Rumores de que a Rússia havia desenvolvido uma arma espacial nuclear levantou questionamentos quanto ao descumprimento das normas internacionais de comportamento no espaço, o Tratado do Espaço Exterior (OST). O suposto armamento também fez com que discussões acerca do desenvolvimento de um novo tratado surgissem. Mas será que isso é necessário?

Para quem tem pressa:

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  • Os rumores fornecem poucas informações quanto a arma nuclear espacial desenvolvida pela Rússia;
  • A questão é se o armamento quebrou o Tratado do Espaço Exterior e o quais punições a Rússia poderia levar;
  • Alguns especialistas também debateram a possibilidade de um novo acordo para garantir a segurança espacial.

De acordo com Space.com, os rumores quanto ao novo armamento começaram quando o presidente do Comitê de Inteligência da Câmara dos EUA, Mike Turner (R-Ohio) enviou uma declaração ao presidente Biden. Nela, era pedido que informações sobre uma arma espacial nuclear da Rússia fossem tornadas públicas. No dia seguinte, John F. Kirby, conselheiro de Comunicações de Segurança Nacional da Casa Branca, apontou que, embora preocupante, o novo armamento não é uma ameaça a ninguém.

Não estamos falando de uma arma que possa ser usada para atacar seres humanos ou causar destruição física aqui na Terra. Ainda não está claro se a potencial capacidade russa diz respeito a uma ogiva nuclear no espaço ou a algum tipo de arma anti-satélite movida a energia nuclear.

John F. Kirby, em comunicado

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A Rússia descumpriu o Tratado do Espaço Exterior?

O Tratado do Espaço Exterior surgiu, em contrapartida ao desenvolvimento de mísseis balísticos intercontinentais, que fazem esse caminho pelo espaço. Os Estados Unidos, a União Soviética e o Reino Unido foram os primeiros a assinar o acordo em 1967, mas atualmente 114 países o assinam.

Representantes da União Soviética, Reino Unido e Estados Unidos durante assinatura do Tratado do Espaço Exterior em 27 de janeiro de 1967, em Washington (Crédito: ONU)
Representantes da União Soviética, Reino Unido e Estados Unidos durante assinatura do Tratado do Espaço Exterior em 27 de janeiro de 1967, em Washington (Crédito: ONU)

No entanto, desde lá, diversas tecnologias espaciais foram desenvolvidas, como naves espaciais e armas construídas para atacar satélites, ou lançar ataques a alvos terrestres a partir do espaço. Algumas delas não estão exatamente inclusas no OST.

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Mesmo que a Rússia tenha descumprido o acordo, não existe nada que possa ser exatamente feito, visto que há poucas opções de punição para a comunidade internacional. Ainda que sanções fossem impostas pelo Tratado do Espaço Exterior, a China, aliada russa, é membro permanente do Conselho de Segurança da ONU e poderia vetar as sanções impostas pela organização.

Um novo acordo seria a solução?

De acordo com Sharon Squassoni, pesquisadora na área de redução dos riscos da energia nuclear e das armas nucleares, um novo tratado que proíba o desenvolvimento ou a instalação de armas nucleares espaciais parece pouco provável. No cenário global, a Rússia sofre atualmente de problemas de credibilidade, podendo interromper a cooperação internacional.

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Além disso, Squassoni aponta que a Rússia desenvolvendo esse tipo de armamento é até mesmo irônico, visto que o país ficou durante muito tempo na vanguarda do controle de armas no espaço. Em 2008, por exemplo, russos e chineses apresentaram um projeto na Organização das Nações Unidas, propondo que as nações se obrigassem a “abster-se de colocar em órbita objetos que transportam qualquer tipo de arma, instalar armas em corpos celestes, e ameaçando usar a força contra objetos no espaço sideral”. No entanto, o tratado não obteve amplo apoio internacionalmente.

Um novo acordo do tipo provavelmente também não teria apoio visto tentativas anteriores de controles de armas, de acordo com Ron Doel, professor que estuda história da ciência e do espaço, especialmente no contexto da Guerra Fria. 

Ratificar o tratado do Espaço Exterior de 1967 provou ser mais fácil de fazer do que, digamos, o subsequente tratado SALT II (que estendeu algumas disposições do OST). É melhor manter as estruturas atuais em vigor, mesmo enquanto os principais sistemas tecnológicos estão evoluindo?

Ron Doel, em resposta a Space.com

Doel aponta também que tratados geralmente são frágeis, sendo honrados apenas enquanto nenhum novo desenvolvimento político, econômico ou tecnológico surja para desafiá-los. Por exemplo, o Tratado da Antártida de 1959 continua sendo respeitado, visto que nenhum recurso natural que pudesse desencadear uma corrida do ouro foi descoberto. Enquanto isso, na Lua, diferentes nações têm corrido para terem acesso à água, minerais de terras raras e outros recursos essenciais para exploração lunar e espacial.

Algumas crateras escuras na Lua, indicadas aqui em azul, nunca recebem luz. Os cientistas acreditam que algumas dessas regiões permanentemente sombreadas podem conter gelo de água.
Algumas crateras escuras na Lua, indicadas aqui em azul, nunca recebem luz. Os cientistas acreditam que algumas dessas regiões permanentemente sombreadas podem conter gelo de água. (Crédito: Goddard Space Flight Center da NASA)

E por causa disso que essa nova era tem ficado conhecida como uma nova corrida espacial, e assim como na Guerra Fria, o desenvolvimento de novas capacidades espaciais, também pode levar a novas questões de cooperação internacional espacial e a militarização da órbita terrestre. Um novo Tratado do Espaço Exterior ainda é uma incerteza.