Aliada, ameaça ou os dois? Como a IA aparece em debates na COP30

Conferência em Belém discute o papel paradoxal da IA quando os assuntos são clima e meio ambiente; entenda o debate
Pedro Spadoni13/11/2025 13h50
Ilustração de um holograma redondo enorme no meio da floresta
(Imagem: Pedro Spadoni via ChatGPT/Olhar Digital)
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Na COP30, que acontece em Belém (PA), a inteligência artificial (IA) apareceu em conversas sobre clima. O tema ganhou força nos corredores e nos documentos oficiais não como tendência tecnológica abstrata, mas como um ponto de virada.

Ao mesmo tempo em que impulsiona pesquisas, monitoramento ambiental e previsão de eventos extremos, a IA também amplia o consumo de energia e pressiona a infraestrutura digital. Este paradoxo se tornou um dos debates-chave da conferência.

A percepção é que a IA passou a ser tratada como aliada e ameaça ao mesmo tempo, segundo a Folha de S. Paulo. Entre análises técnicas da ONU, estudos divulgados antes e durante o encontro e iniciativas como a AI Climate Academy, cresce a tentativa de equilibrar potencial e risco. 

Paralelamente, o Brasil tenta transformar a COP30 em vitrine ao lançar um plano de governança climática integrado. Você vai entender tudo isso nesta matéria. Mas vamos por partes.

IA como aliada e ameaça nas discussões da COP30

A presença da inteligência artificial nas negociações climáticas não é exatamente nova, mas ganhou outra dimensão desde a COP28, realizada em Dubai em 2023. 

Ilustração digital de cérebro em placa de sistema para ilustrar conceito de inteligência artificial
Presença da inteligência artificial nas negociações climáticas não é exatamente nova, mas debate amadureceu na COP30 (Imagem: Treecha/Shutterstock)

Naquele ano, os países reconheceram oficialmente a IA como uma ferramenta capaz de contribuir para o combate às mudanças climáticas. Mas alertaram para riscos associados ao avanço acelerado dessa tecnologia. 

Em Belém, na COP30, esse debate amadureceu. A tecnologia aparece como um recurso poderoso para acelerar pesquisas, prever desastres e monitorar ecossistemas sensíveis. No entanto, também é considerada um fator de pressão crescente sobre recursos naturais e energia.

Pelos lados positivos, negociadores e especialistas apontam aplicações já consolidadas. Há sistemas de IA usados para prever eventos extremos, monitorar nível do mar, acompanhar poluição e mapear desmatamento — caso da ferramenta PrevisIA, citada pelo jornal. 

Além disso, a tecnologia tem sido usada por cientistas para acelerar análises complexas e por jornalistas ambientais em investigações sobre carbono e desmatamento. Em alguns países, como a Índia, algoritmos ajudam agricultores a planejar safras diante de riscos climáticos, o que reduz endividamento e incentiva culturas de valor agregado maior.

Mas esse avanço tem custos. O relatório da UNFCCC, divulgado antes da conferência, alerta que o alto consumo energético de data centers pode neutralizar parte dos benefícios climáticos da IA.

  • UNFCCC significa United Nations Framework Convention on Climate Change (em português, Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima). É o tratado internacional que estrutura a governança climática global desde 1992 (Rio-92) e que organiza as COPs – as Conferências das Partes.

Além disso, há desigualdade no acesso à tecnologia. Países de baixa renda, por exemplo, têm infraestrutura limitada para aproveitar suas vantagens. 

Em paralelo a isso, crescem os temores de usos indevidos – por exemplo: o apoio a atividades de exploração de combustíveis fósseis e a circulação de desinformação sobre mudanças climáticas. 

Esse conjunto de riscos tem impulsionado o debate por uma regulação específica dentro da convenção do clima.

Documentos da ONU e iniciativas lançadas na conferência

Além do debate conceitual, a COP30 tem sido palco para novos documentos, diretrizes e iniciativas internacionais ligados ao uso de IA no clima. 

Ilustração de holograma do planeta Terra em apresentação na COP30 em Belém
COP30 tem sido palco para documentos, diretrizes e iniciativas ligados ao uso de IA no clima (Imagem: Pedro Spadoni via ChatGPT/Olhar Digital)

A UNFCCC publicou relatórios que listam aplicações consideradas bem-sucedidas e reforçam a necessidade de métricas globais para medir o impacto da infraestrutura digital nas ações climáticas. 

A ONU destaca que os investimentos em IA cresceram fortemente na última década, mas ainda faltam padrões claros para garantir que esses sistemas sejam transparentes, justos e responsáveis, evitando vieses e usos que possam gerar danos ambientais. 

Em Belém, uma das novidades foi o lançamento da AI Climate Academy, iniciativa conjunta da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), União Internacional de Telecomunicações (UIT) e Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). 

O programa oferecerá cursos e capacitações presenciais para países em desenvolvimento, começando pelos amazônicos. E deve evoluir para um instituto dedicado a estudos sobre tecnologias digitais e clima. 

Para a Unesco, o objetivo é ampliar o acesso ao conhecimento e evitar um cenário no qual apenas países ricos se beneficiem da IA enquanto os mais vulneráveis enfrentam os maiores impactos da crise climática. 

Ao mesmo tempo, a entidade reforça que a desinformação sobre clima impulsionada por IA já representa um risco real à segurança pública.

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O plano brasileiro e a governança multinível

Enquanto o debate internacional sobre IA avançava na COP30, o Brasil aproveitou o encontro para lançar o Plano de Aceleração de Soluções (PAS) em Governança Multinível.

Organizadores do PAS perfilados na COP30
O governo brasileiro lançou o Plano de Aceleração de Soluções (PAS) em Governança Multinível na COP30 (Imagem: Rafa Neddermeyer/COP30 Brasil Amazônia/PRB)

A iniciativa busca integrar diferentes níveis de governo – municipal, estadual e federal – na implementação das metas climáticas do Acordo de Paris. 

O plano se apoia em quatro pilares

  • Decisão informada por risco;
  • Capacitação técnica;
  • Financiamento público e privado;
  • Governança inclusiva

Ele prevê metas até 2030, como a incorporação de estruturas de governança multinível em pelo menos 120 planos climáticos nacionais e locais, além da capacitação de seis mil servidores e profissionais de países parceiros. 

Segundo o governo brasileiro, a eficácia das políticas climáticas depende dessa coordenação ampliada, já que são estados e municípios que executam ações como adaptação urbana, proteção da floresta e descarbonização de frotas. 

O Brasil também foi nomeado co-presidente da coalizão CHAMP, que aproxima governos nacionais e subnacionais em projetos climáticos e financeiros.

Isso reforça a estratégia do Brasil de se posicionar como articulador global em governança ambiental. Para o Ministério do Meio Ambiente, sem compartilhamento de dados, tecnologia e financiamento entre todos os níveis, nenhuma meta climática sai do papel.

Pedro Spadoni
Redator(a)

Pedro Spadoni é jornalista formado pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep). Já escreveu para sites, revistas e até um jornal. No Olhar Digital, escreve sobre (quase) tudo.