Durante a noite, as estrelas brilham e dão luz ao céu noturno, embelezando-o e nos dando uma bela vista. Ao menos, era o que acostumava acontecer.

Com a evolução da sociedade e da tecnologia, as estrelas passaram a ficar cada vez menos visíveis.

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Um exemplo disso é o condado de Chelan, em Washington, EUA, onde a claridade do céu noturno foi comprometida por luzes irradiando em sua direção, obscurecendo a visão que temos do Universo aqui na Terra. A poluição luminosa tende a piorar. Esse relato foi colhido em 2018.

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Em 2019, um crescimento inesperado na poluição luminosa surgiu após o condado adotar luzes de LED em suas ruas, brilhando intensamente ao usar menos energia em relação às lâmpadas de bulbo tradicionais.

Um ano após a mudança inicial, o brilho adicional mascarou cerca de metade das estrelas visíveis anteriormente. Contudo, o que aconteceu lá não é exclusividade.

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  • Contudo, se engana quem pensa que as lâmpadas LED afetam somente o céu noturno; há indícios de problemas à saúde do ser humano;
  • Na última década, cientistas identificaram que o céu vem ficando cerca de 10% mais brilhante por conta das luzes artificiais;
  • A maioria são as de LED, que emitem muita claridade;
  • As luzes das ruas são parte do problema, mas são acompanhadas por iluminações de estádios e outdoors.

Saúde afetada

Essas mesmas luzes também afetam nossa saúde, segundo os cientistas. Tipos comuns de lâmpadas de LED possuem proporções maiores de comprimentos de onda mais azuis, o que pode afetar os padrões de sono das pessoas. Elas:

  • Atrapalham e podem até interromper nossos ritmos circadianos (mudanças regulares dos estados mental e físico ocorridos durante cerca de 24 horas);
  • Diminuem o desempenho de nosso sistema imunológico;
  • Aumentam a ocorrência de algumas doenças – entre elas, o câncer.

As pessoas precisam entender que as luzes de LED estão sendo instaladas e utilizadas em todos os lugares, não apenas nas ruas; elas estão ‘explodindo’ em todas as direções.

Jim White, engenheiro sênior de eficiência energética do Distrito de Utilidade Pública do Condado de Chelan

Porém, White adicionou: “É uma forma de poluição que podemos resolver.” Agências e organizações, tais como o Serviço de Parque Nacional e a Associação Médica Americana, ambas dos EUA, recomendam formas de reduzir a poluição luminosa e seus efeitos negativos sobre nossas vidas. As mudanças começam em qual tipo de luz LED deve ser adquirida e instalada.

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Sono pode ser negativamente afetado pela luz de LED (Imagem: Gorodenkoff/Shutterstock)

Luz (de LED?) no fim do túnel

A preocupação veio à tona nos últimos anos com a emergência da então nova tecnologia LED.

As lâmpadas de LED consomem 90% menos energia e podem durar até 25 vezes mais que luzes incandescentes.

Como o tipo mais eficiente energeticamente no mercado, não é surpreendente haver tantas pessoas mundo afora que adotaram e que seguem adotando a tecnologia LED.

O Departamento de Energia dos EUA estimou que as luzes LED foram cerca de 19% de todas as instalações de iluminações em 2017 no país, poupando cerca de 1% de toda a energia consumida pelos estadunidenses.

Em 2035, espera-se que a tecnologia esteja em 84% das iluminações instaladas em todo o país do continente norte-americano. Estradas, estacionamentos, fachadas de edificações, entre outros, deverão ter suas iluminações 100% convertidas até lá.

Consequências positivas e negativas

White está empolgado que o condado de Chelan, localizado no meio do Estado de Washington com população de 80 mil pessoas, mais ou menos, faça parte das mudanças relativas às lâmpadas de LED.

Desde 2014, o Distrito de Utilidade Pública de Chelan se encontra com governos locais, comunidades e agências para discutir o necessário para a substituição da iluminação pública tradicional.

Em 2018, a instituição começou projeto de US$ 1,9 milhões (R$ 9,1 milhões), em parte financiada pelo Departamento de Comércio do Estado de Washington. A verba previa a troca de quase 3,7 mil lâmpadas públicas de sódio de alta pressão com LEDs. A quantidade equivale a cerca de 60% do total existente no Estado.

Após a transição, as novas lâmpadas conservaram mais de 2,6 milhões kWh, o bastante para abastecer cercar de 120 casas totalmente eletrificadas no condado por um ano.

Porém, há pontos negativos também. Pesquisadores do Serviço de Parque Nacional identificaram que luzes de LED escureceram mais as estrelas, especialmente no horizonte.

“Você até pode dizer que a iluminação está maior, mas isso também vale para o céu… o céu inteiro ficou mais claro”, afirmou Li-Wei Hung, astrônomo do Serviço de Parque Nacional que publicou estudo sobre a transição de iluminação no condado.

