Analisando fósseis de peixes de 400 milhões de anos, uma equipe de cientistas liderada por Yara Haridy, candidata a doutorado no Museu da Natureza de Berlim, fez uma descoberta importante para entender a evolução dos ossos.

Segundo a National Geographic, os primeiros ossos eram como “concreto“, um material puramente estrutural, crescendo no exterior de peixes para lhes dar uma carapaça protetora. Os primeiros ossos com células vivas em seu interior, como os de nossos corpos, surgiram mais tarde, cerca de 400 milhões de anos atrás.

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O desafio era compreender o que levou a essa mudança na estrutura óssea e ao surgimento destas células, que chamamos de osteócitos. Para isso Haridy usou um método originalmente desenvolvido para ciência de materiais e engenharia, chamado FIB-SEM, sigla para “Focused ion beam milling and scanning electron microscopy” (“Fresagem com feixe de íons focado e microscopia por varredura de elétrons”), para analisar fósseis de peixes conhecidos como osteotrácios.

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As imagens produzidas pelo processo não mostravam as células ósseas em si, decompostas há muito tempo, mas sim as cavidades onde elas viviam. “Eu estava olhando para o espaço onde uma pequena célula viveu 400 milhões de anos atrás”, disse Haridy.

A pesquisadora e sua equipe perceberam que o tecido ósseo ao redor das cavidades havia se desgastado, como se tivesse sido consumido. Mas isso não é sinal de um ferimento ou doença, mas sim evidência de que as células dissolviam parte do tecido para que o cálcio, fósforo e outros minerais encontrados nos ossos pudessem ser incorporados à corrente sanguínea dos peixes.

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Ou seja, as células transformavam o tecido ósseo em uma espécie de bateria, armazenando minerais e liberando-os quando necessários para processos como a alimentação dos músculos. Por sua vez, a necessidade de mais minerais ajudou a incentivar a evolução de ossos celulares, algo que mudou a trajetória dos vertebrados. 

Secção cruzada mostrando a estrutura interna dos ossos de um vertebrado.
Os ossos de vertebrados (como os nossos) são estruturas vivas, que além de dar sustentação a nossos corpos são responsáveis pela produção de células sanguíneas. Imagem: cigdem / Shutterstock

“Esta hipótese circulava há algum tempo, mas não havia sido corroborada”, disse o paleontólogo Martin Brazeau, do Imperial College London, que não participou do estudo de Haridy.

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Sem osteócitos, os vertebrados poderiam nunca ter se adaptado à vida em terra firme, já que as baterias ósseas fornecem o cálcio necessário para a postura de ovos ou lactação. A evolução poderia ter seguido um caminho diferente, sem criaturas como os dinossauros ou os mamíferos.

Além de revelar as cavidades que as células ocupavam, o estudo foi capaz de descobrir a forma e conexões das células entre ossos, algo que não havia sido feito antes. Entretanto, a técnica FIB-SEM tem suas desvantagens: ela só consegue analisar tecido ósseo na superfície de um fóssil, e parte do espécime é destruído no processo. Isso significa que ela não é um método adequado para, por exemplo, a análise de espécimes únicos.

Ainda assim, Haridy está empolgada com o potencial. “Assim como as primeiras imagens por tomografia computadorizada abriram o campo da paleontologia e nos deram novas metodologias, acredito que este método irá continuar a nos surpreender no futuro.”

Fonte: National Geographic