Na noite da última quinta-feira (22), o módulo lunar Odysseus fez da Intuitive Machines a primeira empresa privada a conseguir realizar um pouso suave na superfície da Lua, marcando o início de uma nova era da exploração do Espaço.

Entretanto, os longos 15 minutos de espera pelo sinal de que a Odysseus havia pousado com segurança, e a posterior notícia de que a nave havia tombado durante o pouso, nos fizeram refletir sobre o quão desafiador é retornar ao solo lunar. Por que, afinal, uma conquista que pareceu tão grandiosa há mais de meio século ainda é tão complexa de ser repetida?

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Esta é uma questão intrigante, especialmente considerando todo o progresso tecnológico dos últimos 50 anos. Quando Neil Armstrong deu aquele pequeno passo para um homem, mas um grande salto para a humanidade, a Internet ainda não existia, o computador mais potente da época não era páreo para um simples relógio de pulso atual, e aquele “Nokia Tijolão” ainda precisaria de quase 30 anos para ser inventado. Mesmo assim, mandamos o homem para a Lua, e hoje, com toda tecnologia, automação, inteligência artificial e o escambau, ainda temos dificuldades para pousar uma nave não-tripulada em nosso vizinho espacial?  Por que voltar à Lua parece ser tão difícil?

Na verdade, nunca foi fácil chegar à Lua. Nos anos 60, enfrentar os enormes desafios impostos por uma viagem inédita rumo ao desconhecido era uma tarefa monumental. Quando, em 1962, o Presidente John F. Kennedy anunciou em discurso que os americanos enviariam um homem para a Lua até o final daquela década, mal sabíamos os efeitos da falta de gravidade e da exposição à radiação cósmica para o organismo humano.

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Estávamos apenas dando nossos primeiros passos rumo ao Espaço e não tínhamos sequer um foguete com a capacidade de enviar uma nave à Lua, nem mesmo o projeto de um módulo lunar. No entanto, Kennedy proporcionou aos engenheiros da NASA tudo o que eles precisavam para transformar aquele sonho distante em uma épica realidade: uma grande motivação e um orçamento praticamente ilimitado.

Os Estados Unidos realizaram seus pousos tripulados na Lua entre os anos 1969 e 1972. Crédito: NASA

Estima-se que somente o programa Apollo tenha custado mais de 25 bilhões de dólares para o governo americano. Se considerarmos a inflação dos últimos 50 anos, essa cifra superaria os 180 bilhões de dólares, um valor quase tão grande quanto a fortuna de Elon Musk e suficiente para uma família americana média viver confortavelmente por 1 milhão e meio de anos. Esses investimentos não apenas representaram uma façanha financeira monumental, mas também aceleraram o desenvolvimento científico e tecnológico. Eles permitiram que, uma a uma, fossem removidas as barreiras que impediam a realização da maior aventura da humanidade.

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E a principal motivação para tamanho empenho do governo americano não era apenas científico, mas principalmente bélico. Naquele momento, Estados Unidos e União Soviética travavam uma guerra sem tiros, uma corrida armamentista que visava o domínio global pela superioridade militar. A Corrida Espacial só ocorreu porque americanos e soviéticos acreditavam que o dominar o espaço representaria uma vantagem estratégica em caso de um conflito entre as duas nações. 

No entanto, o cenário global atual é significativamente diferente e os motivos que hoje nos levam de volta à Lua são outros. Ao invés da Guerra Fria entre dois países, agora temos um ambiente com uma variedade bem maior de atores envolvidos, incluindo empresas privadas e agências governamentais de diversas nações, competindo por um valioso mercado espacial. Mas há também uma notável cooperação entre esses atores para alcançar objetivos comuns. Tudo isso deveria facilitar ainda mais as coisas, mas algo que foi um dos principais impulsionadores da Corrida Espacial, o orçamento, hoje é consideravelmente mais limitado. 

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E precisa ser assim, afinal, os altos custos das missões espaciais foram alvo de diversos protestos nos Estados Unidos e foi um dos principais motivos do fim do Programa Apollo. Hoje, tornar as viagens espaciais mais baratas é o principal desafio desta nova Corrida Espacial e um caminho sem volta para tornar a exploração do Cosmos mais sustentável e permanente. E sabe como reduzir os custos de missões tão complexas como uma viagem à Lua? Com muita tecnologia. 

A Odysseus é um exemplo disso. Com a utilização de materiais mais leves e resistentes, combustíveis mais eficientes, um motor construído em uma impressora 3D e sistemas inteligentes como o de pouso autônomo, permitiram à Intuitive Machines realizar um pouso suave na Lua com um orçamento de apenas 118 milhões de dólares. Claro, é uma nave bem menor e não-tripulada, mas apenas uma pequena fração dos cerca de 10 bilhões que custavam uma Missão Apollo. 

Instrumentos da sonda Nova-C, módulo de pouso lunar da Intuitive Machines (Odysseus é o nome da Nova-C utilizada na missão IM-1, a primeira da empresa). Créditos: Intuitive Machines

No entanto, é importante ressaltar que todo desenvolvimento tecnológico envolve uma série de testes e, muitas vezes, falhas. Falhas que também são úteis no amadurecimento dessas tecnologias, mas que ninguém quer que ocorram quando humanos estiverem a bordo. A segurança, que era um fator secundário durante a corrida espacial entre Estados Unidos e União Soviética, tornou-se um diferencial crucial nas missões atuais.

As Missões Apollo eram tão arriscadas que, quando Armstrong e Aldrin se preparavam para pousar em solo lunar, o então presidente Nixon já tinha pronto um discurso para informar o mundo que os astronautas não retornariam, caso algo desse errado. E por muito pouco ele não precisou ler esse discurso, porque o módulo de pouso teve problemas e os astronautas só se salvaram graças à habilidade de Niel Armstrong em pilotar manualmente a nave nos últimos minutos da descida à Lua. E isso sem falar do drama da Apollo 13, considerado o mais bem sucedido desastre da história da exploração espacial.

Danos no Módulo de Serviço registrados pelos astronautas da Apollo 13. Crédito: NASA

Riscos desse nível são inaceitáveis no cenário atual, principalmente porque a exploração espacial agora não está associada a nenhuma estratégia militar. Além disso, não buscamos “apenas” repetir os feitos grandiosos do Programa Apollo. O novo paradigma, que começou a se tornar realidade com o pouso da Odysseus, envolve a exploração comercial das viagens lunares e o estabelecimento definitivo da humanidade na Lua, através de bases orbitais e em solo. A redução dos custos dessas viagens abre espaço também para a possibilidade de voos turísticos para o nosso satélite natural.

Retornar à Lua não é uma tarefa fácil, mas a principal dificuldade no momento é fazer isso se adequando às realidades do novo mercado espacial, envolvendo uma cooperação global, empresas privadas, novas tecnologias, baixos custos, altos níveis de segurança e objetivos muito mais ousados. E a partir do momento em que tudo isso for realidade e que estivermos estabelecidos em solo lunar, estaremos prontos para o nosso mais ambicioso desafio, onde a Lua serviria de entreposto. Uma parada obrigatória, pra fazer um lanchinho, abastecer os foguetes e partir para Marte, onde a humanidade se tornará definitivamente uma sociedade interplanetária.