Os primeiros pesquisadores “modernos” especializados no Egito Antigo, no século 19, tinham por costume desenrolar as múmias e realizar autópsias nos cadáveres, mortos há milhares de anos. Além de profundamente desrespeitoso com a cultura local, o método destruía um artefato arqueológico inestimável. Por isso, cientistas atuais preferem o uso de tecnologias menos invasivas, como ressonâncias magnéticas ou raios X, para examinar o interior dos corpos mumificados.

Esse foi o caso de três animais mumificados, desembrulhados e dissecados digitalmente por pesquisadores da Universidade de Leicester e da Universidade de Swansea. Usando varreduras 3D de alta resolução, os cientistas obtiveram detalhes sem precedentes sobre a dieta, morte e até a deificação dos animais há mais de dois mil anos. O artigo da pesquisa foi publicado na revista Scientific Reports.

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Os animais – uma cobra, um pássaro e um filhote de gato – pertencem à coleção Universidade de Swansea. “Estima-se que pode haver até 70 milhões de múmias animais no antigo Egito. Muitos desses eram oferendas colocadas em templos dedicados a diferentes deuses”, explica o professor de Arqueologia da Universidade de Leicester, Richard Thomas.

Swansea University/Reprodução

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Da esquerda para a direita, a cobra, o gato e o pássaro mumificados. Imagem: Swansea University

A técnica de micro tomografia computadorizada utilizada pelos pesquisadores gera imagens 3D com uma resolução cem vezes melhor do que uma tomografia médica. Dessa maneira, os restos mortais dos animais puderam ser analisados em detalhes. “Os avanços na tecnologia de imagem estão, pela primeira vez, revelando novos insights sobre a vida desses animais e as práticas de mumificação sem danificá-los”, conta o arqueólogo.

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Ossos e dentes, materiais e até tecidos moles desidratados dos animais puderam ser analisados. As digitalizações ainda permitiram imprimir em 3D e manusear os restos do esqueleto das múmias. “A aplicação de novas tecnologias de imagem, junto com abordagens arqueológicas, tem o potencial de transformar nossa compreensão das práticas de mumificação egípcias antigas e das relações entre humanos e animais de forma mais ampla”, completa Thomas.

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Além de humanos, os egípcios mumificaram gatos, íbis, falcões, cobras, crocodilos e cães – todos considerados sagrados na cultura da região. Em vários casos, esses animais eram enterrados com seu dono, ou serviam como alimento na vida após a morte. Porém, as múmias de animais mais comuns podiam ser compradas pelos visitantes dos templos como oferendas aos deuses.

Nesses casos, os animais eram criados ou capturados por tratadores e depois mortos e embalsamados pelos sacerdotes do templo. O gato examinado tinha menos de cinco meses, e a separação das vértebras no pescoço indica que possivelmente ele foi estrangulado. O provavelmente era um francelho euroasiático (uma subespécie de falcão) e a cobra foi identificada como uma naja egípcia (Naja haje).

De acordo com os cientistas, evidências de danos renais mostram que provavelmente a cobra  foi privada de água durante sua vida, e  fraturas ósseas mostram que ela foi morta por uma chicotada, antes de possivelmente passar por um procedimento de “abertura da boca” durante a mumificação. Os pesquisadores acreditam que isso demonstra a primeira evidência de comportamento ritualístico complexo aplicado a uma cobra.

Via: Science Alert