No final de agosto deste ano, hackers e ativistas da Bielorrússia (ou Belarus, no idioma local) se reuniram para um ataque multi-coordenado contra o atual governo — e assim, derrubar o presidente Alexander Lukashenko, em posse desde 1994.

Afinal, será que eles tem alguma chance? Outros teriam? Vejamos.

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O caso da Bielorrússia

Intitulado Belarus Cyber Partisans, o grupo hacktivista vazou inúmeras informações sensíveis de bases de dados governamentais, alegando terem se infiltrado em “praticamente todas as camadas do governo”. Os documentos divulgados revelam crimes de estado, ordens de violência ilegal contra manifestações e até mesmo falseamento de registros de casos da Covid-19.

Em entrevista ao MIT Tech Review, hacktivistas do Belarus Cyber Partisans afirmam estar operando com um grupo dissidente das forças de segurança de Lukashenko, o BYPOL — do qual fazem parte forças policiais, agentes do estado, de inteligência e até integrantes da KGB.

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“O que nós queremos é o fim da violência e repressão do regime terrorista em Belarus e levar o país de volta aos princípios democráticos e legais”, justifica um representante dos ativistas.

presidente lukashenko em discurso
Presidente é conhecido por crescimento econômico e também por autoritarismo. (Imagem: Asatur Yesayants)

As investidas dos hackers para derrubar o governo se dá na escalada de protestos contra o presidente da Bielorrússia. Durante às eleições presidenciais de 2020 no país, Lukashenko oficialmente venceu em primeiro turno, com 80% dos votos, contra 10% do líder de oposição, Svetlana Tikhanovskaia.

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Governo autoritário

No entanto, fortes indícios de fraude eleitoral, somados a uma insatisfação com o regime atual levam até hoje a uma onda de protestos, coibidos violentamente pelo governo. Gustavo Oliveira, doutorando em Relações Internacionais da UNESP, explica de onde vem o desagrado com o regime atual:

“Ao final da União Soviética, a Bielorrússia viveu uma democratização e formação de mercado mais frágil do que o resto do Leste Europeu. E apesar de o governo Lukashenko resultar em crescimento econômico e igualdade, também está marcado por forte autoritarismo.”

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O especialista aponta que o aparato de repressão do governo bielorrusso conseguiu uma relativa estabilização da situação em seu favor, mas ainda vive um mal-estar político.

“A crise em curso, apesar de já ter tido momentos de intensidade muito maior, representa o maior desafio a Lukashenko desde que ele chegou ao poder”, pontua.

É possível, mas…

manifestante segurando cartaz com a boca de Lukashenko derramando sangue
Protestos se intensificam após aumento da violência contra manifestantes no país. (Imagem: Review News/Shutterstock)

Grupos como o Cyber Partisans ou o Anonymous estão se tornando cada vez mais notados (e influentes) nas ações políticas. Ricardo Motta, especialista em direito digital e sócio da Viseu Advogados, acredita que até é possível que hackers ajudem a derrubar governos — mas de maneira indireta. Especificamente, em conjunto com ação popular: “Toda esta força estará baseada única e exclusivamente na quantidade e qualidade das informações obtidas pelos grupos, sobretudo na forma como poderão ser utilizadas para pressionar o governo que se busca derrubar”.

Para o advogado e pesquisador sênior do ITS Rio, Christian Perrone, ações hacktivistas podem ter resultado do ponto de vista cibernético, já que é o mesmo espaço de discussão política e formação de opinião ocupado por muitos. No entanto, do ponto de vista histórico, isto nunca ocorreu.

“Você pode dificultar a vida de um determinado regime e aí, de alguma forma então, você acaba impactando e causando modificações políticas — que podem levar esse regime, inclusive, de alguma forma, talvez, à queda. Mas não é o mais provável.”

Por fim, Gustavo Oliveira reforça que só o esforço dos ciberativistas não basta, lembrando que o país possui forte apoio da Rússia e que a oposição, no momento, está descentralizada.

“No caso de Belarus, ações como as do grupo Cyber Partisans podem, sim, contribuir para o desgaste político de Lukashenko e galvanizar mobilizações populares contra ele. Mas esse fator isolado dificilmente seria suficiente, pois há de se considerar as outras forças políticas em jogo”, afirma.

Imagem: husjur02/Shutterstock

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