Um senso comum – junto a algumas pesquisas – nos fizeram acreditar que nosso paladar estava restrito às nossas bocas: conforme comemos algum alimento, as papilas gustativas em cada parte da língua interpretam os gostos antes de começar a digestão.

Uma revisão publicada este mês no The New England Journal of Medicine mostrou que não é bem assim. Na verdade, não existe região específica da língua para cada sabor e a boca não é a única que “sente gosto”.

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Percepção do gosto funciona por meio dos poros nas membranas celulares que estão presentes nas papilas gustativas, mas, também, em outros órgãos (Imagem: Nicoleta Ionescu/Shutterstock)

Pesquisas anteriores estavam erradas sobre língua e paladar

Você já deve ter escutado que cada parte da língua é responsável por interpretar um sabor diferente. Um estudo publicado em 1901 popularizou um diagrama que mostra exatamente isso. A parte da frente da língua, por exemplo, é responsável pelo sabor doce, enquanto as laterais e as anteriores sentem o salgado e o azedo.

Há um problema nisso: não era o que o cientista David Hanig, autor da imagem, estava propondo. Na verdade, ele quis destacar como diferentes áreas da língua tinham sensibilidade maior para sabores diversos. Não é que apenas um ponto da língua sinta o doce, mas que ele consegue senti-lo melhor até em concentrações menores.

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No entanto, o paladar é bem mais complexo que só a língua. A percepção do gosto funciona por meio dos poros nas membranas celulares que estão presentes nas papilas gustativas, mas, também, em outros órgãos, como o trato gastrointestinal, fígado, pâncreas, cérebro, tireoide, pulmões, células musculares e adiposas.

Claro, quando você come algo azedo, logo sente o incômodo, mas vai além. Segundo Diego Bohórquez, neurocientista do intestino-cérebro da Universidade Duke, ao The New York Times, os órgãos usam receptores para captar a presença de várias moléculas. Por exemplo, quando o intestino percebe açúcar no alimento, logo avisa ao cérebro para que ele alerte outros órgãos para a digestão.

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Pesquisas já sugerem que podemos ter receptor especial para gordura que pode ajudar na predileção do “paladar” pelo umami, encontrado no ketchup, por exemplo (Imagem: Roman Samborskyi/Shutterstock)

Nova percepção explica porque paramos de gostar de uma comida após certo tempo

  • Bohórquez explicou ao jornal que começou a estudar a conexão entre o intestino e o cérebro há duas décadas, quando uma amiga passou por cirurgia bariátrica e começou a gostar de ovos com gema mole, sendo que, antes, odiava;
  • A hipótese dele é que os receptores gustativos do intestino não estavam recebendo nutrientes o suficiente e indicaram que comê-los de outra forma (com a gema mole) seria uma boa ideia;
  • O exemplo explica como a percepção do corpo tem impacto no que chamamos de paladar, algo que vai além do gosto na língua. Da mesma forma que explica o porquê de começarmos a gostar de um alimento diferente, explica a razão de pararmos de gostar;
  • Nessa mesma linha, recentemente, pesquisadores passaram a estudar o umami, encontrado em alimentos, como ketchup e molho de peixe, passando a ser considerado um sabor no início dos anos 1990;
  • Pesquisas já sugerem que podemos ter receptor especial para gordura que pode ajudar na predileção do “paladar” por esse gosto.