Casos recentes de gripe aviária transmitida de animais para humanos e possíveis mutações do vírus para infectar mamíferos preocupam cientistas, que querem se precaver no caso de nova pandemia global. No entanto, a busca por vacinas contra o H5N1, causador da doença, não é tão tranquilizadora, já que as pesquisas ainda dependem de ovos de galinhas. E milhões deles.

Vacinas contra a gripe aviária ainda têm desafios (e envolvem ovos de galinha)

Alguns cientistas descrevem a situação como “quase cômica”: o principal ingrediente na produção de vacinas da gripe aviária são ovos de galinha fertilizados.

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Pode parecer algo simples. Bastaria ter muitas galinhas, certo? Não é bem assim: seriam necessários milhões de ovos e, mesmo assim, ainda há riscos.

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Rick Bright, que liderou a Autoridade de Pesquisa e Desenvolvimento Biomédico Avançado (BARDA) do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos durante a administração de Donald Trump, comentou que essa é uma tecnologia presente desde a década de 1940 e que ainda precisaria ser usada para prevenir uma pandemia no século XXI.

Só que a situação é mais preocupante do que cômica, já que a fórmula para uma vacina contra a gripe aviária requer duas injeções de 90 microgramas de antígeno, mas fornece, em troca, apenas imunidade mediana. Segundo ele, só nos EUA, seriam necessárias galinhas botando 900 mil ovos por dia durante nove meses. E há um problema nisso: as galinhas também podem ser infectadas pelo vírus.

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Criação de frangos
Ovos de galinhas já foram matéria-prima para outras vacinas, mas preocupam pela dimensão da produção (Imagem: Henadzi Pechan/iStock)

Gripe aviária já afeta animais e humanos nos EUA

Isso já vem acontecendo nos Estados Unidos. Por lá, o vírus H5N1 já afetou o gado em pelo menos nove estados, matou gatos de celeiro no Texas e aves em Nova York, sem contar a presença no leite de vacas.

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No final de maio, a infecção de trabalhadores do setor de laticínios com gripe aviária foi confirmada. Dois se recuperaram com poucos sintomas, mas um desenvolveu sintomas respiratórios que precisaram de tratamento antiviral. A preocupação dos cientistas é que o vírus passe por mutações que facilitem a infecção de humanos.

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Nos Estados Unidos, foram registrados casos de leite de vaca infectado com vírus da gripe aviária (Imagem: BearFotos/Shutterstock)

Método de produção ainda é um entrave

Aí é que entra a vacina. Como explicou o MedicalXpress, para produzir matéria-prima para o imunizante, o vírus é cultivado em milhões de óvulos fertilizados. Em alguns dos casos, eles não se desenvolvem como esperado, sofrendo mutações que os inutilizam (ou até aumentam o risco).

Também há a preocupação de que as galinhas que produzem os ovos sejam infectadas com a gripe aviária. Sem eles, não há ovos e não há vacinas.

Desde a gripe suína H1N1 em 2009, que alcançou o mundo inteiro antes que um imunizante fosse desenvolvido, cientistas procuram novas formas de produção. É um consenso que as vacinas baseadas em células são melhores, tanto na eficiência quanto na produção, mas ainda sofrem a influência dos ovos. E as empresas, que, anteriormente, investiram bilhões nisso, não querem desapegar.

gripe aviária
Cientistas estão preocupados que gripe aviária possa se tornar pandemia (Imagem: Pordee_Aomboon/Shutterstock)

Ou seja: cura para gripe aviária pode depender dos ovos de galinha

  • Bright, dono de uma agência que investiu US$ 1 bilhão (R$ 5,3 bilhões, na conversão direta) em fábrica de vacinas contra gripe baseadas em células, comentou que não é possível combater uma pandemia de gripe aviária com imunizante baseado em ovos de galinha;
  • A questão é que não parece haver saída, pelo menos por ora;
  • A BARDA armazenou milhares de doses de uma vacina contra H5N1 que estimula a criação de anticorpos – e pode escalar essa produção. No entanto, o imunizante não se mostrou totalmente eficaz à estirpe circulando no momento;
  • A BARDA está apoiando outros ensaios clínicos para encontrar alternativas, mas, com os casos recentes, a produção é mais urgente;
  • Segundo David Boucher, diretor de preparação para doenças infecciosas da Administração de Preparação e Resposta Estratégica do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA, com os recursos disponíveis no momento, a melhor opção ainda é aproveitar a estrutura de vacinas baseadas em ovos;
  • Para ele, o sistema “funciona bem neste momento para cumprir seus objetivos de uma vacina sazonal”, o que justifica se manter com os ovos de galinha – por enquanto.