Lua foi “ejetada” pela Terra, propõe novo estudo

Nova abordagem diz que a Lua se formou pela ejeção explosiva de material da Terra e não por impacto de um proto-planeta ou fissão por rotação
Flavia Correia16/12/2025 14h16
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Estudo propõe que a Terra "ejetou" a Lua por explosão interna. Crédito: Imagem gerada por IA/Gemini
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Um artigo publicado na revista Acta Geochimica propõe uma explicação alternativa para a origem da Lua: em vez do impacto de um corpo do tamanho de Marte, chamado Theia, ou da antiga hipótese de fissão por rotação extrema, a Lua teria se formado a partir da ejeção explosiva de material da Terra jovem. 

Segundo Matthew R. Edwards, colaborador acadêmico associado à Universidade de Toronto, no Canadá, e autor do novo estudo, a energia necessária teria vindo de um processo chamado “luminosidade Lambda”, capaz de converter lentamente energia gravitacional interna em calor; esse calor se acumulou no núcleo e foi canalizado por megaplumas em regiões profundas conhecidas como grandes províncias de baixa velocidade (LLVPs), concentrando-se até deflagrar um evento capaz de lançar rochas do manto e da crosta à órbita terrestre e, assim, dar origem ao satélite.

Origem da Lua: principais pontos do novo estudo

  • O trabalho propõe que a “luminosidade Lambda” aqueceu o interior da proto-Terra, acumulando energia no núcleo;
  • Megaplumas ligadas às LLVPs teriam concentrado calor e elementos leves em regiões específicas do limite entre núcleo e manto;
  • Uma explosão localizada teria ejetado material terrestre para a órbita, explicando a semelhança isotópica entre Terra e Lua;
  • A hipótese busca contornar os impasses do cenário de impacto com Theia e da fissão por rotação muito rápida;
  • O autor defende implicações mais amplas para geodinâmica, cosmologia e a evolução de órbitas planetárias.
Modelo de ejeção lunar explosiva. O aquecimento do núcleo gera o cinturão Ma-Tkalčić e dois proto-LLVPs enriquecidos com elementos leves. Devido ao aprisionamento de energia, zonas supercríticas surgem nos proto-LLVPs com pressões e temperaturas elevadas. Uma explosão no proto-LLVP do Pacífico ejeta o material formador da Lua. Crédito: Matthew R. Edwards

Luminosidade Lambda, LLVPs e a formação do satélite

O debate sobre a origem da Lua ganhou força quando amostras das missões Apollo mostraram composições isotópicas lunar e terrestre notavelmente próximas. Isso foi um desafio ao cenário do grande impacto, que previa forte contribuição de Theia na composição do satélite. A hipótese de fissão por rotação, sugerida no século 19 por George Darwin, também perdeu tração porque exigia uma Terra primitiva girando rápido demais, em desacordo com o momento angular do sistema atual Terra-Lua.

Nos anos recentes, alguns pesquisadores consideraram a possibilidade de um evento explosivo ter “ajudado” a fissão, mas essa ideia esbarrava na necessidade de concentrar grande quantidade de elementos físseis em um ponto específico do planeta – algo para o qual faltam evidências geoquímicas. O novo estudo busca contornar esse obstáculo ao apontar uma fonte de energia alternativa: a chamada luminosidade Lambda, processo pelo qual parte da energia gravitacional interna se transformaria lentamente em calor ao longo do tempo.

Representação artística da hipótese mais aceita, de que uma colisão de um proto-planeta do tamanho de Marte com a Terra deu origem à Lua. Crédito: NASA/JPL-Caltech

De acordo com o autor, esse aquecimento teria sido particularmente eficiente na Terra primitiva, quando mecanismos de resfriamento como a tectônica de placas ainda não operavam plenamente. “A energia do núcleo poderia ter se acumulado ao longo de milhões de anos – até que houvesse o suficiente para impulsionar a ejeção lunar”, afirma. O trabalho sugere que, paralelamente, duas grandes anomalias térmicas antipodais – as LLVPs, hoje situadas sob o Pacífico e sob a África – funcionariam como condutos para o calor e para elementos leves, canalizando-os para regiões supercríticas no limite entre o núcleo e o manto.

Nesse cenário, uma explosão localizada na proto-LLVP do Pacífico teria atuado de modo semelhante a uma erupção de kimberlito em escala planetária, lançando material do manto e da crosta para a órbita da Terra, onde se agregou para formar a Lua. A proposta busca explicar simultaneamente o parentesco isotópico entre as rochas lunares e terrestres e evitar a necessidade de uma rotação inicial extrema da proto-Terra.

Único satélite natural permanente da Terra, a Lua teria sido parte do próprio planeta. Crédito: Paul Prescott – Shutterstock

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O trabalho também insere a luminosidade Lambda em um quadro mais amplo. O autor argumenta que o processo poderia influenciar a dinâmica de estrelas compactas e fornecer alternativas conceituais em cosmologia, além de participar de fenômenos geodinâmicos como a ascensão de plumas mantélicas. 

Ele menciona indícios de expansão mínima do raio terrestre observados por satélites, interpretando-os como sinal de que plumas podem transportar minerais a condições de menor densidade no manto superior. Em sua visão, a luminosidade Lambda teria “moldado toda a evolução da Terra” e, em momentos críticos, deflagrado eventos catastróficos. “É um processo implacável que desencadeou a maioria dos grandes eventos de extinção em massa e voltará a fazê-lo”, escreve, ressaltando tratar-se de uma hipótese que exige novas validações.

A proposta reacende debates sobre o papel das LLVPs – já vistas em estudos sismológicos como possíveis feixes de plumas termoquímicas – e sobre a origem do calor profundo que alimenta a convecção do manto. O autor também especula que o processo poderia levar, em longas escalas de tempo, a um afastamento gradual de órbitas, algo que ajudaria a manter a habitabilidade da Terra por mais tempo, ao compensar o aumento de luminosidade do Sol no futuro distante.

Flavia Correia
Redator(a)

Jornalista formada pela Unitau (Taubaté-SP), com Especialização em Gramática. Já foi assessora parlamentar, agente de licitações e freelancer da revista Veja e do antigo site OiLondres, na Inglaterra.