IA e até 15 vezes mais eficientes em tarefas de inferência.

“O presidente Trump ouve uma variedade de opiniões em questões de política, incluindo de grandes líderes empresariais”, afirmou o porta-voz da Casa Branca, Kush Desai. “O histórico encontro do presidente Trump com o presidente Xi demonstra, no entanto, que o único fator que orienta suas decisões é o melhor interesse do povo estadunidense.”

Em um evento da Nvidia em Washington (EUA), antes da reunião, Huang ressaltou a importância da China para o setor de IA, estimando que o país abriga cerca de metade dos pesquisadores da área no mundo.

O executivo afirmou temer que os EUA percam definitivamente esse mercado. “Eu realmente espero que o presidente Trump nos ajude a encontrar uma solução”, disse. “Neste momento, estamos em uma posição desconfortável.”

A viagem de Trump à Ásia foi vista como decisiva para o futuro dos negócios da Nvidia na China. Durante meses, o ex-presidente indicou que poderia autorizar a exportação de uma versão menos potente do chip Blackwell, mas, após a cúpula com Xi, mudou de posição.

Presidente da China, Xi Jinping, discursando com microfones
Jinping se reuniu com Trump na semana passada; nenhum deles falou da Nvidia (Imagem: Kaliva/Shutterstock)

Em entrevista ao programa “60 Minutes”, da CBS, Trump afirmou que os EUA deixariam a China negociar com a Nvidia, mas não com os chips mais avançados. A jornalistas, declarou: “Nós não damos esse chip a outras pessoas”, sem esclarecer se se referia à versão de maior desempenho ou ao modelo adaptado para o mercado chinês.

O encontro entre Trump e Xi terminou sem grandes acordos, embora tenha resultado em uma redução de tarifas estadunidenses sobre produtos chineses e na retomada de compras de soja dos EUA por Pequim. As medidas reduziram tensões e abriram espaço para que ambos os países reforcem a autossuficiência em setores estratégicos, como semicondutores e minerais raros.

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Para a China, o desfecho foi um revés, pois Xi buscava obter uma flexibilização na proibição de exportação de chips. Embora o objetivo de longo prazo de Pequim seja atingir independência tecnológica, o acesso imediato a processadores avançados é considerado vital para acelerar esse processo.

A Nvidia precisa de permissão formal do governo estadunidense para vender seus chips mais poderosos à China, restrição vigente desde 2022. O governo Trump tem se mostrado disposto a negociar as condições de exportação, gerando incerteza no setor.

Huang deve continuar pressionando por autorização para comercializar o Blackwell na China, especialmente antes da próxima visita de Trump ao país, prevista para abril. Em Washington, o executivo afirmou que o presidente costuma telefonar-lhe tarde da noite e que se tornou um de seus empresários favoritos.

Como seria o chip mais “fraco” da Nvidia?

A versão do chip Blackwell voltada à China ainda não teve suas especificações divulgadas. Em agosto, Trump havia dito que poderia aprovar um modelo com capacidade reduzida entre 30% e 50%, o que levaria de dois a três meses para ser desenvolvido pela empresa.

Mesmo que o novo chip seja autorizado, há dúvidas sobre sua viabilidade. Em agosto, a Casa Branca reverteu uma proibição de exportação de um chip mais antigo da Nvidia, desde que a empresa repassasse 15% da receita obtida na China ao governo estadunidense — um acordo que juristas classificaram como um imposto de exportação inconstitucional.

Logo da Nvidia em um smartphone, com uma placa-mãe atrás, cuja CPU leva os dizeres "AI"
Chips Blackwell mais fracos poderiam ser liberados pelo governo dos EUA (Imagem: Mijansk786/Shutterstock)

Pouco depois, autoridades chinesas instruíram empresas locais a não comprarem o chip. A Nvidia não registrou vendas desse modelo H20 desde abril, perdendo bilhões de dólares em receitas.

O lobby da empresa também enfrentou resistência no Congresso e em grupos de análise política. Antes da reunião Trump-Xi, parlamentares divulgaram um vídeo em que Huang dizia, em entrevista à CNN, não achar relevante quem venceria a corrida da IA.

O Comitê da Câmara sobre a China chamou a declaração de “perigosamente ingênua” e comparou a disputa tecnológica à Guerra Fria: “É como argumentar que não faria diferença se os soviéticos tivessem superado os EUA na corrida pela bomba nuclear”, escreveu o comitê no X.

Rodrigo Mozelli é jornalista formado pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) e, atualmente, é redator do Olhar Digital.