Cientistas ligados a universidades, institutos e hospitais da China publicaram um total de 788 mil artigos científicos em 2020 em todas as áreas do conhecimento, o que equivale a uma média de 90 resultados científicos novos por hora publicados em trabalhos acadêmicos com a participação de chineses. Dessa forma, o país ultrapassou de maneira inédita os EUA, líder até então.

China lidera ranking de maior número de publicações científicas no mundo pela primeira vez. Imagem: imtmphoto – Shutterstock

Segundo esse levantamento, feito pelo jornal Folha de S.Paulo, os EUA tiveram 767 mil artigos científicos publicados no mesmo período. 

Ainda de acordo com o estudo da Folha, o número de publicações norte-americanas registra um crescimento de 2,4% em relação ao ano anterior, enquanto a produção científica chinesa cresceu 10%, em um ritmo cada vez mais acelerado ano após ano.

Extraídos da plataforma Scimago, que inclui métricas de mais de 20 mil periódicos científicos de uma base chamada Scopus, os dados consideram os trabalhos acadêmicos publicados nesses veículos após a revisão dos pares (como é chamado o processo de análise e aprovação dos cientistas).

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As áreas de conhecimento lideradas pela China são a biologia molecular e a farmacologia, principalmente com pesquisas relacionadas diretamente à Covid-19. No entanto, o país também está em primeiro lugar no mundo em assuntos como astronomia, agricultura, ciências da computação e engenharias. Nos estudos em economia, a China ocupa o segundo lugar, e em artes e humanidades, o país ocupa a sexta posição global.

Segundo a Folha, os números impressionam porque há vinte anos a produção científica chinesa era quase seis vezes menor do que a norte-americana. Em 2001, os EUA tinham 373,5 mil artigos científicos publicados, contra 65,6 mil da China.

Naquela época, uma intensa política de incentivo ao ensino superior, que começou na década anterior, ganhava força na China. E isso mostra resultados agora. “A China tem investido muito em pesquisa e desenvolvimento”, afirmou a socióloga Adriana Abdenur, que é especialista em políticas públicas e relações internacionais e já atuou em universidades chinesas.

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Políticas de incentivo à ciência na China ajudaram o país a se consolidar no cenário

Segundo Adriana, o país tem várias políticas de promoção e de avaliação da carreira de pesquisa, muitas vezes até mesmo de aumento de salário atreladas à produção científica. “De certa forma, é uma adoção do modelo ocidental de avaliação de performance dos acadêmicos”.

Além disso, a China também passou a investir pesadamente em um grupo de universidades chinesas de excelência em pesquisa. Duas dessas universidades estão entre as melhores do mundo: Pequim e Tsinghua, que estão empatadas em 16º lugar na última edição do ranking universitário global Times Higher Education (THE). Há uma década, essas instituições estavam, respectivamente, em 46º lugar e 52º lugar no mundo na mesma lista.

Outro componente forte da política de estado chinesa é a internacionalização do ensino superior. “Há um envio de estudantes para o exterior com uma orientação muito bem delineada no sentido de aprender métodos e dinâmicas dos grandes centros globais”, explicou Adriana.

Segundo a socióloga, esses estudantes acabam voltando para a China fluentes em inglês, que é a principal língua da ciência, o que também contribui para o aumento da produção científica daquele país.

De acordo com o último relatório do Instituto de Educação Internacional dos EUA (IIE, na sigla em inglês), 35% dos quase 1 milhão de estudantes estrangeiros matriculados nas universidades norte-americanas tinham vindo da China no ano letivo de 2020/2021. Em seguida, vem a Índia, com 18%.

Em termos de visibilidade, a produção acadêmica chinesa e a dos EUA estão praticamente empatadas. Uma das formas de medir isso é a quantidade de vezes que um artigo científico é mencionado por outros trabalhos acadêmicos. Tanto os trabalhos chineses quanto os norte-americanos publicados em 2020 foram citados 1,2 vez cada um naquele mesmo ano.

Nos corredores acadêmicos, no entanto, fala-se em “fábrica de artigos científicos” na China como forma de inflar os dados. Existem casos de produções acadêmicas baseadas, por exemplo, em dados falsos. As denúncias, porém, não foram apenas sobre artigos chineses.

Produção científica brasileira registra aumento

Em um ritmo bem mais modesto do que o da China, segundo os dados da Scimago, as produções científicas do Brasil também têm crescido. O país ocupa o 13º lugar no mundo no mesmo ranking de produção científica em 2020, com a marca recorde de 100 mil trabalhos acadêmicos publicados em periódicos científicos, representando um aumento de 9,34% em relação ao ano anterior.

Aí vem a pergunta que não quer calar: como é possível que a ciência brasileira esteja em crescimento se os investimentos em pesquisa estão diminuindo? “A produção científica de 2020 ainda reflete os investimentos feitos de 2019 para trás. Leva um tempo para cortes em financiamento à ciência terem um efeito forte sobre produção científica”, explica Leandro Tessler, físico da Universidade de Campinas (Unicamp).

Como é de conhecimento geral, os recursos federais para ciência brasileiros têm sofrido cortes drásticos há alguns anos. O orçamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que é a agência federal responsável pelo pagamento de bolsas a pós-graduandos (uma espécie de salário), por exemplo, passou de R$3,14 bilhões, em 2013, para R$1,21 bilhão neste ano – e pode ficar ainda menor em 2022.

“Os cortes em bolsas de pesquisa devem ter consequências na produção científica nos próximos anos”, diz Tessler.

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