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Um artigo publicado na revista Acta Geochimica propõe uma explicação alternativa para a origem da Lua: em vez do impacto de um corpo do tamanho de Marte, chamado Theia, ou da antiga hipótese de fissão por rotação extrema, a Lua teria se formado a partir da ejeção explosiva de material da Terra jovem.
Segundo Matthew R. Edwards, colaborador acadêmico associado à Universidade de Toronto, no Canadá, e autor do novo estudo, a energia necessária teria vindo de um processo chamado “luminosidade Lambda”, capaz de converter lentamente energia gravitacional interna em calor; esse calor se acumulou no núcleo e foi canalizado por megaplumas em regiões profundas conhecidas como grandes províncias de baixa velocidade (LLVPs), concentrando-se até deflagrar um evento capaz de lançar rochas do manto e da crosta à órbita terrestre e, assim, dar origem ao satélite.
Origem da Lua: principais pontos do novo estudo
- O trabalho propõe que a “luminosidade Lambda” aqueceu o interior da proto-Terra, acumulando energia no núcleo;
- Megaplumas ligadas às LLVPs teriam concentrado calor e elementos leves em regiões específicas do limite entre núcleo e manto;
- Uma explosão localizada teria ejetado material terrestre para a órbita, explicando a semelhança isotópica entre Terra e Lua;
- A hipótese busca contornar os impasses do cenário de impacto com Theia e da fissão por rotação muito rápida;
- O autor defende implicações mais amplas para geodinâmica, cosmologia e a evolução de órbitas planetárias.

Luminosidade Lambda, LLVPs e a formação do satélite
O debate sobre a origem da Lua ganhou força quando amostras das missões Apollo mostraram composições isotópicas lunar e terrestre notavelmente próximas. Isso foi um desafio ao cenário do grande impacto, que previa forte contribuição de Theia na composição do satélite. A hipótese de fissão por rotação, sugerida no século 19 por George Darwin, também perdeu tração porque exigia uma Terra primitiva girando rápido demais, em desacordo com o momento angular do sistema atual Terra-Lua.
Nos anos recentes, alguns pesquisadores consideraram a possibilidade de um evento explosivo ter “ajudado” a fissão, mas essa ideia esbarrava na necessidade de concentrar grande quantidade de elementos físseis em um ponto específico do planeta – algo para o qual faltam evidências geoquímicas. O novo estudo busca contornar esse obstáculo ao apontar uma fonte de energia alternativa: a chamada luminosidade Lambda, processo pelo qual parte da energia gravitacional interna se transformaria lentamente em calor ao longo do tempo.

De acordo com o autor, esse aquecimento teria sido particularmente eficiente na Terra primitiva, quando mecanismos de resfriamento como a tectônica de placas ainda não operavam plenamente. “A energia do núcleo poderia ter se acumulado ao longo de milhões de anos – até que houvesse o suficiente para impulsionar a ejeção lunar”, afirma. O trabalho sugere que, paralelamente, duas grandes anomalias térmicas antipodais – as LLVPs, hoje situadas sob o Pacífico e sob a África – funcionariam como condutos para o calor e para elementos leves, canalizando-os para regiões supercríticas no limite entre o núcleo e o manto.
Nesse cenário, uma explosão localizada na proto-LLVP do Pacífico teria atuado de modo semelhante a uma erupção de kimberlito em escala planetária, lançando material do manto e da crosta para a órbita da Terra, onde se agregou para formar a Lua. A proposta busca explicar simultaneamente o parentesco isotópico entre as rochas lunares e terrestres e evitar a necessidade de uma rotação inicial extrema da proto-Terra.

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O trabalho também insere a luminosidade Lambda em um quadro mais amplo. O autor argumenta que o processo poderia influenciar a dinâmica de estrelas compactas e fornecer alternativas conceituais em cosmologia, além de participar de fenômenos geodinâmicos como a ascensão de plumas mantélicas.
Ele menciona indícios de expansão mínima do raio terrestre observados por satélites, interpretando-os como sinal de que plumas podem transportar minerais a condições de menor densidade no manto superior. Em sua visão, a luminosidade Lambda teria “moldado toda a evolução da Terra” e, em momentos críticos, deflagrado eventos catastróficos. “É um processo implacável que desencadeou a maioria dos grandes eventos de extinção em massa e voltará a fazê-lo”, escreve, ressaltando tratar-se de uma hipótese que exige novas validações.
A proposta reacende debates sobre o papel das LLVPs – já vistas em estudos sismológicos como possíveis feixes de plumas termoquímicas – e sobre a origem do calor profundo que alimenta a convecção do manto. O autor também especula que o processo poderia levar, em longas escalas de tempo, a um afastamento gradual de órbitas, algo que ajudaria a manter a habitabilidade da Terra por mais tempo, ao compensar o aumento de luminosidade do Sol no futuro distante.