As redes sociais vêm reagindo bastante a uma conversa vista no reality show “A Fazenda”, em sua 13ª edição pela Rede Record. Em um bate-papo descontraído entre os participantes Nego do Borel e Dayane Mello, ela contou a ele sobre como é possível alguém “ir até a Nasa” (sic) e “comprar uma estrela”, para o espanto do funkeiro.

Como em qualquer show do tipo, a internet foi tomada de perguntas, memes, respostas, memes, pessoas duvidando, pessoas confirmando, mais memes, a ocasional discussão científica e, apenas para “temperar”, memes. Mas afinal, é possível mesmo comprar uma estrela no céu?

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Bom, não. Não é. Nem perto disso. Mas há toda uma indústria que jura que sim.

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Como comprar uma estrela?

A primeira coisa a se pensar nessa discussão é: para “comprar” uma estrela, alguém precisaria “vendê-la”, e esse alguém deveria ser dono dela. O problema com isso é que, no espaço, ninguém é dono de nada. Assim, se você não é proprietário do produto, não há como você ter a capacidade de vendê-lo.

O que muitas empresas fazem é emitir uma espécie de certificado de nomeação, onde uma estrela recebe o “seu nome” (ou qualquer outro que você desejar), por um preço. Geralmente, isso varia em torno de US$ 60 (R$ 320,75) a US$ 300 (R$ 1603,74), o que atrai um bom número de pessoas – especialmente em datas comerciais como o Dia dos Namorados ou algum aniversário de relacionamento.

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E tecnicamente falando, eles não estão errados: você consegue dar um nome a qualquer coisa – seu animal de estimação, seu carro etc. Muita gente desenvolve uma relação mais afetiva com determinados objetos.

Mas qual a validade disso?

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Bem, zero.

Tem um órgão que nomeia estrelas, mas ele não as vende

Pois é, em termos práticos, o “nome de uma estrela”, no sentido de “título de referência” ou “identidade”, não pode ser vendido por ninguém, porque ninguém é “dono” dela. Então, ao contrário do diálogo no vídeo acima, não é uma questão de “buscar a Nasa e pagar”.Na verdade, nem mesmo a Nasa oferece esse tipo de serviço, considerando que eles são: a) um órgão federal ligado ao governo dos EUA; e b) não são donos do espaço (embora sejam a agência espacial mais famosa).

Nomear uma estrela é uma ação pertinente a uma única entidade: a União Internacional Astronômica (IAU, na sigla em inglês). Baseada em Paris, na França, ela é responsável por aprovar e catalogar nomenclaturas não só de estrelas, mas da maioria dos corpos celestes: cometas, asteroides, galáxias inteiras, nebulosas – tudo passa pelo crivo processual da União.

E sim, há um processo específico para isso: neste caso, as estrelas mais brilhantes recebem o nome da constelação à qual elas pertencem, acompanhadas de uma letra do alfabeto grego para determinar seu grau de importância. É justamente por isso que não temos, por exemplo, uma estrela nomeada “Arbulu”: isso não soaria nada bem.

Imagem mostra Alpha e Beta Centauri, duas estrelas relativamente próximas da Terra, e que já foram alvos de aproveitadores que diziam ser possível "comprar estrelas
As estrelas Alfa Centauri (esq.) e Beta Centauri (dir.) são dois objetos celestes nomeados pela IAU, mas aproveitadores no passado juravam terem a capacidade de “vendê-las” (Imagem: Nasa/Divulgação)

Por exemplo: Alpha Centauri e Beta Centauri são, respectivamente, a primeira e segunda estrelas mais brilhantes da constelação de Centauro, nossa vizinha mais próxima. Alpha está a 4,37 anos-luz de distância da Terra (a saber: 1 ano-luz é igual a 9.460.800.000.000 quilômetros – quase 9,5 trilhões) e é cerca de 1,5 vez maior que o nosso Sol.

Isso vai percorrendo em escala até a última letra do alfabeto grego. A partir daí, a IAU simplesmente enumera as estrelas menos brilhantes com combinações de letras e números, como é o caso da recentemente nomeada GL229B (uma anã-marrom). O “B” é indício de que existe uma outra estrela, mais brilhante, com o mesmo nome. Inclusive, a GL229B está na órbita ao redor da mais brilhante GL229.

Então é golpe?

Então de onde vem esse “comércio de estrelas”? Bom, as fontes divergem em vários aspectos, mas todas parecem apontar para o chamado “Diretório Nacional de Estrelas”, uma entidade comercial especializada em fazer esse tipo de “produto”. Praticamente todas as empresas que oferecem esse tipo de comércio registram os pacotes vendidos com ele – incluindo algumas no Brasil.

O problema: o diretório não é um corpo astronômico reconhecido, e não tem qualquer autoridade para fazer o que faz. Inclusive, uma busca rápida no Google mostra que o Departamento de Assuntos de Consumo de Nova York emitiu diversas multas à entidade por isso.

O serviço deles é, basicamente, identificar uma estrela de baixa relevância nos estudos espaciais (ou seja, menos famosa), marcá-la como “não nomeada” (apesar de ela o ser) e dizer à clientela: “Essa é sua estrela”. A partir daí, você paga uma taxa – mais cara se quiser uma moldura (sim, é sério) – e eles vão emitir um “certificado” com as coordenadas da “sua” estrela no céu.

Imagem mostra um certificado de propriedade de uma estrela, mas documento não tem valor legal, oficial ou científico
Um exemplo de certificado de estrela nomeada a partir de um comprador: empresas que fazem esse tipo de comércio emitem um documento que não tem qualquer valor científico ou de propriedade, logo, não é oficialmente reconhecido (Imagem: NameAStar.com/Reprodução)

O problema: não há qualquer validade – científica, de propriedade ou qualquer outra – nesse documento. Não à toa, há casos e casos de pessoas que levaram o diretório à justiça quando descobriram que as “suas” estrelas já haviam sido nomeadas – como algo totalmente diferente – pela IAU. E convenhamos, se houvesse a remota possibilidade de se nomear uma estrela como sua, isso custaria bem mais do que R$ 300.

Não é bem um “golpe”, já que o diretório se defende alegando nunca ter prometido que a “sua” estrela seria de fato “sua”, ou mesmo nunca assegurou qualquer autoridade no assunto. Mas há quem o tenha derrotado na justiça alegando “má fé” ou propositalmente levar seus clientes a algo.

Assim sendo, vamos parafrasear outra participante d’A Fazenda – a também funkeira Tati Quebra-Barraco: “o dono das estrelas é Deus” (ou qualquer divindade pertinente à sua fé). 

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