Cientistas criaram um novo conceito para recriar o radiotelescópio de Arecibo, que foi desativado após vários acidentes em 2020, para quem sabe um dia reconstruir algo que vá além do modelo original, preenchendo um dos maiores vazios da ciência moderna.

O projeto foi apelidado de “Next Generation Arecibo Telescope” (“Nova Geração do Telescópio de Arecibo”, na tradução literal) e conta com a expertise de diversas entidades de pesquisa astronômica: “Nós tivemos que pensar grande e sermos ousados, porque você não inspira ou serve as gerações futuras se apenas pensar em fazer de novo o que já foi feito”, disse Noemí Pinilla-Alonso, cientista principal do Observatório Arecibo. “[O modelo antigo] foi resultado de alguém que pensou grande há 60 anos. Agora, nós temos que pensar assim para os próximos 60”, disse ela, que também é uma das dezenas de co-autores do novo design.

publicidade

Leia também

Imagem mostra o antigo radiotelescópio que desabou em 2020. Projeto para novo telescópio em Arecibo já está em fase conceitual, aguardando propostas de investimento
Imagem mostra dano à antena após o rompimento do primeiro cabo de suporte no radiotelescópio de Arecibo. Imagem: NSF/Divulgação

“[A desativação de] Arecibo deixou um enorme buraco”, disse Francisco Cordova, um dos diretores do observatório e que também assina o novo design. “Temos centenas de cientistas que estão lutando para encontrar outro telescópio capaz de lhes fornecer os dados de que precisam para continuar suas pesquisas e projetos”.

De acordo com Joanna Rankin, astrônoma da Universidade de Vermont e co-autora, o novo design começou a ser criado em torno de dois meses após o colapso final do telescópio, em dezembro de 2020. De lá para cá, em meio a várias chamadas em vídeo pelo Zoom, o resultado foi um paper de aproximadamente 70 páginas, sugerindo um novo conceito em substituição ao anterior.

Basicamente, o desejo dos autores é o de que o novo telescópio de Arecibo seja poderoso o suficiente para reunir, em um só lugar, pelo menos três grandes campos de estudos do espaço: pesquisa ionosférica (estudo da região da atmosfera com grande incidência da radiação do Sol), radioastronomia (quando cientistas usam sinais de rádio para identificar fenômenos no espaço) e radar planetário.

“Essas três partes bem específicas evoluíram de forma simbiótica em Arecibo, algo completamente único daquela estrutura”, disse Rankin. “Nós buscamos manter o projeto como uma estrutura multidisciplinar”, disse Pinilla-Alonso. “Não queremos priorizar uma sobre a outra, então precisamos pensar em algo que possa servir às três comunidades”.

Além disso, a ideia é construir o projeto no mesmo local do antigo: regulamentações governamentais de Porto Rico fazem de Arecibo — a região, não o telescópio — um ponto protegido de interferência e congestionamento de rádio. Esse “silêncio exclusivo” não é algo que cientistas possam simplesmente empacotar e transportar para outro local. “Desperdiçar isso seria, como diria a minha mãe, uma decepção total”, disse Rankin. “Seria bastante horrível não usarmos esse local de uma forma criativa, considerando que nós já o temos”.

Evidentemente, o projeto, agora, nada mais é do que um conceito. E como todo conceito, ele está esperando a parte mais chata da tomada de decisão: quem vai pagar por isso? Em 31 de dezembro de 2020, o governo de Porto Rico assinou ordem executiva, assegurando US$ 8 milhões (R$ 41,43 milhões) para a reconstrução do telescópio. Mais ninguém se manifestou depois disso, porém, e o valor portorriquenho é bem baixo, mesmo considerando a estrutura que já existia — imagine construir algo novo e, segundo o paper, mais evoluído.

Em junho deste ano, a Fundação Nacional de Ciência dos EUA (“NSF”, na sigla em inglês) apresentou um workshop virtual para discutir opções do que fazer com a escritura do sítio — a NSF é a dona do terreno, tecnicamente falando. Apesar de porta-vozes da entidade assegurarem que Arecibo continuará a existir, a fundação sequer mencionou a possibilidade de reconstruir o modelo antigo ou criar algo novo. O workshop não mencionou a alocação de fundos para qualquer projeto e, ao seu final, nada acabou decidido.

“A NSF tem o compromisso de participar no desenvolvimento futuro [do projeto de Arecibo], mas não está restringindo ideias apenas à construção de um novo telescópio”, diz um comunicado da fundação. “Essa certamente é uma possibilidade a longo prazo, mas há muitas outras, bem como projetos de curto prazo que poderiam servir de ponte enquanto um conceito mais abrangente é desenhado”.

Por enquanto, o novo telescópio de Arecibo é um projeto encaminhado apenas no papel. Certamente tem o apoio da comunidade científica, mas discussões sobre o que fazer com ele daqui em diante é que vão ditar o rumo de seu renascimento – ou a falta dele. E isso ainda vai demorar bastante.

Já assistiu aos nossos novos vídeos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!