Cientistas a serviço da empresa Bluu GmbH desenvolveram uma nova linha de produtos de carne animal, intitulada “peixes celulares” — a grosso modo, “peixes” criados em laboratório, mas feitos a partir de uma célula do animal de verdade — no intuito de frear o consumo predatório de proteínas de animais marinhos, impulsionado pela pesca predatória.

Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (ONUAA), cerca de 90% das espécies de peixe do mundo estão em déficit, ou seja, o consumo de sua carne por nós humanos é maior e mais rápido do que a velocidade com que eles se reproduzem. Por isso, a empresa europeia — uma divisão corporativa do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento para a Biotecnologia Marinha e Celular — desenvolveu o novo método de criação, efetivamente eliminando o custo desse consumo à vida animal.

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Imagem exibe um tubo de ensaio recolhido de um tanque refrigerado, contendo amostras de peixes criados em laboratório pela empresa Bluu GmbH
Os peixes criados pela Bluu GmbH em reatores são ambientalmente amigáveis, usando um tecido de peixes adultos de verdade para serem criados sem agressão aos animais, facilitando a sua reprodução e minimizando a pesca predatória. Imagem: Bluu GmbH/Divulgação

A Bluu nasceu em maio de 2020, liderada pelos doutores Sebastian Rakers e Simon Fabich. A ideia dos dois é oferecer os peixes criados em laboratório para restaurantes, como uma forma de apresentar o produto à população, mas eventualmente passar a disponibilizá-los em supermercados para aquisição direta pelo consumidor.

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“Nós enxergamos um mercado de rápido crescimento. O futuro pertence a produtos manufaturados dentro de uma economia circular”, disse Rakers, que afirmou que, inicialmente, a empresa vai oferecer itens mais simples, como espetinhos e bolinhas de peixe, enquanto opções mais complexas — como filés — seguirão em pesquisa para melhor desenvolvimento. “Isso é essencial para garantir que as células cresçam dentro de nossa estrutura prevista e se formem da mesma maneira que aconteceria em tecidos naturais de peixes”.

O processo de desenvolvimento é relativamente simples de se entender: basicamente, a Bluu faz a biópsia de um tecido de um peixe adulto de verdade — dessa biópsia, recolhem-se células chamadas de “progenitoras”. Elas são derivadas das células-tronco e, como nunca envelhecem, podem ser reproduzidas indefinidamente.

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A partir daí, o time posiciona o material genético dentro de um reator de aproximadamente cinco litros de capacidade, onde um nutriente intermediário promove o crescimento das células até formar um tecido muscular, carne, completo.

Entretanto, a fim de produzir um produto viável para o mercado, a Bluu necessita de um reator maior: “Nós ainda não estamos nessa fase, porque, antes de tudo, precisamos refinar cada passo do processo de crescimento das células. Nosso atual desafio é o de encaminhar os procedimentos para um nível industrial de produção”, disse Rakers.

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Em outras palavras: eles já produzem “peixes” em laboratório, mas não em uma escala que lhes permita vender o produto.

Vantagens dos peixes feitos em laboratório

A pesca predatória é, hoje, vista por autoridades no mundo todo como excessiva. Rakers diz que 30% dos estoques de carne de peixe no mundo vêm de sobrepesca — ou seja, quando humanos pescam mais do que o ambiente comporta—, enquanto 60% das espécies de peixes são exploradas ao máximo.

Há a opção da aquicultura, criação de peixes em cativeiro e que corresponde a 50% da produção mundial de produtos do mar consumidos por humanos, segundo estudo publicado pela Scientific American em 2019. O problema com isso é comumente associado a práticas de fábrica, o que contribui para o aumento da poluição oceânica e eutrofização (quando um corpo d’água recebe uma grande quantidade de matéria orgânica enriquecida com minerais e nutrientes que induzem o crescimento excessivo de algas e plantas aquáticas).

Os peixes desenvolvidos pela Bluu não são exatamente uma novidade — embora a empresa seja a primeira do campo a atuar na Europa, outras companhias já vinham desenvolvendo pesquisas similares nos EUA e na Ásia. Todas elas concordam que esse método, porém, é menos agressivo ao meio ambiente.

Mais além, uma estrutura baseada no crescimento celular pode ser montada em qualquer lugar do mundo (ao contrário da aquicultura), e permite a geração de alimentos de alto valor nutricional, mas também livres de conservantes, engenharia genética e toxinas ambientais.

Segundo Rakers, a expectativa é que os produtos da Bluu sejam lançados até 2023.

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