Desde que foi definido, em 2007, pela Organização das Nações Unidas, 2 de abril é o Dia Mundial de Conscientização do Autismo. A cada quatro pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), apenas uma é mulher, segundo a edição mais recente do relatório bianual do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos EUA.

Existem duas possíveis leituras sobre essa diferença. A primeira considera que o transtorno realmente atinge mais homens. Outra hipótese é que as mulheres são atingidas de forma diferente e, por causa disso, o diagnóstico não é concluído como autismo. Os sintomas menos reconhecíveis em meninas podem levar à identificação tardia ou incompleta da condição.

Ineficiência genética

Estudo publicado pela revista científica Neuron, liderado por pesquisadores do Instituto Nacional de Distúrbios Neurológicos e Derrame, nos EUA, aponta que a alteração de um único aminoácido no gene NLGN4, que foi associada a sintomas de autismo, pode causar essa diferença em alguns casos.

Cada célula do nosso organismo possui dois cromossomos sexuais. Enquanto as mulheres têm dois cromossomos X, os homens têm um cromossomo X e um Y.

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Neurocientistas analisaram os cromossomos XX e XY em células do cérebro em estudo sobre o autismo / Giovanni Cancemi-Shutterstock

Os neurocientistas envolvidos na pesquisa analisaram esses cromossomos em células do cérebro. Foram comparados dois genes NLGN4 (um no cromossomo X e um no Y). Até então, acreditava-se que os genes NLGN4-X e NLGN4-Y trabalhavam igualmente bem em suas funções de transmissão de impulsos nervosos entre neurônios.

Entretanto, descobriu-se, por meio desse estudo, que o gene NLGN4-Y tem menor poder de locomoção até a superfície das células cerebrais. E, quando há essa falha de circulação, ele se torna incapaz de estabelecer e manter sinapses, que são os pontos de comunicação entre os neurônios. De acordo com a pesquisa americana, esses problemas do NLGN4-Y estão ligados a um único aminoácido.

Outra conclusão do estudo é que, no gene NLGN4-X, a região em torno desse mesmo aminoácido é sensível a mutações. Nas mulheres, quando um dos genes NLGN4X sofre mutação, o outro geralmente pode compensar. No sexo masculino, se ocorre a mutação, essa compensação não acontece, porque o gene NLGN4-Y não tem a mesma capacidade. É esse desequilíbrio que pode resultar em sintomas relacionados ao transtorno do espectro autista, incluindo déficits intelectuais.

A ineficiência do NLGN4-Y em compensar mutações no NLGN4-X pode ajudar a explicar por que, nos homens, que possuem apenas um cromossomo X, há maior incidência de TEA associado ao NLGN4-X do que nas mulheres.

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Diagnóstico ‘maquiado’ em mulheres

Identificar o autismo em pessoas do sexo feminino pode ser prejudicado por influências de desenvolvimento psicológicas, sociais e culturais. Acredita-se que as mulheres conseguem, de forma inconsciente, desenvolver habilidades de camuflar, disfarçar e compensar as dificuldades decorrentes do transtorno.

Pesquisas recentes indicam que meninas com autismo costumam ter um desejo mais forte de socializar, diferentemente do que ocorre com meninos e homens com o transtorno.

Meninas com TEA têm mais facilidade em observar os amigos em desenvolvimento típico e imitar seus comportamentos / Evgenyrychko-Shutterstock

Com o maior contato social, elas têm mais facilidade em observar os amigos em desenvolvimento típico (pessoas sem TEA) e imitar seus comportamentos.

Assim, pessoas do sexo feminino com autismo apresentam comportamentos menos “estereotipados”, repetitivos e limitados do que meninos e homens com TEA. Isso prejudica o diagnóstico correto dessas pacientes. Muitas vezes, os sintomas percebidos nas meninas acabam sendo confundidos com outros transtornos. O mais comum é o Transtorno Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), forma predominantemente desatenta em que é frequente uma dificuldade de regulação das emoções e comportamentos.

As informações são da Autismo e Realidade, associação de pais e profissionais de saúde incorporada ao Instituto PENSI (Pesquisa e Ensino em Saúde Infantil), de São Paulo.

Fontes: Revista Planeta / Autismo e Realidade