Conforme noticiado pelo Olhar Digital, um estudo feito por cientistas chineses a partir de dados de terremotos descobriu que o núcleo interno da Terra parou de girar mais rápido do que o planeta – e isso pode trazer algumas consequências, embora não haja motivo para pânico.

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Representação artística das camadas da Terra: crosta, manto, núcleo externo e núcleo interno – que alterou seu próprio ritmo de rotação, o que vai trazer consequências para o funcionamento do planeta. Créditos: Rost9/Shutterstock

De acordo com os sismólogos Yi Yang e Xiaodong Song, da Universidade de Pequim, autores da pesquisa, que foi publicada nesta segunda-feira (23) na revista Nature Geoscience, o resultado foi surpreendente. 

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Segundo os pesquisadores, que estudam o movimento do núcleo da Terra desde 1995, o núcleo interno costumava girar mais rápido do que o planeta como um todo e, em dado momento das últimas décadas – possivelmente em 2009 -, teria passado a acompanhar o movimento natural do globo. 

Na noite desta terça-feira (24), em entrevista a Marisa Silva, apresentadora do programa Olhar Digital News, Marcelo Zurita, presidente da Associação Paraibana de Astronomia (APA), membro da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB), diretor técnico da Rede Brasileira de Observação de Meteoros (BRAMON) e colunista do Olhar Digital, explicou como isso foi descoberto, o que pode estar acontecendo e quais as possíveis consequências.

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Se você não acompanhou, assista abaixo:

Desaceleração do núcleo interno da Terra pode explicar os dias mais curtos?

Você já teve a sensação de que os dias têm sido cada vez mais curtos? Obviamente, essa impressão tem a ver com o nosso ritmo de vida, os afazeres, as responsabilidades e compromissos da vida moderna. No entanto, parece que tem alguma explicação geofísica para isso: sim, o núcleo interno da Terra estar desacelerando pode diminuir, ainda que em milésimos de segundos, a duração dos dias.

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Segundo Zurita, embora seja um comportamento até então desconhecido, a desaceleração da rotação do núcleo interno da Terra, aparentemente, é algo normal. “Acredita-se que isso pode ter um efeito tanto no campo magnético da Terra quanto na duração dos dias e noites, inclusive que isso pode explicar alguns fenômenos que a gente vem observando nos últimos anos e que não se sabia explicar, como a diminuição da duração dos dias”, disse ele, complementando que “faz algum tempo que os dias estão mais rápidos, alguns milésimos de segundos mais curtos”.

Ele explicou que o núcleo interno da Terra não só desacelerou seu ritmo de rotação como, agora, parece estar girando ao contrário em relação à rotação do planeta em torno de seu próprio eixo.

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“O núcleo interno costumava girar um pouco mais rápido do que a Terra. Então, ele desacelerou e, provavelmente em um momento próximo de 2009, esse núcleo interno passou a girar na mesma velocidade do planeta. Os cientistas acreditam que, agora, ele está girando mais lento do que a Terra, então, não apenas ele parou como passou a girar no sentido contrário”. 

É preciso deixar claro que, diferentemente do que foi publicado em alguns veículos, essa “inversão de sentido da rotação” não é real. “É apenas a velocidade dessa rotação que mudou”, disse o astrônomo norte-americano Phil Plait, de acordo com a revista Forbes.

“É como ultrapassar um carro na estrada; para você parece que está se movendo para trás, mas para alguém no chão está apenas se movendo mais devagar do que você. A perspectiva é importante aqui. Quando os cientistas falam sobre a rotação do núcleo interno ‘voltando’ ou ‘retrocedendo’, eles estão se referindo à sua oscilação entre um estado de super rotação (girando mais rápido que as camadas externas) e sub-rotação (girando mais devagar), mas está sempre indo a mesma direção”, garante Plait.

Embora isso seja uma “novidade” para os cientistas, o próprio estudo diz que não é a primeira nem será a última vez que acontece. E Zurita explica: “O que estamos vendo, muito provavelmente, é um comportamento que já existia no núcleo interno. Eles identificaram que, lá no início dos anos de 1970, isso ocorreu também”. 

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O que vai acontecer daqui para a frente?

Em entrevista ao jornal espanhol El País, um dos autores do estudo revelou outras possíveis consequências, além do efeito sobre a duração dos dias. “A alteração na rotação também pode modificar o campo gravitacional como um todo e causar deformações na superfície, o que alteraria também o nível do mar e, por sua vez, a temperatura global do planeta”.

Zurita, no entanto, foi bem menos alarmante em relação a isso em suas colocações. “Se o núcleo interno da Terra continuar perdendo velocidade e permanecer ‘girando ao contrário’, a princípio, não tem efeitos significativos para a gente”.

O ritmo de rotação do núcleo interno da Terra pode acelerar durante um tempo e perder velocidade em seguida, em um ciclo que deve ter entre 60 e 70 anos de duração, segundo o astrônomo Marcelo Zurita. Imagem: Vadim Sadovski – Shutterstock

Segundo ele, alguns associam isso à perda do campo magnético da Terra. “Mas, o campo magnético da Terra não existe por causa da rotação do núcleo interno, e sim, por conta das correntes convectivas que existem no núcleo externo. Alguns estudos indicam que essas correntes ajudavam a acelerar a rotação do núcleo interno. No entanto, existe também uma pressão da gravidade gerada pelo manto e pelo núcleo externo que acaba freando isso”. 

Nosso colunista exemplificou o que está acontecendo usando como referência uma gangorra. “Ele gira rápido para um lado, dá uma tensão magnética, ele desacelera, gira ao contrário um pouquinho, e depois vai gerar uma tensão negativa e ele vai voltar a acelerar”. 

Segundo Zurita, o que alguns cientistas esperam (e isso não é uma unanimidade no meio científico) é que isso vai acabar se tornando algo periódico. “Essa rotação vai ser invertida aproximadamente a cada 60 ou 70 anos. Isso significa que não tende a acontecer de frear ainda mais e ficar girando para sempre ao contrário”. 

Cabe ressaltar que, como ele disse ao finalizar a entrevista, todos esses estudos são muito recentes, “mas mostram que a gente continua aprendendo sobre o nosso planeta”.

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