Racismo pode estar por trás das teorias sobre visitas alienígenas na Terra

Filósofo escocês diz que a ideia de que civilizações antigas precisaram da ajuda de alienígenas carrega um viés racial
Flavia Correia18/09/2024 11h38, atualizada em 18/09/2024 15h08
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Civilizações antigas não-brancas não teriam capacidade de desenvolver tecnologias eficazes, a ponto de suas criações serem constantemente atribuídas à influências alienígenas? Crédito: Vladimir Zadvinskii - Shutterstock
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Crenças de que naves espaciais alienígenas visitam a Terra ou que civilizações antigas receberam ajuda de extraterrestres para desenvolver tecnologias sempre despertaram grande interesse. No entanto, quando se trata dessas civilizações do passado, faltam provas concretas que sustentem tais ideias, e muitas vezes essas teorias são fraudulentas ou facilmente explicáveis por outros meios.

Avistamentos modernos de OVNIs – termo normalmente usado para se referir ao que atualmente é chamado de Fenômenos Anômalos não Identificados (UAPs, na sigla em inglês) – também têm gerado relatos intrigantes, com pessoas observando luzes misteriosas e movimentos aéreos incomuns. 

Ainda que algumas dessas observações venham de fontes confiáveis, daí a afirmar que se trata de espaçonaves alienígenas é um salto enorme. A simples falta de explicação não comprova a existência de visitantes de outros planetas.

A ideia de que os antigos egípcios não poderiam ter construído as pirâmides sem ajuda extraterrestre pode ter uma essência racista. Crédito: Matrioshka/Shutterstock

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Filósofo propõe discutir sobre as consequências dessas crenças

Teorias da conspiração podem ter efeitos negativos, principalmente em comunidades vulneráveis. Para Tony Milligan, pesquisador em filosofia da ética no Kings College London, na Inglaterra, é necessário refletir sobre as consequências dessas crenças. 

Ele destaca que a ideia de que civilizações antigas precisaram da ajuda de alienígenas carrega um viés racial. Tais narrativas surgiram a partir da descrença de europeus quanto à capacidade de povos considerados “primitivos” de realizar grandes feitos, como a construção de monumentos. Em vez de reconhecer a capacidade tecnológica dessas culturas, pseudo-historiadores preferiram atribuir suas realizações à interferência externa.

Livros e documentários sobre alienígenas antigos se tornaram extremamente lucrativos, alimentando essas crenças. Em um artigo publicado no site The Conversation, Milligan destaca que um canal no YouTube dedicado ao tema, por exemplo, acumula milhões de seguidores há mais de 20 anos. 

Visitas alienígenas justificariam tecnologias desenvolvidas por não-brancos

Segundo ele, mesmo que as versões modernas tentem disfarçar o racismo implícito, continuam a desvalorizar as realizações das civilizações não-brancas, sugerindo que apenas gregos e romanos antigos criaram suas tecnologias de forma autônoma. Essa desvalorização também afeta narrativas indígenas, prejudicando culturas que, durante séculos, foram marginalizadas e silenciadas. 

Exemplo de Linha de Nazca fotografado no Peru em 2017. Esses riscos são constantemente atribuídos a visitas extraterrestres. Crédito: Canyalcin – Shutterstock

Milligan também se mostra preocupado com a difusão descontrolada das histórias alienígenas modernas, especialmente quando os governos se veem obrigados a responder, fazendo isso muitas vezes de maneira inadequada, criando mais desinformação e prejudicando a ciência.

Em vez de desmentir essas alegações de forma isolada, Milligan propõe a criação de um programa de pesquisa científica (SRP) para investigar o fenômeno. No estudo, aceito para publicação pelo Proceedings of the International Astronomical Union, o filósofo escocês explora o que justificaria o desenvolvimento desse programa e como isso poderia ser feito. No entanto, ele reconhece que muitos defensores dessas teorias não estão interessados em evidências, tornando a tarefa mais complexa.

Flavia Correia
Redator(a)

Jornalista formada pela Unitau (Taubaté-SP), com Especialização em Gramática. Já foi assessora parlamentar, agente de licitações e freelancer da revista Veja e do antigo site OiLondres, na Inglaterra.