Um artigo a ser publicado na edição de novembro da revista Icarus (já disponível na versão online), relata uma descoberta surpreendente sobre um dos quatro chamados gigantes gasosos do nosso Sistema Solar: Netuno. Segundo o estudo, as nuvens daquele mundo gelado e azul praticamente desapareceram.

Ao analisar imagens do planeta obtidas entre os anos de 1994 e 2022, a equipe notou um padrão estranho a partir de 2019. Ao redor das latitudes médias, a cobertura de nuvens parecia começar a sumir. Com o tempo, todas as evidências de nuvens desapareceram por completo.

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“Fiquei surpreso com a rapidez com que as nuvens desapareceram em Netuno”, disse Imke de Pater, professor emérito de astronomia da Universidade da Califórnia em Berkeley e autor sênior do novo estudo, em um comunicado. “Essencialmente, vimos a atividade da nuvem cair em poucos meses”.

O que o Sol tem a ver com as nuvens de Netuno?

A equipe liderada pelo pesquisador chegou a uma explicação fascinante para o mistério: é provável, sugerem os cientistas, que as nuvens de Netuno estejam relacionadas à maneira como nosso Sol se comporta durante seu ciclo de atividade de 11 anos.

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Chamado ciclo solar, esse período se refere, essencialmente, à maneira como os campos magnéticos de nossa estrela hospedeira mudam ao longo do tempo.

Diferentemente do que parece, o Sol não é um pedaço de rocha quente e escaldante. Na verdade, mais parece um oceano gigante esférico, feito de partículas carregadas, coletivamente conhecidas como plasma, o que significa que sua estrutura pode fluir e se moldar ao longo do tempo. Em conjunto com esse movimento, os campos magnéticos do Sol, diretamente associados a todas essas partículas carregadas, se emaranham.

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À medida que esses campos se emaranham, eles exercem cada vez mais “tensão” na estrela, até ela não aguentar mais. Então, a cada 11 anos, como uma reinicialização, os campos magnéticos do Sol se invertem, o que significa que o polo norte se torna o polo sul e vice-versa. A partir daí, a saga se repete.

Durante esses 11 anos, no entanto, outros tipos de coisas também acontecem devido a alterações no campo magnético. Emaranhados de campo magnético podem levar a um aumento do número e da intensidade das explosões solares, que são ejeções incrivelmente poderosas de radiação para o espaço. 

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Essas explosões, algumas vezes, podem ser tão fortes que até são capazes de interferir em satélites em órbita da Terra. Elas são frequentemente associadas a erupções gigantes de plasma solar conhecidas como ejeções de massa coronal, que podem inundar nosso planeta com partículas carregadas que geram interrupções temporárias nas linhas de comunicação.

Segundo a equipe, durante o ciclo solar, o Sol também emite grandes volumes de radiação ultravioleta à medida que seus campos magnéticos transitam. Considerando o quão totalmente massivo o Sol é, essa radiação meio que “inunda” o resto do Sistema Solar, conforme os pesquisadores.

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As nuvens voltam?

Para descobrir onde foram parar as nuvens de Netuno, os cientistas reuniram 30 anos de imagens de Netuno capturadas por observatórios ultrapotentes (no espaço e em solo), como o Telescópio Espacial Hubble, da NASA, e o Observatório W. M. Keck, localizado no Havaí.

Medição da radiação ultravioleta emitida pelo Sol entre 1994 e 2020. Crédito: NASA, ESA, LASP, Erandi Chavez (UC Berkeley), Imke de Pater (UC Berkeley)

Eles perceberam que parecia haver uma correlação clara entre o número de nuvens em Netuno e o ponto em que o ciclo solar do nosso Sol se encontrava. Mais especificamente, cerca de dois anos após o pico de cada ciclo – ou seja, o principal evento de inversão do campo magnético – Netuno exibiu alguma cobertura de nuvens sólidas. Foi somente depois desses picos que as nuvens começaram a desaparecer acima da atmosfera de hidrogênio, hélio e metano do planeta.

Potencialmente, isso significa que a radiação UV do Sol – mais forte no pico solar – pode estar promovendo uma reação fotoquímica, desencadeada pela absorção de energia na forma de luz, para produzir a calota turva de Netuno.

“E talvez essa reação leve algo como, digamos, dois anos para surtir efeito”, disse Imke ao site Space.com. Isso explicaria por que, dois anos após o pico solar, a equipe testemunhou nuvens netunianas em abundância. “Esses dados notáveis nos dão a evidência mais forte até agora de que a cobertura de nuvens de Netuno se correlaciona com o ciclo do Sol”.

Além disso, a equipe viu que quanto mais nuvens havia neste mundo azul congelado, mais brilhante parecia ser, porque havia mais luz solar refletindo nessas nuvens.

Os pesquisadores pretendem continuar observando a atividade das nuvens de Netuno para ver quando elas estão retornando. Na verdade, nos últimos dois anos, à medida que os raios solares UV aumentaram um pouco, eles já têm visto algum ressurgimento de nuvens.

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