Pesquisador da USP faz primeiro registro de comportamento homossexual em macacos-prego

Flavia Correia12/04/2022 15h13
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Imagem: Henrique Rufo
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Um estudo publicado no periódico científico Behaviour é o primeiro a trazer registros de comportamento homossexual em macacos-prego do gênero Sapajus fora de cativeiro

Comportamento homossexual em macacos-prego só havia sido observado, até agora, em cativeiro. Imagem: Marcelorpc – Shutterstock

De acordo com o principal autor da pesquisa, o biólogo Henrique Rufo, doutorando no Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia (IP) da Universidade de São Paulo (USP), que estuda o aprendizado social de macacos-prego, foram quatro episódios de alguns segundos entre seis macacos diferentes, parte do grupo de 33 indivíduos da espécie Sapajus libidinosus que vivem no Parque Ecológico do Tietê, na Zona Leste de São Paulo.

Rufo conta que as observações aconteceram de forma não planejada durante um experimento feito como parte de sua pesquisa de mestrado. Ele colocou duas caixas-problema de acrílico com alguns furos no topo e melado dentro no ambiente onde os macacos vivem, buscando analisar como os animais usariam ferramentas para acessar o alimento e como esse aprendizado se espalharia socialmente. 

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Enquanto os macacos eram gravados, houve quatro ocasiões nas quais um macaco macho se aproximou de outro macho que estava interagindo com uma das caixas, montou nele e começou a praticar atos sexuais.

Segundo Rufo, a ideia de publicar esses registros surgiu quando a revista Behaviour divulgou um chamamento para artigos de relatos anedóticos (ou seja, experimentos com um número de casos muito pequeno para poder embasar uma conclusão científica que pode ser generalizada) dentro da área do comportamento animal.

Até então, só havia registro publicado de comportamento homossexual em macacos-prego do gênero Sapajus em cativeiro, onde machos foram observados montando outros machos quando estes foram reintroduzidos ao grupo após uma separação.

Interações sexuais entre macacos do mesmo sexo são comuns

Embora os novos achados sejam apenas anedóticos, o autor explica que eles têm valor por levantarem hipóteses iniciais que podem ser investigadas de forma sistematizada posteriormente. Uma delas é de que os casos observados incluem macacos juvenis montando em macacos adultos, sugerindo que talvez o comportamento sexual entre machos nessa espécie não tenha uma função de estabelecer dominância.

Interações sexuais entre primatas do mesmo sexo (que podem envolver a monta, o toque, estímulo oral ou a exibição dos genitais para um alvo específico) são muito comuns  na natureza. 

Comportamentos desse tipo já foram observados em diversas espécies, como chimpanzés, babuínos, mandrils, langures, bonobos, gorilas, orangotangos na África e Eurásia, além de saguis, macacos-aranha, macacos-de-cheiro e os próprios macacos-prego, nas Américas.

Comportamentos homossexuais, como a monta de um macho sobre outro e a exibição de genitais, já foram observados em várias espécies de macacos, como os chimpanzés. Imagem: Patrick Rolands – Shutterstock

Essas interações podem ter funções sociais das mais diversas.  Em macacos-dourados e macacos-de-cheiro, as montas e a exibição de genitais, respectivamente, estão associadas a relações de dominância, mas isso não parece ser um fator-chave para a maioria das espécies. 

Bonobos, por exemplo, usam o sexo para solicitar partilha de comida e para gerenciar conflitos, acalmando os ânimos ou servindo como reconciliação após uma briga, algo também observado em macacos-prego do gênero Cebus.

“Vendo que existem poucos trabalhos direcionados ao campo do comportamento sexual entre indivíduos do mesmo sexo em macacos das Américas, esse artigo pode servir como um pontapé inicial para outros estudos mais aprofundados na discussão sobre o comportamento sexual de primatas”, explica Rufo, que afirma ter planos de entrar em contato com outros pesquisadores da área para compilar vários registros pontuais como esse em um trabalho mais completo com potencial de indicar conclusões mais sólidas.

A pesquisa foi realizada com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e de uma bolsa de mestrado do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), tendo sido feita sob orientação do professor Eduardo Ottoni, que também assina o artigo.

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Flavia Correia
Redator(a)

Jornalista formada pela Unitau (Taubaté-SP), com Especialização em Gramática. Já foi assessora parlamentar, agente de licitações e freelancer da revista Veja e do antigo site OiLondres, na Inglaterra.