Há apenas alguns anos, isso [era] algo novo para nós. A mudança para luzes de LED de fato diminuíram a poluição de luzes, ou a aumentaram? Não [sabíamos] ao certo.

Li-Wei Hung, astrônomo do Serviço de Parque Nacional

Luzes de LED têm benefícios e malefícios (Imagem: Steve Heap/Shutterstock)

Aumento, aumento e aumento da poluição

Câmeras mostraram que o céu sobre a Montanha Burch, localizada no condado, estava 60% mais claro após a completa mudança de tecnologia em 2019 quando comparado com 2018. As novas lâmpadas artificiais ficou em 3,69 vezes o nível da luz natural.

Segundo White, o aumento da poluição foi “uma total surpresa”, pois o Distrito de Utilidades Públicas tentou direcionar as lâmpadas para o chão, mas as luzes continuaram dispersas.

Dados individuais de brilho noturno de várias cidades são difíceis de se conseguir, o que destaca ainda mais a importância do estudo em Chelan para se entender os prós e contras da iluminação LED.

Contudo, as observações indicam que Chelan não é mesmo a única, pois, entre 2011 e 2022, dados divulgados por cientistas locais indicaram que a média de claridade do céu noturno aumentou 9,6% a cada ano, algo que os pesquisadores atribuem às mudanças na iluminação artificial.

Algumas cidades, como Washington D.C., pararam a transição após moradores se preocuparem com a interrupção de seu sono pela nova iluminação. Mas, por que as luzes de LED se destacam mais no céu noturno do que outras formas de iluminação? A resposta encontra-se na luz azul presente no LED.

A luz azul e seus malefícios

As luzes de LED emite mais luz azul do que bulbos regulares. Essa luz viaja em curtos comprimentos de onda (entre 450 e 495 nanômetros) e frequências maiores, fazendo com que as partículas de ar oscilem mais rápido e se espalhem mais na atmosfera em relação às outras cores.

O azul é redirecionado em várias direções céu afora. É por isso também que o céu parece ter essa coloração.

O olho humano também é muito sensível aos comprimentos de onda das luzes mais azuis. Ele possui dois fotorreceptores chamados bastonetes e cones, que nos auxiliam no reconhecimento de cores e tons.

Nos últimos tempos, os cientistas identificaram a função de outro fotorreceptor existente no olho, de nome célula ganglionar retinal intrinsecamente fotossensível, ou apenas ipRGC.

Eles são sensíveis aos comprimentos de onda mais curtos e mantém as pessoas em alerta, suprimindo o popular hormônio melatonina, que possui função em nosso sono.

Uma das marcas de nosso relógio circadiano é seu tempo de produção de melatonina. Ela está correlacionada com a sonolência. Quando você expõe as pessoas à luz à noite, você suprime a produção da melatonina.

Manuel Spitschan, neurocientista da Universidade Técnica de Munique e do Instituto Max Planck para Cibernética Biológica

Spitschan explicou que, quando a luz mais azul alcança nossos olhos, as ipRGCs iniciam a disparar rapidamente por conta de uma molécula sensível à luz chamada melanopsina, que converte os fótons em sinal elétrico para o cérebro para suprimir a produção de melatonina.

Quanto mais fótons são capturados pelas ipRGC, mais forte é o sinal produzido pelo fotorreceptor, levando à supressão da melatonina citada anteriormente.

Sem a melatonina para provocar a sonolência, a probabilidade de as pessoas ficarem acordadas por mais tempo é maior. Interrupções em nosso ritmo circadiano estão ligados a casos de câncer, como o câncer de mama, além de ser rotulado por possivelmente cancerígeno pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

Outra pesquisa identificou que interrupções em nosso ritmo circadiano estão ligadas a alguns problemas do coração. “Estamos mais sensíveis à luz azul do que estamos durante o dia”, pontua Chris Kyba, que quantifica a luz artificial no desenvolvimento noturno no Centro Alemão de Pesquisa para Geociências GFZ.

Luz azul prejudica nossa saúde do sono (Imagem: DKai/Shutterstock)

Qual é a solução?

Existe um mundo no qual luzes de LED mais eficientes energicamente existem e não interrompem a paisagem noturna e nem nossa saúde de forma significativa. A poluição luminosa “pode melhorar com LEDs, mas deve haver muita atenção ao design”, disse a biologista do Serviço de Parque Nacional Ashley Pipkin, que também é coautora do estudo sobre a poluição luminosa no condado de Chelan.

As soluções, que vão desde comprar certo tipo de luz LED para realizar mudanças, podem ocorrer ao nível da cidade e em casas.

O Serviço de Parque Nacional indica uma maneira de reduzir a poluição luminosa do céu é ser sensato quanto ao local no qual a iluminação se encontra: a luz é realmente necessária naquele espaço? E qual o tipo de brilho apropriado para tal uso?

