Você já conseguiu ver o Cometa C/2022 E3 (ZTF), o chamado “Cometa Verde”? Se teve o prazer de observar por telescópio ou binóculo o astro celeste mais badalado deste início de ano, provavelmente não o viu verde, mas apenas uma fumacinha esbranquiçada.

Isso se deve ao fato que o brilho deste cometa é muito fraco e a visão humana é bem mais sensível à intensidade luminosa do que à variação de cores. Dessa forma, suas cores só serão percebidas em grandes telescópios ou em fotografias de exposições prolongadas. 

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Cometa C/2022 E3 (ZTF) – Crédito: Alessandro Bianconi (Edu INAF)

Mas o que eu queria chamar a atenção é que “Cometa Verde” não é um apelido muito apropriado para ele. Não por conta da sensibilidade da nossa visão, mas porque chamar um cometa de “verde”, faz tanto sentido quanto chamar um papagaio de “verde”, uma zebra de “listrada” ou urso polar de “branco”.

É claro que existem exceções, mas a grande maioria dos cometas, quando se aproximam do Sol, exibem essa coloração esverdeada. E se esta frase deu a entender que eles mudam de cor é porque, ao contrário dos papagaios, das zebras e dos ursos polares, os cometas mudam mesmo de cor em cada fase da sua órbita.

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Cometas são corpos gelados provenientes do Cinturão de Kuiper (uma região além da órbita de Netuno repleta de pequenos objetos) ou da Nuvem de Oort (ainda mais distante) e que sofreram alguma perturbação gravitacional que os lançaram para o interior do Sistema Solar.

Cinturão de Kuiper e a Nuvem de Oort, de onde os cometas do Sistema Solar se originam – Crédito: NASA

Eles também possuem uma grande quantidade de gelo de água e gases congelados em sua composição, além de uma órbita alongada, que os leva de tempos em tempos, à grandes aproximações do Sol a cada volta pelo Sistema Solar.

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Quando os cometas se aproximam do Sol, eles acabam encontrando temperaturas, obviamente mais elevadas. O calor faz com que parte do seu gelo e dos gases congelados passe para o estado gasoso, formando uma espécie de atmosfera em torno do núcleo. Essa atmosfera é o que chamamos de coma. Além disso, a interação com os ventos solares acaba arrastando gases e poeira do cometa formando uma cauda, que pode se estender por milhões de quilômetros no espaço.

Nesta fase, quando dizemos que o cometa está ativo, sua cor depende basicamente da composição dos gases que formam sua coma. Isso porque a radiação solar ioniza esses gases que passam a emitir luz, geralmente com uma coloração entre o verde e o ciano. Já a cauda, na verdade, normalmente são duas: uma formada pelas partículas de poeira que refletem a luz do Sol e por isso tem uma coloração amarelada, e outra formada pelos gases arrastados pelo vento solar, que quando ionizados, normalmente emitem uma luminosidade azulada. 

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Estrutura de um cometa típico (C/2020 F3 (NEOWISE)) – Crédito: Michael Jäger

Em alguns casos, quando o núcleo do cometa é mais empoeirado, além de gerar uma cauda muito mais exuberante, a presença de poeira pode tornar a coma mais amarelada também.

Só que a maioria dos cometas passam grande parte do tempo bem afastados, nas regiões mais frias do Sistema Solar. Nessa fase, eles se confundem com asteroides, não apresentam coma nem cauda, e sua coloração depende da composição de sua superfície. Normalmente são tão escuros quanto um pedaço de carvão ou, no máximo, levemente avermelhados. 

Existe também uma fase intermediária, no início e no fim da atividade de um cometa, geralmente quando ele está próximo da órbita de Júpiter, em que ele não apresenta uma cauda desenvolvida e sua coma assume uma coloração azulada. 

Cometa C/2012 S1 (ISON) próximo da órbita de Júpiter. A ionização dos gases de seus componentes mais voláteis lhe garante uma coloração azulada – Imagem: HST/NASA

O motivo dessa variação de cor da coma ao longo de sua trajetória é interessante. Quando a temperatura começa a se elevar durante a aproximação do cometa, seus componentes mais voláteis, como o monóxido de carbono e o nitrogênio, começam a sublimar primeiro. Outros, como a água, por exemplo, só evapora quando ele estiver ainda mais próximo da nossa Estrela-Mãe. Então, a coma de um cometa sofre variações em sua composição química dependendo de sua proximidade com o Sol, e quando são ionizados pela radiação solar, gases distintos emitem cores distintas de luz.

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Mas ainda existe outra questão: Quando o cometa está mais próximo do Sol, a radiação é tão elevada que é capaz de quebrar as moléculas orgânicas da sua coma, gerando carbono diatômico ou dicarbono, que como o nome sugere, é formado por dois átomos de carbono. Quando ionizado, o dicarbono emite a luz esverdeada que dá cor à coma de grande parte dos cometas. 

Mas curiosamente, a cauda de gases do cometa, também chamada de cauda iônica, não mantém essa coloração esverdeada da coma. Isso porque o dicarbono é uma molécula muito instável, que só existe em ambientes extremamente energéticos ou com pouco oxigênio, como os cometas, mas só quando eles se aproximam do Sol. Só que a mesma radiação que gera o dicarbono também quebra essas moléculas à medida que elas são arrastadas para a cauda. 

Sem o dicarbono, a coloração da cauda iônica vai ser definida em função dos outros gases mais abundantes, geralmente, o monóxido de carbono, que lhe garante uma coloração mais azulada.

C/2022 E3 (ZTF), o “Cometa Verde” e o C/2022 U2 (Atlas), também verde, em um encontro de cometas registrado em 6 de fevereiro – Crédito: Steve Bemmerl

Então, quando ouvir falar novamente em “Cometa Verde”, saiba que isso pode se referir a qualquer cometa que esteja próximo o suficiente do Sol para ter suas moléculas orgânicas quebradas pela radiação, gerando dicarbono em sua coma. Mas por enquanto, já que o apelido “pegou”, vamos assumir que se trata do Cometa C/2022 E3 (ZTF). 

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