Covid-19 completa um ano no Brasil; veja como a situação mudou de lá para cá

Por Renato Santino, editado por Roseli Andrion 26/02/2021 19h23, atualizada em 26/02/2021 20h53
Máscaras no Brasil
Rovena Rosa/Agência Brasil
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Onde você estava há exatamente um ano atrás? O dia 26 de fevereiro de 2020 foi marcante na história brasileira: foi quando o Ministério da Saúde confirmou o primeiro caso de Covid-19 no Brasil, apesar de algumas dezenas de casos suspeitos terem sido acompanhados antes disso e um estudo da Fiocruz apontar que o país já tinha transmissão comunitária no início daquele mês, antes mesmo do Carnaval.

De lá para cá, a Covid-19, que sequer tinha um nome e era chamada apenas de “coronavírus” ou “novo coronavírus”, por ser geneticamente muito próximo do primeiro Sars-Cov, causador da Sars, passou rapidamente a fazer parte do cotidiano do brasileiro.

A comunidade científica precisou se desdobrar em tempo recorde para combater uma doença que surgiu “do nada”, totalmente desconhecida, e tentar minimizar os estragos, que já superam 2 milhões de mortes no mundo, sendo mais de 250 mil especificamente no Brasil. Veja como o combate à pandemia mudou neste um ano de Covid-19 no Brasil:

Prevenção

Não há como discutir que a mensagem de como se proteger contra a Covid-19 passou por grandes mudanças. Inicialmente, a informação que chegou à população era de que o vírus era contraído principalmente pelas mãos, ao tocar em uma superfície contaminada e levá-la ao nariz, boca ou olhos.

Também é impossível não lembrar que as primeiras orientações eram de que a população em geral não deveria usar máscaras. Na época, a recomendação era de que apenas quem manifestasse sintomas precisaria usar máscaras cirúrgicas, para minimizar a propagação. No entanto, o tempo mostrou que pessoas assintomáticas ou pré-sintomáticas, que ainda não manifestaram sinais da doença, também transmitem (e muito bem) o vírus.

A orientação, então, passou a ser geral: todos devem usar máscaras sempre, pois não há como saber se você já está infectado sem manifestar sintomas.

O tempo também tratou de mudar as perspectivas sobre máscaras. No início da pandemia, as pessoas foram orientadas a utilizar máscaras de pano como forma de “controle de origem”, minimizando a emissão de gotículas contaminadas, deixando o equipamento de proteção profissional para quem trabalha na área da saúde. Aos poucos, esse entendimento está mudando. Na Europa, cidadãos que não usam respiradores PFF2/N95 ou equivalentes, que contam com uma camada filtrante e são potentes não só para conter a transmissão, mas também para autoproteção, podem ser impedidos de circular em transporte público, por exemplo.

Mulher usa máscara branca
Máscaras com camada filtrante se tornaram recomendadas para prevenir a doença. Foto: Shutterstock

Esse tipo de equipamento mais potente não era recomendado pelo risco de que o uso generalizado pela população pudesse causar escassez para os profissionais de saúde. Hoje, no entanto, não é difícil encontrar estes acessórios a preços acessíveis. Fabricantes também têm recomendações de como reutilizar máscaras PFF2 de modo a não as jogar fora após cada uso, o que poderia causar escassez.

Um ponto que ainda traz confusão sobre a prevenção da Covid-19 são os aerossóis. Até hoje, autoridades de saúde, incluindo a OMS, batem cabeça em relação a esse tipo de transmissão, que acontece com a emissão de gotículas minúsculas que, de tão pequenas e leves, continuam flutuando no ar e podem se acumular em um ambiente com circulação insuficiente, atingindo pessoas a longas distâncias de quem está infectado. Cada vez mais especialistas apontam que esse tipo de transmissão não só é possível como é a causadora de eventos de super-espalhamento, mas até hoje a mensagem para o público não traz informações claras sobre evitar espaços fechados, restringindo-se à higiene das mãos e o distanciamento físico.

Tratamento

Com uma pandemia dessa proporção, o que não faltou foram tratamentos testados contra a Covid-19. Infelizmente, a maioria deles não apresentou o resultado que se esperava.

O maior expoente foi a cloroquina, ou a similar, a hidroxicloroquina. Graças a um estudo divulgado em março do ano passado, do qual até o autor Didier Raoult se retratou por causa das falhas metodológicas, o medicamento foi alçado a solução milagrosa. Primeiro, foi aplicado apenas em “uso compassivo”, em quem já estava em condições críticas de saúde. Depois, o medicamento foi usado cada vez mais precocemente, até passar a integrar o “tratamento precoce” defendido pelo Ministério da Saúde.

Pouco a pouco, os estudos começaram a sair e demonstraram que, até hoje, não há um medicamento comprovadamente eficaz para prevenir o agravamento da doença em suas etapas iniciais.

Isso não significa que não houve evolução neste aspecto. A ciência descobriu que o corticoesteroide dexametasona tem efeitos claros na redução de mortalidade dos pacientes que precisam de internação, controlando a tempestade de citocinas, que é um efeito hiperinflamatório causado pela resposta imunológica desmedida do organismo e que pode ser letal.

Outros medicamentos ainda estão sendo analisados para diversos casos. O antiviral molnupiravir, por exemplo, demonstrou grande eficácia em animais, em experimentos com furões e ratos, conseguindo cortar a infecção e combater o vírus nas etapas iniciais do contágio. Não se sabe se o efeito será o mesmo com seres humanos, mas os testes estão em andamento.