Pipkin explicou que costumamos pensar que bulbos de luz baseado em potência, ou quanta energia o bulbo consome, mas nosso foco precisa mudar com as de LED. Os LEDs usam menos watts do que as lâmpadas incandescentes, e as pessoas precisam escolher uma lâmpada baseada em lumens (quantidade de luz emitida por uma fonte luminosa), frequentemente indicado como brilho.

Muitos usam muitas luzes LED mais claras do que o necessário, especialmente do lado de fora de suas residências e empreendimentos. Idealmente, você pode compra uma lâmpada de LED com potência bem menor e, ainda assim, obter o mesmo nível de brilho que um bulbo incandescente.

Uma lâmpada de LED de 30 w tem o mesmo número de lumens que uma incandescente de 250 w, segundo o Serviço de Parque Nacional. Porém, Pipkin salientou, “a indústria não costuma prover opções suficientes com lumens menores”.

Adicionalmente, substituindo cada bulbo tradicional por um de LED pode ser desnecessário. “Você não precisa de um monte de potência para iluminar a esquina”, indicou White.

Nem todas as luzes LED são iguais. Pode ser que você encontre, nas lojas, lâmpadas rotuladas com 4 mil Kelvin, 3 mil Kelvin ou, ainda 2 mil Kelvin. Essas temperaturas se correlacionam com a aparência do calor da luz (mais amarelo) ou a frieza (mais azul).

Por conta de nossos olhos serem sensíveis à luz azul à noite, os médicos recomendam a compra de luzes de LED com tons de cores mais quentes, como amarelo ou âmbar, o que significa usar lâmpadas abaixo de 4 mil Kelvin.

Na média, lâmpadas LED de 4 mil Kelvin são cerca de 29% constituídas de azul. Luzes de 3 mil Kelvin têm são cerca de 21% azul. Atualmente, há lâmpadas LED a menos de 2 mil Kelvin disponíveis no mercado. Tons mais quentes também se dispersa, menos na atmosfera do que a luz azul fria.

Mas fabricantes de luzes são lentos quando se fala em converter suas fabricações para tons mais quentes, disse Mario Motta, ex-cardiologista que ajudou na escrita das recomendações quanto à redução da poluição luminosa da AMA (Associação Médica Americana).

Quando ele estava escrevendo as recomendações, há mais de cinco anos, ele se lembrou de ter recebido resistência de empresas que já haviam comprado excedentes de lâmpadas com maior nível de luz azul.

Whits disse que ainda não há demanda suficiente para que as fabricantes produzam muitas luzes abaixo de 2 mil Kelvin. “Precisamos de mais pessoas pedindo isso e insistindo”, alegou.

Cortinas blackout ajudam muito na interrupção da propagação das luzes externas (Imagem: VH-studio/Shutterstock)

Bloquear ou limitar a luz

Em sua casa, cortinas blackout podem prevenir que as luzes das ruas iluminem quartos, o que pode ajudar a conter impactos negativos em seu sono. Detectores de movimento, timers e dimmers também podem reduzir as horas de luz artificial desnecessária e salvar mais energia.

Para iluminações fora de casa ou em espaços públicos, especialistas dizem que deve-se direcionar a luz para baixo. Evitar ficar descoberto oi exposto a luzes que emitem luzes para cima e horizontalmente. O ângulo e a altura da luz também pode afetar a propagação do feixe.

Enquanto direcionar para baixo os feixes de luzes LED podem auxiliar na redução da poluição luminosa. É por isso que é importante comprar LEDs de temperaturas quentes e lumens baixos.

Desde que iniciou a transição das luzes das ruas de Chelan para de LEDs, White e seus colegas não implementaram mais alterações.

Eles planejam realizar mudanças após produtos mais avançados chegarem ao mercado, sendo que alguns deles podem permitir as luzes que escureçam após tempo predeterminado à noite, ou aumentar seu brilho quando veículos estão se aproximando. Com melhores mudanças no futuro, White espera que as estrelas noturnas preencham o céu uma vez mais.

Amo pegar meu telescópio e ver os anéis de Saturno, as estrelas e as luas de outros planetas. Tentamos tudo que podíamos usando a melhor tecnologia disponível para fazer isso. É um problema comum para todos estarem cientes.

Jim White, engenheiro sênior de eficiência energética do Distrito de Utilidade Pública do Condado de Chelan

Como limitar a poluição luminosa

  • Use mais lâmpadas LED âmbares ou de temperaturas menores (com cerca de 2,7 mil Kelvin);
  • Cortinas blackout podem prevenir que as luzes de fora entrem em sua casa;
  • Instalar detectores de movimento ou escurecer luminárias;
  • Lâmpadas de rua encapuzadas podem ajudar a direcionar e conter a luz;
  • Use timers ou dimmers nas luzes.

Com informações de The Washington Post

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