Porque o ser humano não tem limites no que tange a ideias que podem acabar nos matando no futuro, a empresa de artefatos robóticos Ghost Robotics criou um cão robô com um rifle franco-atirador (vulgo sniper) montado em suas costas.

Sabemos que o texto poderia parar por aí, mas pelo bem da informação completa, seguiremos: a empresa publicou imagem do “Totó” em sua conta oficial do Twitter, citando “SWORD International” na legenda. Uma busca rápida no Google revela tratar-se de uma empresa de segurança privada e pesquisa de armas de pequeno e médio porte.

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No mesmo tuíte, também há menções à Associação do Exército dos Estados Unidos, uma espécie de entidade sindical em favor de soldados norte-americanos; e ao SOCOM, sigla que designa a área militar do governo dos EUA para operações especiais.

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Ah, sim. Tem a palavra “letalidade” em algum lugar ali, caso você ainda precise de mais calafrios.

“Robô cão sniper” rende críticas à empresa

Apesar do nosso tom jocoso, a notícia não foi muito bem recebida, de acordo com algumas respostas ao tuíte acima. Um usuário questionou se isso é uma boa ideia, adicionando que “algumas polícias provavelmente estão salivando” com a imagem publicada.

“Isso cruza uma linha moral, legal e técnica, além de nos levar para um mundo escuro e perigoso”, disse Toby Walsh, professor de inteligência artificial da Universidade New South Wales, na Austrália. “Tais armas serão usadas por terroristas e estados rebeldes. Elas serão armas do terror”.

O professor reconhece que, em nenhum momento, foi dito que o “cão robô sniper” tem capacidades autônomas – um trato característico da inteligência artificial -, mas ele também afirmou ao Futurism que a linha já tênue que divide, por exemplo, drones controlados remotamente por humanos e aqueles com capacidade de ação autônoma está cada dia mais difícil de ser enxergada.

Para ressaltar seu argumento, o professor lembrou de um caso relativamente recente: em novembro de 2020, uma operação conduzida pelo exército de Israel assassinou um cientista iraniano. O ataque foi conduzido por uma metralhadora autônoma montada na caçamba de uma picape – acompanhada de aproximadamente 20 agentes do Mossad, o serviço de inteligência de Israel. Havia, contudo, a suspeita de que o cientista em questão, Mohsen Fakhrizadeh, chefiava um programa nuclear secreto no Irã, mediante vigilância constante por cerca de oito meses.

“Eu só espero que isso crie um senso de urgência às discussões da ONU para regulamentar esse espaço [do militarismo mundial], e aquietar as vozes que afirmam que esse tipo de tecnologia ainda está longe”, disse Walsh. “Porque ela realmente não está”.

Imagem mostra um drone militar autônomo, que consegue agir por conta própria em ataques em zonas de conflito
Um drone autônomo de combate: artefato é armado com mísseis e armas de disparo rápido, e não requer nenhum comando humano para agir em áreas de conflito (Imagem: Comitê Internacional da Cruz Vermelha/Reprodução)

Citando as respostas ao tuíte, o professor de Ciências da Computação da Universidade de Berkeley (e extenso pesquisador do assunto), Stuart Russel, parece concordar com essa visão: “a maior parte das respostas a esse anúncio no Twitter são do tipo ‘tomara que você queime no inferno’. Isso porque pessoas normais entendem que permitir que máquinas decidam matar humanos é uma má ideia”, ele comentou. “É como disse uma das respostas: ‘O Exterminador do Futuro’ foi um alerta, não um manual de instruções”, em citação à franquia de filmes vivida por Arnold Schwarzenegger.

Segundo especificações técnicas, o robô e a arma são criações separadas: enquanto o “cão robô” é uma criação da Ghost Robotics, o rifle em si foi desenvolvido pela SWORD International, e de acordo com o site oficial da empresa, tem um alcance de quase 1,2 quilômetros.

“Considerando que o sistema é provavelmente controlado por humanos, e que outros países já criaram sistemas robóticos armados e controlados remotamente, eu não acho que esse sistema em específico crie novas questões éticas além daquelas já levantadas”, disse Michael Horowitz, professor de Ciências Políticas da Universidade da Pensilvânia. “Mas eu teria que saber mais detalhes deste sistema para afirmar isso com mais certeza”.

A união dos dois equipamentos coloca a Ghost Robotics em uma direção diferente de uma de suas principais concorrentes, a Boston Dynamics. A empresa subsidiária da Hyundai não só prometeu, mas reforçou em vários ocasiões, o compromisso de nunca armar seus robôs ou permitir que sejam armados – e o pior que já vimos deles foi um grupo externo à companhia instalar uma arma de paintball. Vale lembrar que a Boston Dynamics não gostou nem um pouco da brincadeira. 

Não por menos, o “pior” que vimos dela foi um vídeo com vários de seus robôs dançando o “Twist”.

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