Há exatos 175 anos, o planeta Netuno foi descoberto, a partir de uma história épica, que envolve persistência, matemática, algumas “tretas” e muita genialidade.

Netuno é o oitavo planeta do Sistema Solar e também o último desde a reclassificação de Plutão. Ele está a 4,5 bilhões de quilômetros de distância e por isso, mesmo sendo 4 vezes maior que o do nosso planeta, ele não é visível a olho nu aqui da Terra.

Leia mais:

Netuno fotografado pela sonda Voyager 2 em 1989
Netuno fotografado pela sonda Voyager 2 em 1989. Créditos: NASA/JPL/Voyager-ISS/Justin Cowart

Netuno só poderia ser observado por telescópio, mas sua descoberta só foi possível graças à Matemática e às observações de Urano, descoberto casualmente em 1781 por William Herschell.

publicidade

Os astrônomos passaram a observar o movimento de Urano a fim de traçar sua órbita com máxima precisão. Entretanto, a posição observada do planeta não era exatamente a posição prevista nos modelos matemáticos. E isso só seria explicado se os modelos estivessem errados, ou a órbita de Urano fosse afetada por um outro corpo celeste além da órbita de Urano.

A ideia de um oitavo planeta chamou a atenção do britânico John Couch Adams. Autodidata em astronomia e matemática, Adams se dedicou a analisar os dados das observações de Urano para, utilizando nada mais do que a lei da gravitação de Newton, deduzir a massa, posição e órbita do corpo celeste que perturbava Urano.

John Couch Adams
John Couch Adams. Fonte: wikimedia.org

Em setembro de 1845, Adams enviou seus resultados para James Challis, diretor do Observatório de Cambridge e em outubro, para Biddell Airy, em Greenwich. A ideia era que eles procurassem pelo oitavo planeta na região do céu calculada por ele, mas aparentemente, nenhum dos dois se convenceu.

Aliás, Airy se convenceu sim, mas só no ano seguinte, depois de ler um trabalho apresentado pelo francês Urbain Le Verrier na Academia de Ciências de Paris. De forma independente, Le Verrier havia feito os mesmos cálculos de Adams, chegando a um resultado muito próximo ao do astrônomo britânico.

Urbain Le Verrier
Urbain Le Verrier. Fonte: wikimedia.org

Impressionado com a coincidência e percebendo que já havia perdido muito tempo, Airy iniciou uma corrida dramática para garantir aos ingleses a descoberta do novo planeta. Por várias noites, James Challis e William Lassell, os astrônomos designados por Airy, vasculharam as regiões do céu apontadas por Adams procurando algum astro que não estivesse nos mapas celestes, e que poderia ser o oitavo planeta.

Alheio ao drama britânico, Le Verrier enviou uma carta ao astrônomo alemão Johann Galle do Observatório de Berlim, e o convenceu a procurar pelo planeta. Na mesma noite em que recebeu a carta, em 23 de setembro de 1846, Galle observou um astro a apenas 1 grau da posição prevista por Le Verrier, e que não estava nos mapas celestes. Na noite seguinte notou uma ligeira mudança em sua posição, o que confirmava se tratar de um planeta.

Pedaço do mapa celeste utilizado para localizar Netuno, mostrando seu deslocamento observado e a posição calculada por Adams
Pedaço do mapa celeste utilizado para localizar Netuno, mostrando seu deslocamento observado e a posição calculada por Adams. Fonte: Observatoire de Paris

A rivalidade entre franceses e britânicos é histórica, e muitas vezes, histérica. Fica fácil imaginar o tamanho da treta gerada pelas observações de Galle. Durante algum tempo, eles brigaram pelos méritos do descobrimento e pelo direito de nomear o planeta.

Antes que a disputa terminasse em algum programa de arranca-rabo na TV, a turma do deixa disso entrou em campo e uma solução de consenso foi adotada. Le Verrier Galle e Adams foram considerados co-descobridores do planeta, que passou a se chamar Netuno, nome sugerido por Le Verrier, mas adequado ao padrão de nomes de deuses romanos adotado nos outros planetas.

Esboço de pintura de Edmond-Louis Dupain para o teto da rotunda leste do Edifício Perrault do Observatório de Paris
Esboço de pintura de Edmond-Louis Dupain para o teto da rotunda leste do Edifício Perrault do Observatório de Paris. A pintura mostra Le Verrier apontando para Netuno no céu, o Observatório de Berlim e Galle em seu telescópio, além outros importantes personagens da astronomia francesa e um anjo, laureando Le Verrier pela descoberta. Obviamente, nenhum inglês é representado. Fonte: Observatoire de Paris

A descoberta de Netuno há 175 anos, além de épica, marcou a história e inaugurou uma nova fase da Astronomia. Uma fase em podemos enxergar o Universo a partir da Matemática, quase tão bem, quanto enxergamos pelos telescópios.

Já assistiu aos novos vídeos no YouTube do Olhar Digital? Inscreva-se no canal!