Um estudo da USP caracterizou linhagens da bactéria Escherichia coli, encontrando espécies multirresistentes em amostras de solo e de água em diferentes regiões do Brasil.

Presentes em hospitais, sua propagação para outros locais é uma preocupação, uma vez que conseguem transferir, para outras bactérias, genes de resistência aos antimicrobianos.

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A pesquisa da faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP, utilizando métodos microbiológicos e moleculares, coletou:

  • 300 amostras de solo em fazendas de pecuária extensiva na região de Ribeirão Preto (SP) e Montes Claros (MG), entre 2017 e 2019.
  • 200 amostras de água de rios, ribeirões, córregos e lagos da região, entre 2018 e 2020, usadas para abastecimento público, irrigação, pesca, entre outros. 

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Importante para a vida humana, a E.coli ajuda na regulação de processos químicos, como a digestão, mas, dependendo da linhagem, pode causar infecções gastrointestinais e extraintestinais — que afetam o intestino e órgãos.

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De acordo com João Pedro Rueda Furlan, autor do estudo, as bactérias são consideradas multirresistentes ao resistirem a, pelo menos, um agente antimicrobiano de três classes diferentes de medicamentos.

A ideia do estudo era detectar essas bactérias [E. coli] no meio ambiente e avaliar o potencial de patogenicidade, bem como o perfil de resistência delas aos antimicrobianos. Além disso, para as classificadas como resistentes, também tentamos esclarecer quais são os mecanismos que estão associados à resistência.

Resultados das coletas

  • Das amostras de solo, 70 apresentaram presença de E. coli; dessas, 41 foram classificadas como multirresistentes.
  • Entretanto, as multirresistentes detectadas também possuem uma grande quantidade e diversidade de genes que transferem resistência aos antimicrobianos.
  • Na água, 64 amostras tinham E. coli multirresistentes, mostrando uma alta contaminação dos rios pela atividade humana.
  • Sendo assim, a amostra apontou que as bactérias também eram resistentes a vários antimicrobianos importantes e tinham muitos genes de resistência.
Dispersão de bactérias MDR e seus genes de resistência aos antimicrobianos no meio ambiente – (Imagem: Jornal da USP/Reprodução)

Resistência e versatilidade

Além disso, a versatilidade também foi um ponto importante observado, visto que é uma bactéria que, na maioria das vezes, adquire resistência por meio de elementos genéticos móveis.

Sua plasticidade é considerada muito grande, tanto no sentido de capturar novos genes de resistência, quanto no de transmiti-los para outras bactérias.

Na parte final do estudo, vimos que esses mesmos mecanismos apresentados pelos isolados de E. coli já haviam sido reportados, tanto aqui no Brasil quanto no mundo, há muitos anos, e em espécies bacterianas diferentes. Então, isso demonstra como as bactérias se comunicam entre si e trocam informações genéticas e que estão em constante evolução frente à resistência aos antimicrobianos.

Desafio global

Segundo Furlan, a resistência aos antimicrobianos surgiu nos hospitais. Por isso, poucas pesquisas se preocuparam com as bactérias em outros ambientes. A disseminação de bactérias multirresistentes fora dos hospitais é um desafio global.

Esses microrganismos podem transferir os genes de resistência para a microbiota, constituída pelos microrganismos presentes em um ecossistema. A microbiota, por sua vez, dissemina essas bactérias para outros setores do meio ambiente.

O pesquisador aborda esse problema sob a ótica do conceito de Saúde Única, enfatizando o papel central do meio ambiente, que está interligado direta e indiretamente com seres humanos, animais e plantas. Ele ressalta a importância do meio ambiente na disseminação da resistência antimicrobiana.

Se não temos um ambiente saudável, nós não vamos ter uma saúde humana e animal saudável. É importante mostrar que, além da contaminação ambiental por essa bactéria — a qual é oriunda possivelmente da poluição por esgoto doméstico, visto que muitas cidades ainda não possuem tratamento de esgoto —, clones de alto risco de E. coli estão presentes e contribuem para a disseminação e para a evolução da resistência antimicrobiana.