O velhinho ainda tem muita força: segundo um comunicado divulgado hoje (30) pela NASA, o telescópio espacial Hubble conseguiu capturar a imagem da estrela mais distante já vista, efetivamente quebrando um recorde que pertencia… ao próprio Hubble.

No comunicado, a NASA explica que a estrela observada vem dos primeiros quatro bilhões de anos do universo após a explosão do Big Bang, efetivamente classificando-a como um remanescente do início do universo, o que adiciona um peso ainda maior à ocasião.

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O espectro luminoso dessa estrela é referido por cientistas como “redshift 6.2”. O termo “redshift” é aplicado porque, segundo o princípio de expansão contínua do universo, a luz de vários objetos é “desviada” e em direção a frequências de onda mais longas e avermelhadas conforme viajam em nossa direção. Quanto mais o desvio, mais tempo a luz viajou.

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A estrela em questão é tão distante que a sua luz levou 12,9 bilhões de anos para chegar à nossa posição – na prática, ela partiu quando o universo tinha apenas 7% de sua idade atual (13,8 bilhões anos, aproximadamente).

“Nós mesmos quase não acreditamos a princípio. [A estrela] está muito mais distante que a ‘antiga’ estrela mais distante”, disse o astrônomo Brian Welch, da Universidade Johns Hopkins, que assina a autoria primária do paper descrevendo a descoberta e publicado pela revista Nature.

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“Normalmente, nestas distâncias, galáxias inteiras têm a aparência de pequenas manchas, com a luz de milhões de estrelas se misturando”, disse Welch. “A galáxia onde essa estrela viveu foi ampliada e distorcida pelo efeito de lente gravitacional, assumindo uma longa forma crescente que decidimos chamar de ‘Arco do Nascer do Sol’”.

A nova estrela recebeu o nome de “Earendel”, que significa “Estrela da Manhã”, no inglês antigo. Segundo Welch, ela deve abrir caminho para uma nova onda de observação espacial na busca por objetos mais próximos do nascimento do universo.

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“A Earendel existiu há tanto tempo que pode até ser que ela não tivesse as mesmas matérias primas que as estrelas ao nosso redor hoje”, explicou Welch. “O estudo de Earendel será uma janela para uma nova era do universo com a qual não temos nenhuma familiaridade, mas que levou a tudo o que já conhecemos. É como se estivéssemos lendo um livro muito bom, mas começado a leitura pelo segundo capítulo, e agora temos a chance de ver como tudo começou”.

Em termos numéricos, Earendel tem, segundo estimativas, 50 vezes mais massa que o Sol, e é milhões de vezes mais brilhante. Na prática, ela rivaliza com as estrelas mais massivas que já descobrimos, sendo ela muito, muito mais velha. Entretanto, mesmo algo desse porte não seria normalmente visto por nós sem a ampliação natural de uma lente gravitacional.

Earendel, a estrela mais distante observada pelo telescópio espacial Hubble, é vista aqui em detalhes: sua descoberta só foi possível graças ao efeito de lente gravitacional
Earendel, a estrela mais distante observada pelo telescópio espacial Hubble, é vista aqui em detalhes: sua descoberta só foi possível graças ao efeito de lente gravitacional (Imagem: NASA/Divulgação)

Já falamos disso aqui, mas a ocasião pede pela explicação: “lente gravitacional” é, de forma resumida, um distúrbio no tecido do tempo e do espaço, cujo efeito imediato é a ampliar um objeto como se ele fosse visto através de uma lupa. Imagine que você joga uma pedra em uma piscina cheia d’água em um dia de muito Sol: as ondas causadas pelo impacto da pedra concentram a luz do Sol para maximizar o brilho vindo do fundo da piscina, facilitando você enxergá-lo com mais detalhe mesmo estando fora dela.

No caso em mãos, Earendel só pôde ser observada graças a um agrupamento de galáxias (WHL0137-08) posicionado entre a estrela e nós. A distorção causada por ele gerou esse efeito de lupa, ampliando grandemente a luminosidade do objeto por trás dele – a estrela mais distante vista pelo Hubble. Esse brilho é aumentado “pelo menos” mil vezes, se não mais, de acordo com Welch.

O que falta determinar é se Earendel tem alguma estrela companheira: nós ainda não conseguimos enxergar a esse ponto, mas é comum que uma estrela massiva como esta consista de um sistema binário.

O interessante é que, embora a estrela mais distante que já vimos tenha sido observada pelo Hubble, a sua presença dá ao novo telescópio espacial James Webb mais uma missão. Graças ao alinhamento com WHL0137-08, é provável que Earendel continue com sua luminosidade ampliada por mais alguns anos, permitindo que o sucessor espiritual do Hubble, com sua tecnologia mais avançada, consiga observá-la e coletar dados ainda mais relevantes.

“Com o Webb, esperamos confirmar que Earendel seja de fato uma estrela, além de podermos medir seu brilho e temperatura. Esses detalhes vão reduzir o leque de possibilidades sobre o tipo de estrela que ela foi e seu estágio no ciclo de vida estelar. Também esperamos descobrir que a galáxia que apelidamos ‘Arco do Nascer do Sol’ tenha um déficit de elementos químicos pesados que se formaram em gerações posteriores de estrelas. Isso sugere que Earendel tenha sido uma estrela rara, massiva e com poucos metais”, disse Dan Coe, co-autor do estudo e astrônomo do Instituto Científico de Telescópios Espaciais (STScI) em Baltimore.

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