Enquanto a Tesla e outras montadoras se orgulham de produzir carros elétricos luxuosos e aerodinâmicos, a Quantum Motors, startup da Bolívia, oferece um passeio mais suave – e talvez claustrofóbico. Isso porque startup desenvolveu um modelo de minicarro elétrico, com espaço para até três pessoas (de porte “não muito grande”) e velocidade máxima de 56 km/h.

Do tamanho de um carrinho de golfe e construído como uma caixa (daí o “Quantum”, que significa “Quântico”, no nome), os carros da marca boliviana têm espaço apenas para o motorista na frente, enquanto até dois passageiros conseguem se aconchegar atrás. Além disso, carrinho aguenta percorrer 95 quilômetros antes de precisar de uma recarga – que pode levar de seis a oito horas.

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Carrinho elétrico da Quantum

Um minicarro elétrico construído pela startup boliviana Quantum Motors circula pelas ruas de Cochabamba, na Bolívia
Um minicarro elétrico construído pela startup boliviana Quantum Motors circula pelas ruas de Cochabamba, na Bolívia (Imagem: Reuters)

“Foi amor à primeira vista”, disse Daniel Derenne, aposentado de 62 anos de Cochabamba, em entrevista ao Wall Street Journal. Derenne comprou um Quantum logo após seu lançamento, em setembro de 2019. Até o momento, ele dirigiu 9,6 mil quilômetros – distância pouco maior do que entre São Paulo (capital) e Londres (Inglaterra) – em seu minicarro. Ele atesta que cabem três pessoas, “mas não podem ser muito gordas”.

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Os fundadores da Quantum acreditam que o minicarro elétrico – o primeiro fabricado na Bolívia – é o futuro da indústria automotiva na América Latina, lar de 670 milhões de pessoas. Nas ruas congestionadas do mundo em desenvolvimento, carros em miniatura fazem mais sentido, disse Carlos Soruco, um dos fundadores da Quantum. E é muito mais barato de operar do que automóveis convencionais.

Proprietários do Quantum dizem que gastam cerca de US$ 7 (R$ 35 na cotação atual) por mês para carregar seus carros. O EV de fabricação boliviana pode ser conectado a qualquer tomada, eliminando a necessidade de investir em estações de recarga caras. E encontrar espaços para estacionar é uma tarefa fácil.

Seu preço de US$ 7,5 mil (R$ 38 mil, aproximadamente) o torna muito mais acessível do que EVs mais chamativos que chegam às ruas nos EUA e na Europa. “Estamos convencidos de que o desenvolvimento de veículos elétricos na América Latina não será com Teslas ou Volkswagens”, disse Soruco.

Até agora, a Quantum vendeu 370 carrinhos elétricos.

Desenvolvimento boliviano

Mulher e cachorro dentro de minicarro elétrico boliviano
Ximena Pérez comprou minicarro da Quantum na pandemia e leva seu cachorro em passeios: ‘Ele foi feito para o carro’ (Imagem: The Wall Street Journal)

Os bolivianos há muito sonham em ter sua própria indústria automotiva, acreditando que isso permitiria que uma das nações mais pobres do hemisfério ocidental reduzisse sua dependência econômica da exportação de matérias-primas, da prata ao gás natural. Os políticos prometem que sua nação sem litoral um dia usaria seus vastos depósitos de lítio – os maiores do mundo – para impulsionar a transição do mundo para uma energia mais verde.

Angie Sciaraffia, estudante de medicina, ficou encantada ao comprar um carro de fabricação boliviana, com espelho retrovisor tão pequeno que cabe na palma da mão. Ela optou por um Quantum azul diamante com vidros escurecidos e teto solar. “Ter um carro boliviano é espetacular”, disse Sciaraffia, descrevendo-o como fácil de dirigir. “Você apenas acelera e freia.”

Na Bolívia, a Quantum tem poucos seguidores, mas leais, entre proprietários de carros, como Sciaraffia, que buzina e acena para outros motoristas da Quantum quando eles se veem na rua de Cochabamba.

Ximena Pérez adora o dela. Ela comprou o carro durante a pandemia, preocupada em pegar ônibus lotados. Ximena disse que nunca sentiu falta de espaço no carro, exceto uma vez quando ela foi acampar. Ela lutou para colocar sua barraca, um pneu sobressalente e seu cachorro na parte de trás do Quantum. Felizmente, seu cachorro é um chihuahua. “Ele foi feito para o carro”, disse ela.

Burocracia

Funcionário da Quantum mexendo com baterias de lítio em linha de montagem
Bolívia tem maiores depósitos de lítio do mundo, mas Quantum importa material da China por conta do controle estatal rígido (Imagem: The Wall Street Journal)

Inicialmente, a empresa não podia registrar seus carros na Bolívia porque as leis locais exigiam que todos os veículos tivessem um documento de importação, papelada padrão em um país onde ninguém jamais havia feito um carro antes. As companhias de seguros estavam cautelosas em fornecer cobertura. Os bancos não tinham certeza de como estruturar empréstimos para carros.

A Quantum fechou as portas por algumas semanas logo após a abertura em 2019, quando violentos protestos políticos paralisaram a Bolívia. Então a pandemia veio, derrubando cadeias de suprimentos globais e tornando mais cara a importação de peças chinesas. Hoje, a escassez de dólares na Bolívia dificulta o pagamento das importações.

Apesar dos enormes recursos de lítio da Bolívia, o país quase não produz por conta própria devido ao rígido controle estatal que tem impedido investimentos privados. Como resultado, baterias da Quantum usam lítio da China.

Ideia

Funcionário montando minicarro elétrico boliviano
Engenheiro José Carlos Márquez teve ideia do carrinho enquanto construía carrinho de mão elétrico para mineradores (Imagem: The Wall Street Journal)

José Carlos Márquez, engenheiro que é o outro fundador da Quantum, teve a ideia do EV em 2015 enquanto construía um carrinho de mão elétrico para mineradores. Ele está convencido de que a transição para veículos elétricos exigirá redução do tamanho dos carros para evitar o desperdício de energia.

Edgar Roman comprou seu Quantum em 2020. Ele o usa para seu trabalho, que exige que ele visite escritórios do governo para preencher a papelada necessária para importar equipamentos de construção.

O Quantum, disse Roman, tende a começar com um solavanco em vez de acelerar gradualmente e oferece uma condução mais acidentada do que seu outro carro, um Nissan. O carro boliviano não tem calefação, então fica bem frio no inverno. Roman diz que também é estranho tentar falar com sua esposa enquanto ela está sentada atrás dele.

Uma vez, a bateria quase acabou. Ele chegou em casa dirigindo na velocidade de alguém fazendo jogging. Outros veículos buzinaram para que ele se afastasse. Sua mãe estava sentada no banco de trás. Ela dizia: “você consegue, Quantum, você consegue”.

Parecido, mas diferente

Minicarro elétrico Comet EV, da MG Motor, em exibição num palco
Mini EV lançado pela chinesa MG Motor é o carro mais barato da Índia (Imagem: Divulgação/MG Motor)

Já na Índia, a montadora chinesa MG Motor lançou o Comet EV, modelo de minicarro elétrico que custa menos de R$ 50 mil (em conversão direta, na cotação atual). Por lá, é o carro mais barato dessa categoria.

Em comparação ao EV da startup boliviana, ele é um pouco maior e consegue ir mais longe com uma única carga. Ideia da empresa é usá-lo para enfrentar rivais locais – por exemplo, a Tata Motors – no terceiro maior mercado automotivo do mundo.

Com informações do Wall Street Journal

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