Quem foi que disse que a ciência não erra? Na verdade, os erros são parte importante dela, desde que possamos aprender com eles. Um bom exemplo disso ocorreu quando um dos mais maravilhosos erros possibilitou a descoberta de Plutão, 92 anos atrás.

Essa história começou assim que Johann Galle observou Netuno pela primeira vez, na mesma região em que Urbain Le Verrier havia previsto um corpo celeste que interferia gravitacionalmente na órbita de Urano seria encontrado. Nos anos que se seguiram, notou-se que as observações de Netuno não se encaixavam perfeitamente com sua órbita calculada. Supôs-se então, que poderia haver outro corpo, ainda mais afastado, perturbando a órbita de Netuno. 

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A possibilidade da existência do chamado “Planeta X” foi especulada por vários anos, até que o astrônomo Percival Lowell decidiu que iria encontrar o nono planeta do Sistema Solar.

Percival Lowell (1855 – 1916). Imagem: James E. Purdy

Lowell foi um milionário americano, nascido em uma distinta família de Boston. Formou-se em Matemática, mas resolveu investir sua vida e parte da sua fortuna na astronomia. No final do Século XIX montou o Observatório Lowell, onde se dedicou às observações de Marte e ao que seria o grande desafio da sua vida. 

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Em 1906, Lowell deu início a um grande projeto: descobrir o Planeta X. A ideia seria utilizar as leis da mecânica newtoniana para calcular a posição do suposto planeta a partir da sua interferência gravitacional em Netuno e Urano. Só que para fazer esses cálculos, Lowell precisava de um computador.

Ou melhor, uma computadora, nome dado aos profissionais, geralmente mulheres, contratados para realizar e validar cálculos matemáticos repetitivos ou complexos. Uma tarefa muito grande podia ser subdividida entre várias “computadoras”, gerando um resultado em menos tempo.

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Elizabeth Langdon Williams foi uma daquelas mulheres geniais, mas que tiveram pouco reconhecimento em vida. Ela foi uma das primeiras mulheres a concluir a Licenciatura em Física no MIT. Sua dedicação e sua habilidade com a matemática certamente foram decisivas para que Percival Lowell a contratasse para trabalhar como computadora do observatório. 

Elizabeth Williams, a “computadora” do Observatório Lowell. Imagem: wikimedia.org

Lá, Elizabeth Williams realizou os cálculos matemáticos que indicaram a Lowell onde ele deveria procurar pelo planeta desconhecido. A busca era feita utilizando a mais moderna tecnologia da época, através da comparação de chapas fotográficas de uma mesma região do céu feitas em diferentes dias. 

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Percival Lowell observando Vênus a partir do seu observatório. Imagem: Observatório Lowell

Lowell dedicou os últimos 8 anos de sua vida na busca pelo Planeta X, mas, infelizmente morreu, em 1916, sem alcançar esse objetivo. Com a morte do idealizador e principal financiador do Observatório Lowell, a busca pelo nono planeta foi interrompida e só foi retomada em 1929, com a chegada no observatório de um jovem e promissor astrônomo: Clyde Tombaugh.

Tombaugh tinha apenas 23 anos quando entrou para o observatório Lowell. O jovem construtor de telescópios foi encarregado de dar sequência ao mais importante projeto de Lowell: a descoberta do Planeta X. 

Clyde Tombaugh  – Fonte: nmsu.edu

Seguindo os cálculos feitos por Elizabeth Williams, Tombaugh passou cerca de 1 ano dedicado a essa tarefa, até que no dia 18 de fevereiro de 1930, encontrou algo se movendo em duas fotografias tiradas alguns dias antes. Era ele, o tão procurado nono planeta do Sistema Solar.

Em poucos dias, a notícia da descoberta de Tombaugh já havia corrido o mundo. Chegou inclusive aos ouvidos da jovem Venetia Burney em Oxford, na Inglaterra. Com apenas 11 anos na época, ela, que era fascinada por Astronomia e Mitologia, sugeriu, em conversa com seu avô, que aquele frio e distante planeta deveria receber o nome do invisível deus romano do submundo: Plutão.

Plutão registrado em duas imagens distintas nos dias 23 e 29 de janeiro de 1930. A partir dessas imagens que Clyde Tombaugh descobriu o nono planeta do Sistema Solar. Imagem: Observatório Lowell

Seu avô levou a sugestão até um amigo astrônomo que telegrafou a ideia para o Observatório Lowell. Tombaugh, que já havia recebido mais de mil sugestões de nome, gostou bastante da ideia de Venetia. Além de sua adequação mitológica, o nome Plutão também se iniciava com as letras “P” e “L”, as iniciais do principal idealizador daquela busca e fundador do Observatório, Percival Lowell.

A essa altura, você deve estar se perguntando: Onde está o erro nesta épica e fantástica história da descoberta de Plutão? O erro está lá no início, na motivação de Lowell a iniciar essa busca. Ocorre que Plutão não era o responsável pelas perturbações gravitacionais de Urano e Netuno, como imaginava Percival Lowell. 

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Plutão era pequeno demais para isso, e, na verdade, nem havia essa perturbação. As órbitas observadas de Urano e Netuno não batiam porque a massa de Netuno foi calculada errada. Algo que só foi percebido em 1992, com os dados enviados pela Voyager-2

Atualmente, Plutão nem é mais considerado um planeta, mas ele estava coincidentemente na hora certa e no local certo para ser descoberto, em um desfecho épico para essa história fantástica, que contou com a obstinação de Percival Lowell, a precisão de Elizabeth Williams, a excelência de Clyde Tombaugh e um dos mais maravilhosos erros da história da astronomia. 

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