Se você acha que só política, religião e futebol são capazes de gerar as grandes tretas da humanidade, precisa conhecer a história de Eris, que seria o décimo planeta do Sistema Solar, mas acabou se tornando o pivô da maior discórdia da história recente da Astronomia, que resultou na morte de Plutão e do próprio Éris.

Os fatos que culminaram nessa “tragédia planetária” se iniciaram em 2003 no Observatório de Monte Palomar na Califórnia. Um grupo de astrônomos liderados por Mike Brown, varria o céu à procura de grandes corpos no Sistema Solar exterior, os chamados “transnetunianos”.

Eles já haviam descoberto Quaoar, Orco e Sedna, mas em outubro daquele ano, um pequeno ponto luminoso foi detectado se movendo tão lentamente que passou despercebido pelo sistema automático de busca.

Em janeiro de 2005, os astrônomos resolveram revisar as imagens registradas nos anos anteriores procurando por objetos mais lentos. Foi então que encontraram, naquelas imagens de outubro de 2003, o astro se deslocando lentamente na direção da Constelação da Baleia. 

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[ Animação mostrando o movimento de Eris nas imagens em que o objeto foi descoberto – Créditos: Mike Brown ]

De cara, a descoberta já se mostrava muito importante. Aquele objeto estava mais afastado e parecia ser maior e mais massivo que Plutão. Um mundo distante que seria o décimo planeta do Sistema Solar. Mas Brown e sua equipe resolveram não anunciar sua descoberta imediatamente. Preferiram fazer mais observações para determinação mais precisa de sua órbita e massa. Só que uma outra treta acabou precipitando este anúncio.

Em 27 de julho de 2005, o espanhol José Luis Ortiz, reportou a descoberta de Haumea, um outro objeto transnetuniano que ele anunciou como décimo planeta do Sistema Solar. Seria só alegria não fosse o fato daquele objeto ter sido descoberto um ano antes por Mike Brown. Além disso, havia fortes indícios de que Ortiz só teria procurado pelo objeto em suas imagens depois de acessar os dados da pesquisa de Brown. 

E essa treta aí foi longe. Por anos, Ortiz e Brown brigaram pela “paternidade” de Haumea. Uma briga homérica, mas que foi apenas um “esquenta” para a confusão que se seguiu ao anúncio da descoberta de Haumea.

[ Representação artística de Haumea e suas luas. A descoberta da descoberta desse corpo gelado gerou uma disputa entre Mike Brow e José Luis Ortiz – Créditos: NASA ]

Com receio de que Ortiz tivesse acessado também os dados de suas outras pesquisas, Mike Brown resolveu se antecipar e anunciar, apenas dois dias depois, em 29 de julho, outras duas descobertas: Makemake e Eris. As descobertas não só ofuscaram o anúncio de Ortiz como iniciaram uma discussão que dividiu a comunidade astronômica. 

Isso principalmente porque, Eris parecia maior que Plutão. Mas assim como ele, sua órbita era bastante alongada e inclinada, diferente dos outros planetas do Sistema Solar, e mais parecida com a órbita de um asteroide. Pelas definições da época, Eris deveria ser considerado um planeta, só que muitos astrônomos defendiam que a definição de planeta deveria ser reformulada, o que rebaixaria tanto Eris quanto Plutão. 

Sem falar de Haumea, que se fosse considerado um planeta, como gostaria Ortiz, implicaria que Makemake, que era maior, também seria um. Isso faria de Ortiz um contestável descobridor de um planeta, e de Mike Brown, o primeiro ser humano da história a descobrir dois planetas.

Essa indefinição prolongou-se por vários meses, gerando uma enorme discórdia entre os astrónomos que não chegavam a uma conclusão sobre a definição de um planeta. A União Astronômica Internacional tentou ajustar essa definição em 2005, mantendo a classificação de Plutão e tornando Eris o décimo planeta do Sistema Solar. Apesar daquela proposta agradar a maioria dos astrônomos, as divergências eram tão grandes que a decisão foi adiada.

Curiosamente, Mike Brown, o descobridor de Eris, passou a defender que ele e Plutão fossem reclassificados como “planetas anões”. Uma nova classificação para esses objetos, que são grandes o suficiente para assumirem um formato esférico, mas que não conseguiram limpar os arredores de sua órbita. 

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Apesar da controvérsia ainda gerar discussões acaloradas por mais um ano, a proposta de reclassificação conseguiu arrancar um consenso no Comitê da União Astronômica Internacional, que aprovou em 2006 a nova definição de planeta, rebaixando Plutão para a categoria de “planeta anão”, mesma categoria atribuída ao objeto descoberto por Brown, que só então, recebeu o nome de Eris, a deusa grega da discórdia.

Só que este consenso só ocorreu na União Astronômica Internacional. Porque até hoje ainda tem muita gente chorando a “morte” de Plutão. Gente que não se conforma com o deboche de Mike Brown, que se auto-denomina “O Assassino de Plutão” e ainda escreveu um livro intitulado “Como eu matei Plutão e por que isso aconteceu”, onde narra a maior discórdia da história recente da Astronomia.

À esquerda: perfil pessoal de Mike Brown no Twitter (@plutokiller) em que ele se auto-denomina astrônomo, caçador de planetas e assassino de plutão. Reprodução Twitter. À direita: capa do livro “Como eu matei Plutão e por que isso aconteceu”. Reprodução openlibrary.org

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