Como parte do julgamento antitruste do Google, um acordo bilionário entre a gigante das buscas e a Apple está sob investigação pela Justiça de Washington (EUA).

Dois executivos da empresa da maçã, o chefe de IA John Giannandrea (chefe dos negócios de busca do Google até 2018) e Eduardo Cue, chefe dos serviços da Apple (que liderou as conversas para melhorar o contrato com o Google), foram chamados para testemunhar.

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Giannandrea começou seu testemunho nesta quinta-feira (21) e continuará a ser ouvido nesta sexta-feira (22). Cue começa seu depoimento logo após seu colega de Apple.

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Que acordo é esse?

  • As gigantes têm acordo de cerca de US$ 19 bilhões (R$ 93,79 bilhões), no qual o Google paga à Apple anualmente;
  • O acordo garante que o motor de busca do Google seja o padrão em dispositivos da maçã, como o iPhone e o iPad;
  • Ele existe há 18 anos;
  • Os registros das transações e da parceria são fortemente escondidos dos olhos do público por parte das empresas.

Mas o que já foi classificado como “guerra termonuclear” por Steve Jobs, dada a massiva presença das duas empresas no mercado de smartphones (tanto na produção de hardware, como de software), hoje é entendida pelos especialistas como parceria pacífica descrita como sendo um duopólio.

Nossa visão é que nós trabalhamos como se fôssemos uma só companhia.

Empregado sênior da Apple, em e-mail destinado a um executivo do Google, enviado em 2018 e citado pela Justiça estadunidense

Dessa forma, é seguro dizer que todos os smartphones iOS e Android vendidos nos EUA (e, possivelmente, na maioria do planeta) sai da caixa com o Google pré-instalado.

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O que a Justiça estadunidense quer saber, porém, é se o acordo caracteriza-se como monopólio e se impede que os concorrentes do Google, como o Microsoft Bing, tenha acesso aos usuários da maçã.

“Profundamente falho”

O Google, contudo, refuta a tese do Departamento de Justiça. Conforme o The Washington Post, em postagem no blog da gigante das buscas, o presidente de assuntos globais da empresa, Kent Walker, chamou o processo judicial de “profundamente falho”, e que o acordo com a Apple não impede os usuários de iOS e demais sistemas da empresa de utilizar outros sistemas de busca disponíveis no mercado.

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Tornar mais fácil para as pessoas obterem os produtos que desejam beneficia os consumidores e é apoiado pela lei antitruste americana. Em suma, as pessoas não usam o Google porque precisam – elas usam porque querem.

Kent Walker, presidente de assuntos globais do Google, em postagem no blog da empresa

Os procuradores querem indagar Giannandrea sobre documentos relacionados com as capacidades de busca da Apple e documentos internos da empresa que analisam a qualidade de Google e Bing. Um dos advogados da companhia discordou, afirmando que esses “assuntos gerais” são considerados confidenciais pela maçã.

O advogado do Departamento de Justiça. Kenneth Dintzer, perguntou a Giannandrea, nesta quinta-feira (21), sobre um dos novos recursos disponibilizados no recém-lançado iOS 17, que permite aos usuários a escolher qual ferramenta de busca preferem tanto no modo privado, como no modo regular do Safari, o navegador da maçã, visto que a jogada pode reduzir a força do Google no iPhone.

Acordo bilionário entre Apple e Google pode ruir (Imagem: Reprodução)

Próximos passos

Na sequência do julgamento, os procuradores esperam apertar o cerco sobre Giannandrea e Cue sobre os acordos do Google, buscando provar que a empresa monopoliza sua fatia de mercado na pesquisa geral (90% pertence a ela), dita os termos e impede que a Apple teste outros motores de busca em seus produtos.

Por sua vez, o Google visa conseguir evidências dos executivos que a Apple escolheu seu buscador de forma livre e simplesmente por ser o melhor produto disponível no setor.

O juiz do caso, Amid Mehta, deve considerar questões jurídicas que, ao mesmo tempo, são instáveis e técnicas. Enquanto ser um monopólio não é algo ilegal, abusar desse poder para reprimir sua concorrência é, e o Departamento de Justiça argumenta que o Google forçou Apple e outros fabricantes a assinar tais acordos.

Dintzer disse, na semana passada, durante o julgamento, que o padrão de exclusividade não foi escolhido pela Apple, citando que a empresa da maça também queria negociar com o Yahoo, antes da exigência do Google.

Neil Shah, vice-presidente de pesquisa da Counterpoint Research, pontuou que, apesar de a Apple deter 52% do mercado geral de smartphones dos EUA, ela comanda 80% do mercado de smartphones premium. O Google está pagando para exibir seus anúncios para quem usa iPhone e está dividindo os lucros com a Apple.

Tentativas frustradas

A Apple tentou, mas não obteve sucesso, cancelar as intimações enviadas a seus executivos para que esses depusessem antes do julgamento, sob a alegação de que a empresa – terceira parte no caso – tem sido “objeto de demandas atipicamente amplas e onerosas ao longo deste caso”.

Ela ainda argumentou que já forneceu mais de 125 mil documentos e mais de 21,5h de depoimentos de seus executivos. Nos autos do processo, a companhia afirmou que isso reflete “suas deliberações comerciais internas mais sensíveis”.

O vice-presidente de desenvolvimento corporativo da Apple, Adrian Perica, também foi intimado a depor, mas não deverá estar em pessoa.

Mehta vai seguir a UE?

O fato é que o juiz Mehta terá o poder de mudar os termos do acordo, ou, ainda, desfazê-lo, caso ele entenda que o Google agiu d e forma ilegal quando o firmou com a Apple.

A União Europeia (UE) julgou caso similar, também relacionado ao Google, e obrigou que as fabricantes colocassem em seus dispositivos uma espécie de tela que permitisse aos usuários escolher qual ferramenta de busca eles gostariam de utilizar.

Na semana passada, Dintzer citou um e-mail de um executivo do Google enviado internamente sobre um encontro com um colega da Apple, em 2007:

Então, disse a ele que tínhamos duas opções: 1) Sem posicionamento padrão – sem participação na receita no Safari/Windows. 2) Sim, colocação padrão – compartilharemos a receita sob o contrato atual.

Jeff Shardell, executivo do Google, em e-mail interno enviado em 2007, sobre encontro com colega da Apple

Dintzer argumentou que o e-mail mostrava que era o Google quem mandava. “Isto não é uma negociação”, disse a Mehta. “Este é o Google dizendo: ‘É pegar ou largar’.”

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