No final de maio deste ano, a Sexta Turma do TST (Tribunal Superior do Trabalho) decidiu manter uma indenização por dano moral a uma empregada doméstica demitida por WhatsApp. O veredito acalorou os debates sobre a legalidade de dispensas trabalhistas por aplicativos de mensagens, especialmente vistos em tempos de pandemia.

O ocorrido, no entanto, aconteceu bem antes da chegada da Covid-19. Ao abrir seu WhatsApp em 2016, a empregada doméstica deparou-se com a seguinte mensagem de seu chefe: “Bom dia. Você está demitida. Devolva as chaves e o cartão da​ minha casa. Receberá contato em breve para assinar documentos”.

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A demissão foi parar na Justiça e, em 2018, a juíza Lenita Corbanezi, da 2ª Vara do Trabalho de Campinas (SP), assegurou uma indenização de três salários fixados em R$ 2,4 mil.

Segundo Corbanezi, o empregador pode dispensar um funcionário no momento em que bem entender, mas “a sumária dispensa via WhatsApp”, já que “denota, no mínimo, falta de respeito à dignidade humana, não se justificando nem mesmo em nome dos avanços tecnológicos e de meios de comunicação virtuais”.

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O patrão recorreu e o processo foi parar na Sexta Câmara da Terceira Turma do TRT-15, mas em 2019, a indenização foi mantida. Ele tentou um “último suspiro”, levando o caso ao TST, em Brasília. No entanto, em 26 de maio deste ano, o pedido contra a indenização foi novamente negado e a condenação foi mantida.

Ilustração de martelo de tribunal
Patrão vai ter que indenizar empregada doméstica após anunciar demissão via WhatsApp. Foto: Valery Evlakhov/Shutterstock

Não foram avaliadas questões como a legalidade do uso do WhatsApp para a demissão ou mesmo se os conteúdos das mensagens foram ofensivos. “Para que se pudesse concluir nesta corte superior se foi ofensivo ou não o conteúdo da mensagem da dispensa precisaríamos saber do contexto da mensagem, e não apenas do texto da mensagem. O contexto é que dá sentido ao texto”, afirmou a ministra do TST, Kátia Arruda.

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Pode ou não pode?

O problema é que o veredito não condenou a dispensa via WhatsApp, mas ao mesmo tempo não estendeu a possibilidade de recurso na condenação. Com isso surgem diversas dúvidas sobre as relações trabalhistas feitas em aplicativos de redes sociais, especialmente quando se trata de demissões.

Com a pandemia de coronavírus, o uso de ferramentas como WhatsApp e aplicativos de videoconferência tornaram-se comuns para fazer a ponte entre empregador e empregado. Com isso, cobranças e até dispensas, que antes eram feitas tête-à-tête, passaram a ser feitas de forma virtual, de um modo bem mais impessoal.

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Em uma direção oposta à decisão do TST, a 18ª Turma do TRT-2 — que abrange Grande São Paulo e Baixada Santista — validou, em fevereiro deste ano, a demissão de uma coordenadora pedagógica feita via WhatsApp.

Na ocasião a desembargadora e relatora do caso Rilma Aparecida Hemetério afirmou que o WhatsApp “é uma ferramenta de comunicação, como qualquer outra” e “se tornou um grande aliado, especialmente no ano de 2020, em razão da pandemia”.

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O problema é que, ao não estipular um limite do que pode e do que não pode ser tratado em conversas virtuais, a Justiça confunde tanto a cabeça do patrão quanto a do funcionário, já que não há um consenso. “O TST tangencia o assunto, mas não diz se vale usar o WhatsApp, se vale o tipo de mensagem. Diz apenas que não dá para dar provimento ao agravo [recurso]”, disse Ricardo Calcini, professor de pós-graduação em direito do trabalho da FMU.

Para Mayra Palópoli, do escritório Palópoli & Albrecht, o assunto é tratado com subjetividade. “[O veredito] É subjetivo. Não se trata de precedente de indenização em caso de dispensa pura e simples por WhatsApp. Mas abre um precedente de uma análise subjetiva da forma como se deu a dispensa pelo WhatsApp”, pontuou.

Ilustração de profissional demitido
Veredito pode abrir precedente para outras ocorrências de dispensas feitas via mensageiro. Foto: fongbeerredhot/Shutterstock

Melhor evitar

Para evitar que a dispensa vá parar na Justiça ou em manchetes dos jornais brasileiros, advogados trabalhistas ouvidos pela Folha de São Paulo fizeram algumas recomendações.

Segundo eles, quando não for possível a demissão presencial, recomenda-se a prática via chamadas de vídeo. Outra alternativa é anunciar a dispensa por chamada de voz.

Em ambos os casos, é sugerido que a conversa seja gravada — desde que ambas as partes estejam de acordo — para evitar questionamentos posteriores na Justiça.

Em último caso, pode-se fazer o uso de mensagens por escrito, como no WhatsApp, por exemplo. No entanto, o empregador deverá atentar-se ao tom da conversa, com um texto bem mais elaborado e respeitoso e menos impessoal.

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