Quem nunca sonhou em dobrar o tecido do espaço-tempo e criar um buraco de minhoca para fugir daquele trânsito infernal de uma segunda-feira de manhã? Ou quem sabe, escapar daquele encontro de família onde só se discute política, pegando um atalho no fundo do guarda-roupa que te leva até um passado distante, onde não havia polarização e nem família? Talvez esses não sejam os melhores exemplos, mas a ideia de atalhos cósmicos conectando pontos distantes do universo, ou até mesmo épocas distintas do tempo, é um tema que intriga os cientistas há mais de um século. Trata-se de uma distorção hipotética no espaço-tempo conhecida como “buraco de minhoca”, que tornaria possível a viagem no tempo, em grandes distâncias no Universo, ou pelo menos, uma boa viagem na maionese!

Imagine o Universo como um colchão bem fofo cheio de bolinhas de gude sobre ele. O que deve acontecer com essas bolinhas de gude se colocarmos uma bola de boliche no meio do colchão? Ela vai afundar, vai criar uma curvatura no colchão e as bolinhas de gude cairão nessa curvatura. É exatamente isso que diz a Teoria da Relatividade Geral de Einstein. Objetos com muita massa, como estrelas e planetas, distorcem o espaço-tempo, e essa distorção determina como a matéria ao redor vai se comportar. 

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[ Analogia da deformação do espaço-tempo provocada pela massa da Terra - Imagem: Mysid/wikimedia.org ]
[ Analogia da deformação do espaço-tempo provocada pela massa da Terra – Imagem: Mysid/wikimedia.org ]

Até aí, tranquilo. Tudo de acordo com a física que a gente conhece e pode observar. Mas e se existisse um jeito de dobrar esse colchão espacial ao meio e criar um túnel ligando dois pontos distantes? O túnel desta analogia seria o buraco de minhoca, um atalho no espaço tempo que permitiria viagens mais rápidas que a velocidade da luz entre dois pontos distintos do Universo. Por mais que a ideia pareça absurda, a existência de buracos de minhoca é matematicamente possível, de acordo com as equações da Relatividade Geral de Einstein. 

A primeira pessoa a perceber isso foi o físico austríaco Ludwig Flamm. Em 1916, ao estudar as equações de campo da Teoria da Relatividade, ele percebeu que elas permitiriam a existência de “buracos brancos”, que seriam objetos com uma enorme força repulsiva, o exato inverso dos buracos negros. Flamm especulou que buracos brancos e buracos negros poderiam estar conectados através de túneis, que ficaram conhecidos como Túneis de Flamm.

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Mais tarde, o próprio Einstein e seu colega, Nathan Rosen estavam explorando suas equações, quando perceberam, em meio a cálculos e discussões acaloradas, que teoricamente, seria possível conectar dois pontos distintos do espaço-tempo através de uma espécie de “ponte”, com uma entrada e uma saída em pontos distintos do espaço-tempo, a chamada “ponte de Einstein-Rosen”, ou “buraco de minhoca” para os íntimos. A partir daí, a coisa toda começou a ficar interessante, porque os físicos se deram conta de que, se essas pontes realmente existissem, elas poderiam não só conectar lugares distantes, mas também momentos diferentes no tempo! Imaginem só as possibilidades: conhecer galáxias distantes, visitar os dinossauros no passado ou viajar para o futuro para ver o Mundial do Palmeiras!

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[ Geometria da deformação no espaço-tempo de uma Ponte de Einstein-Rosen - Imagem: wikimedia.org ]
[ Geometria da deformação no espaço-tempo de uma Ponte de Einstein-Rosen – Imagem: wikimedia.org ]

Mas vamos com calma, porque a coisa não é tão simples assim. Nem tudo que é possível na matemática tem sua contrapartida na realidade. Apesar de serem possíveis pelas equações da Relatividade Geral, os buracos de minhoca ainda são objetos hipotéticos. Isso significa que, até o momento, não temos nenhuma evidência observacional de que eles realmente existam. E tem mais: muitos físicos se debruçaram em cima de cálculos e estudos para entender a viabilidade da existência de buracos de minhoca. E a conclusão não é nada animadora.

Para começar, até hoje não foi comprovada a existência de um buraco branco, parte essencial para essa ponte cósmica. Além disso, os estudos mostraram que, se existirem, buracos de minhoca seriam extremamente voláteis, ou seja, eles se formariam e entrariam em colapso tão rapidamente que seria impossível usá-los como túnel. Seria como aquele elevador que fecha sempre que você se aproxima dele. Alguns cientistas teorizaram a possibilidade de manter um buraco de minhoca aberto e funcionando como um atalho cósmico estável, se houvesse força gravitacional repulsiva, impedindo o colapso do túnel, algo que contraria nossa compreensão atual da física. 

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[ Simulação de um buraco de minhoca ligando a frente do Instituto de Física da Universidade de Tübingen, na Alemanha, às dunas de areia próximas a Boulogne-sur-Mer, na França - Imagem: CorvinZahn - Gallery of Space Time Travel / wikimedia.org ]
[ Simulação de um buraco de minhoca ligando a frente do Instituto de Física da Universidade de Tübingen, na Alemanha, às dunas de areia próximas a Boulogne-sur-Mer, na França – Imagem: CorvinZahn – Gallery of Space Time Travel / wikimedia.org ]

Isso seria possível se existisse uma matéria com massa negativa, a chamada “matéria exótica”. Entretanto, até o momento, a matéria exótica existe apenas no campo da especulação, sem nenhuma evidência experimental que comprove sua existência. É uma gambiarra teórica criada apenas para manter viva a esperança de que os buracos de minhoca possam existir na natureza. 

Então, por que não construímos o nosso próprio buraco de minhoca? Pois é, os cientistas já pensaram nisso também. O problema é que para criar um buraco de minhoca, precisaríamos de uma quantidade absurda de energia. Algo que está muito além da nossa capacidade tecnológica atual. E para manter nossa ponte intergaláctica estável e navegável, ainda precisaríamos de enormes quantidades de matéria exótica, que nós nem sabemos se existe de fato.

Apesar de todas as dificuldades e incertezas, a busca por evidências da existência de buracos de minhoca continua a intrigar os cientistas. Afinal, estamos falando de objetos que poderiam revolucionar a nossa compreensão do Universo e abrir portas para possibilidades inimagináveis. Quem sabe um dia, a ciência não consiga desvendar os mistérios desses atalhos cósmicos e conduza a humanidade para uma nova e revolucionária época de viagens pelo espaço-tempo? Até lá, vamos continuar explorando o universo com os pés no chão e a cabeça nas estrelas. De vez em quando viajando na maionese, mas sempre expandindo os limites do Universo.