Como medimos as distâncias do universo? Conheça Henrietta Swan Leavitt

Henrietta Swan Leavitt encontrou as velas padrão para medir as distâncias no Universo
Por Marcelo Zurita, editado por Lucas Soares 01/11/2022 07h01
universo
Imagem: Marcelo Zurita
Compartilhe esta matéria
Ícone Whatsapp Ícone Whatsapp Ícone X (Tweeter) Ícone Facebook Ícone Linkedin Ícone Telegram Ícone Email

Nós já falamos nasta coluna como os astrônomos mediram as distâncias até a Lua, o Sol e até de algumas estrelas próximas. Agora, vamos entender como medimos distâncias bem maiores, as distâncias intergalácticas. E não há como falarmos das grandes distâncias do Universo sem falar no brilhante trabalho de Henrietta Swan Leavitt. 

Henrietta Leavitt nasceu em Lancaster, nos Estados Unidos em 1868. No seu último ano de faculdade, ela descobriu a astronomia e se apaixonou. A busca pelo entendimento do Cosmos guiaria toda a sua vida a partir dali. 

[ Henrietta Swan Leavitt – Fonte: wikimedia.org ]

Em 1893 ela começou a trabalhar no Observatório de Harvard como voluntária, mas logo foi efetivada na equipe de Edward Pickering. Na época, as mulheres não podiam operar os telescópios, mas Pickering percebeu que poderia economizar muito contratando mulheres como “calculadoras” (às quais pagavam-se bem menos que os homens), para analisar e processar as imagens astronômicas captadas pelos astrônomos. 

Henrietta havia recebido um trabalho um tanto chato: medir e catalogar o brilho de estrelas da coleção de chapas fotográficas do observatório. Mas o que Pickering não imaginava é que aquele trabalho de Henrietta mudaria para sempre a história da Astronomia. 

Quando começou a estudar estrelas variáveis, Henrietta descobriu e catalogou 1777 delas apenas nas Nuvens de Magalhães. Só que ela percebeu que algumas dessas estrelas, as chamadas variáveis cefeidas, apresentavam uma característica interessante: a sua luminosidade era proporcional ao seu período de variabilidade, e que essa relação era bastante precisa. 

[ Gráfico de um artigo preparado por Leavitt em 1912. No eixo horizontal, o logaritmo do período da variável cefeida e no eixo vertical, sua magnitude (brilho) – Fonte: wikimedia.org ]

É que as estrelas variáveis cefeidas realmente pulsam em um período de tempo bastante constante. E o que Henrietta descobriu é que esse período dependia da sua luminosidade. Mais do que isso, ela percebeu que essa relação poderia ser utilizada para medir distâncias no Universo. Mas como isso poderia ser possível?

Quando acendemos uma vela, uma vela padrão como aquelas que compramos no supermercado, nós já sabemos que ela vai sempre brilhar numa intensidade muito parecida. Também sabemos, que a luz se propaga em todas as direções e em linha reta e isso nos permite dizer que a intensidade luminosa percebida por um observador é inversamente proporcional ao quadrado da distância. 

Isso significa que se afastarmos a vela para um local duas vezes mais distante, a luminosidade parecerá quatro vezes menor. Isso também significa que, se conhecermos quanta luz emite essa vela, podemos calcular sua distância medindo a luminosidade dela que chega até nós.

Nós não podíamos fazer isso para medir a distância das estrelas porque não conhecíamos a quantidade de luz que elas emitiam. Mas Henrietta encontrou uma forma de calcularmos isso. Medindo o período de variabilidade de uma estrela cefeida, poderíamos calcular quanta luz elas emitiam e, sabendo disso, também poderíamos calcular sua distância medindo a luminosidade dela que chega até nós.

Henrietta Swan Leavitt encontrou as velas padrão para medir as distâncias no Universo

[ Variável Cefeida RS Puppis – Créditos: Hubble / NASA ]

Em 1912, quando Henrietta publicou seu brilhante trabalho nos Anais do Observatório Astronômico de Harvard, ainda não havia uma estrela cefeida com distância conhecida para servir de referência para os cálculos de Henrietta. Mas isso não tardou a ocorrer. 

No ano seguinte, em 1913, o astrônomo dinamarquês Ejnar Hertzsprung determinou, por paralaxe, a distância de várias cefeidas próximas e essas medidas foram usadas para calibrar o método proposto por Henrietta. Hertzsprung ainda usou o método para calcular, pela primeira vez, a distância da Pequena Nuvem de Magalhães e perceber que ela estava muito mais distante do que se imaginava.

Para se ter ideia da importância do trabalho de Henrietta Leavitt, foi graças a ele que Edwin Hubble pôde mostrar que algumas das “nebulosas” que observamos no céu eram na verdade outras galáxias, o que encerrou de vez o debate sobre a natureza desses objetos e ampliando significativamente as dimensões do nosso Universo. Essas distâncias das galáxias foram fundamentais para que Hubble percebesse que o Universo está em expansão.

Leia mais:

Lamentavelmente, Henrietta morreu antes de testemunhar a revolução que suas descobertas causaram no nosso conhecimento do Cosmos. Em 1921, ela faleceu prematuramente de câncer aos 53 anos de idade, apenas dois anos antes de Hubble publicar seu trabalho sobre as distâncias das nebulosas espirais, que expandiu nossa percepção do Universo. 

O próprio Hubble dizia que Henrietta Leavitt merecia ganhar o prêmio Nobel por seu trabalho sobre as estrelas variáveis. E de fato, ela chegou a ser indicada para o Nobel em 1924 por um membro da Academia Sueca de Ciências que não sabia que ela havia morrido três anos antes. 

Infelizmente o prêmio Nobel não é entregue postumamente. Mas não faltam homenagens e reconhecimento à Henrietta Swan Leavitt, a mulher que ensinou à humanidade como se mede o Universo.

Já assistiu aos novos vídeos no YouTube do Olhar Digital? Inscreva-se no canal!

Marcelo Zurita
Colunista

Pres. Associação Paraibana de Astronomia; membro da Sociedade Astronômica Brasileira; diretor técnico da Rede Brasileira de Observação de Meteoros – e coordenador regional do Asteroid Day Brasil

Lucas Soares
Editor(a)

Lucas Soares é jornalista formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e atualmente é editor de ciência e espaço do Olhar Digital.