A contaminação dos produtos de higiene pessoal com benzeno revela quão pouco controle existe em manter esse agente cancerígeno distante do nosso cotidiano. Esse componente, que foi ligado ao desenvolvimento de leucemia e outros cânceres do sangue, foi encontrado recentemente em itens como protetor solar e antitranspirante.

A Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA na sigla em inglês) identificou as prováveis fontes de benzeno em uma variedade de produtos de uso diário, o que gerou uma onda de recalls pelas empresas.

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Geralmente, desinfetantes para as mãos em forma de gel dependem de um agente espessante chamado carbômero. Esse é apenas um dos ingredientes que a FDA sinalizou, na semana passada, que pode estar causando a contaminação com benzeno.

A agência federal norte-americana também disse que um conservante antifúngico chamado benzoato de sódio pode formar benzeno sob certas circunstâncias. Muitos sabonetes líquidos para as mãos ou corpo listam o benzoato de sódio como ingrediente.

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Muitos sabonetes líquidos contêm benzoato de sódio, que pode se transformar em benzeno
Muitos sabonetes líquidos contêm benzoato de sódio, que pode se transformar em benzeno. Imagem: Maridav / Shutterstock

Outras fontes de contaminação listadas pela FDA foram o isobuteno e outros hidrocarbonetos, que incluem butano e propano. Os hidrocarbonetos são produzidos por meio do refino do petróleo bruto – e sabe-se que o benzeno está presente no petróleo.

Dificuldade em encontrar o benzeno

O problema é que determinar todas as origens da contaminação por benzeno não é uma questão tão simples. Como as cadeias de produção são muito complexas, a contaminação pode vir de vários lugares: um conservante, um propelente ou um espessante.

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“Durante o processo de fabricação, vestígios de benzeno podem estar presentes em uma variedade de matérias-primas, que podem incluir o propelente que é usado para dispersar o conteúdo de uma lata de aerossol”, explicou Alexandra Hayes, porta-voz do grupo lobista Household & Commercial Products Association.

Além disso, as empresas podem terceirizar a fabricação e o enchimento de suas latas de aerossol. Esses, por sua vez, contam com uma série de fornecedores para cada componente. Geralmente, esses fornecedores operam em países onde a mão de obra é barata e a regulamentação é frouxa.

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Empresas podem terceirizar a fabricação e o enchimento de suas latas de aerossol
Terceirização na fabricação e enchimento de latas de aerossol pode facilitar a contaminação por benzeno. Imagem: Den Debono / Shutterstock

Para piorar, a FDA não realiza testes de contaminantes. Ou seja, deixa a análise a cargo de laboratórios e das próprias empresas. Por isso, talvez não seja exatamente surpreendente que a denúncia tenha partido de um pequeno laboratório chamado Valisure – localizado em New Haven, Connecticut, nos Estados Unidos.

Produtos e empresas afetadas pela contaminação

Inicialmente, em março deste ano, a Valisure testou desinfetantes para as mãos em gel e líquidos. A ideia partiu do diretor-científico do laboratório, Kaury Kucera, depois que ele descobriu que a FDA estava permitindo temporariamente que os produtos de limpeza contivessem vestígios de benzeno como forma de preencher a lacuna de fornecimento durante o início da pandemia do Covid-19. Na ocasião, o laboratório encontrou níveis de benzeno de até 16 partes por milhão em desinfetantes para as mãos.

Mas, recentemente, os recalls relacionados ao benzeno se estenderam para produtos em aerossol. Foi o caso, por exemplo, de alguns protetores solares Neutrogena (Johnson & Johnson), de antitranspirantes Old Spice e Secret (Procter & Gamble Co.) e de sprays para pés Lotrimin e Tinactin (Bayer AG).

No início de dezembro, a P&G expandiu seu recall para xampus e condicionadores secos – ainda que eles sejam considerados cosméticos pela FDA. Com isso, foram afetados produtos vendidos sob as marcas Pantene e Herbal Essences.

Algumas marcas de xampu a seco também fizeram recall de seus produtos em decorrência da contaminação por benzeno
Algumas marcas de xampu e condicionador a seco também fizeram recall de seus produtos. Imagem: Zigres / Shutterstock

Segundo a reportagem da Bloomberg, apenas a P&G se pronunciou sobre o ocorrido, informando que os propelentes usados por um parceiro de fabricação, que ela se recusou a nomear, eram os culpados pela contaminação.

Já a J&J, a Beiersdorf AG e a Bayer se recusaram a comentar sobre a causa de seus recalls ou o que estão fazendo para garantir que o benzeno não contamine seus produtos novamente.

Algumas empresas, em uma posição ainda mais extrema, sequer fizeram recall de produtos que foram apontados como contaminados pelo laboratório Valisure.  Isso inclui os sprays antitranspirantes da marca Equate (Walmart Inc.) e Suave (Unilever PLC) e o spray vaginal Summer’s Eve (Prestige Consumer Healthcare Inc.).

A Unilever disse em um comunicado por e-mail a Bloomberg que conduziu uma “investigação robusta” de seus antitranspirantes e desodorantes e que está confiante na segurança deles. Já o Walmart e o Prestige não responderam aos pedidos de comentários.

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Limite de benzeno aceito pela FDA

A FDA pediu que as empresas que recolham qualquer produto que contenha nível de benzeno superior a 2 partes por milhão. No entanto, especialistas aconselham reduzir a exposição ao produto químico sempre que possível.

“Para os carcinógenos humanos conhecidos, não existe uma quantidade segura”, disse Peter Orris, chefe de medicina ocupacional e ambiental do Hospital e do Sistema de Ciências da Saúde da Universidade de Illinois.

Em comparação com o ideal, a realidade encontrada é bem diferente. O laboratório Valisure identificou níveis de até 6 partes por milhão em protetores solares e o triplo em antitranspirantes.

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