Molnupiravir, medicamento antiviral em testes contra Covid-19
O antiviral molnupiravir é uma esperança contra a Covid-19. Foto: Sonis Photography/Shutterstock

Outras drogas também estão em fase de ensaios clínicos com alguns resultados iniciais promissores. É o caso da colchicina, do tocilizumabe e até mesmo do “spray nasal israelense” EXO-CD24. Por enquanto, nada confirmado.

Vacinas

O que não parecia possível em fevereiro de 2020, é uma realidade em fevereiro de 2021. Ao longo de um ano de Covid-19 no Brasil e mais do que isso no mundo, a ciência conseguiu desenvolver vacinas em tempo recorde contra uma doença totalmente nova. A rapidez, inclusive, gerou dúvidas sobre se o desenvolvimento não foi rápido demais.

Não foi. É fato que algumas etapas burocráticas do processo foram aceleradas e os laboratórios iniciaram a produção em escala muito antes de saberem se os imunizantes seriam eficazes, mas os testes de segurança foram seguidos à risca. Então por que elas ficaram prontas tão rapidamente?

Vacinação na Fiocruz
Mesmo com poucas doses disponíveis, vacinação já teve início no Brasil

Primeiro, pelo fato de se basearem em tecnologias já existentes e conhecidas. Vacinas de vírus inativado, como a CoronaVac, já existem há décadas; o imunizante de Oxford/AstraZeneca foi desenvolvido tendo como base pesquisas de décadas contra a Sars. Já as apostas no mRNA, apesar de ser uma tecnologia nova, também são fruto de ampla pesquisa prévia mostrando sua viabilidade; além disso, por serem extremamente simples de serem produzidas, a BioNTech, parceria da Pfizer, conseguiu criar seu composto em questão de horas após o sequenciamento genético do vírus.

Segundo, os testes caminharam muito mais rápido do que o normal para uma vacina por um motivo muito simples: a pandemia descontrolada facilita bastante a obtenção dos resultados.

Normalmente, as fases 1 e 2 de um estudo de vacinas andam rápido: basta encontrar voluntários, aplicar os imunizantes e esperar o tempo previsto para analisar segurança e a produção de anticorpos. É na fase 3 que a situação complica, já que é preciso esperar um número pré-determinado de voluntários (incluindo os do grupo placebo, que não são imunizados) serem infectados pela doença naturalmente para então descobrir se a vacina funciona ou não.

Esse processo é demorado em uma doença comum. Imagine quantos anos não seriam necessários para que, entre um grupo de 50 mil pessoas acompanhadas em um estudo clínico, 200 pessoas contraíssem o HIV, por exemplo. Com a Covid-19, esse número pode ser atingido em questão de meses, simplesmente porque o vírus está circulando com grande facilidade pelo planeta inteiro.

E não há como discutir: elas funcionam. O grande observatório das vacinas, neste momento, é Israel, que tem imunizado sua população em ritmo incomparável, e já é possível observar que houve uma queda desproporcional na internação de idosos, que foram os primeiros a serem imunizados, em comparação com o resto dos habitantes. Outro estudo, na Escócia, também mostra ótimos resultados da imunização em massa.

Por aqui, no entanto, a situação das vacinas ainda é ruim, mesmo após um ano da Covid-19 no Brasil. Por aqui, o Ministério da Saúde tem recebido doses à conta-gotas, com o atraso na entrega do insumo farmacêutico ativo destinado ao Instituto Butantan e a Fiocruz. O governo também tem demorado a fechar acordos de fornecimento para o recebimento dos demais imunizantes.

Variantes

Uma coisa que mudou neste um ano de Covid-19 no Brasil para cá é que o vírus que está circulando não é mais o “selvagem”, descoberto em Wuhan no fim de 2019. As variantes começaram a ser percebidas em várias partes do mundo, demonstrando que o vírus está se adaptando cada vez mais ao ser humano.

Vale notar que variantes não são uma novidade. Desde que a OMS declarou a Covid-19 como uma pandemia, uma mutação se tornou dominante no mundo inteiro, conhecida como D614G  e que foi associada a maior transmissibilidade em relação ao vírus selvagem. O que estão surgindo agora são as novas cepas.

Variante do coronavírus
Vírus aos poucos está evoluindo e se adaptando ao ser humano. Imagem: Lightspring/Shutterstock

O Brasil, que nunca controlou o vírus, detectou duas variantes aparentemente geradas no país: P.1 e P.2. A primeira tem sido apresentada como especialmente preocupante, detectada inicialmente em Manaus, em meio à crise que resultou no colapso do sistema de saúde no estado. Ela conta com mutações associadas tanto com a maior transmissibilidade quanto com a evasão imune, com maiores riscos de reinfectar quem se curou ou de escapar da proteção gerada pelas vacinas.

Ao redor do mundo, outras variantes preocupantes se destacam. Uma delas é a B.1.1.7, descoberta no Reino Unido ainda em 2020, que está associada a maior transmissibilidade viral e, possivelmente, maior letalidade. Já na África do Sul foi descoberta a B.1.351, que é associada a evasão imune.

Redator(a)

Renato Santino é redator(a) no Olhar Digital

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Roseli Andrion é redator(a) no Olhar Digital