Em um anúncio inesperado, o governo dos EUA anunciou o fim dos programas de testes de armas antissatélite. O anúncio foi feito pela vice-presidente Kamala Harris durante visita à base da Space Force em Vandenberg, no condado de Santa Barbara, Califórnia.

Segundo a segunda-em-comando dos EUA, a ideia é dar os primeiros passos em busca de uma melhor coexistência de nações no espaço, com os EUA servindo de modelo para que outros países com capacidade espacial sigam o exemplo e também busquem uma execução de atividades mais pacífica fora da Terra.

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A vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, anunciou o fim dos testes de armas anti-satélite durante visita à base da Space Force em Vandenberg, na Califórnia
A vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, anunciou o fim dos testes de armas antissatélite durante visita à base da Space Force em Vandenberg, na Califórnia (Imagem: Gage Skidmore/Flickr/Uso acreditado livre)

De acordo com o Guia do Instituto Naval para Sistemas de Armas Navais do Mundo, as armas antissatélite (ou simplesmente “ASATs”) foram desenhadas com estratégias e táticas militares em mente. Seus testes datam desde o auge da Guerra Fria, quando EUA e a extinta União Soviética disputavam a supremacia tecnológica também no aspecto bélico.

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Isso porque satélites, desde o primeiro do tipo lançado (Sputnik 1), vêm sendo aplicados em uma série de contextos: militarmente falando, eles servem como navegação de tropas, comunicação com centros militares e pelotões em regiões de conflito e, talvez o maior interesse das nações com essa capacidade, a coleta e entrega de inteligência de países inimigos.

Satélites armados, embora nunca utilizados em um contexto real de combate, já foram demonstrados por países como China, Índia, Rússia e, claro, EUA. As demonstrações sempre eram executadas sobre alvos domésticos desativados – como satélites “mortos”, por exemplo – e nunca sobre alvos estrangeiros.

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Na prática, funciona como um ótimo instrumento de dissuasão por meio da ameaça: “se você atacar minha estrutura na Terra, eu vou retaliar dos céus”. Entretanto, crescentes preocupações com o aumento de lixo espacial – em muito alavancado pela crescente participação da iniciativa privada na exploração do espaço – mudaram a perspectiva pública, e armas antissatélite deixaram de ser vistas como ferramentas de proteção, agora virando mais um agravante de destroços na nossa órbita.

O lixo espacial em si pode não incomodar muita gente, mas é importante lembrar que, no espaço, as normas da Física às quais estamos presos em Terra são elevadas a potências mortais: em maio de 2016, uma das janelas do vidro duplamente reforçado da Estação Espacial Internacional (ISS) foi trincado…por uma gota de tinta escapada de um satélite antigo em decaimento.

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Isso porque, por menor que seja a partícula de lixo espacial, ela acompanha a velocidade de rotação da Terra, que é de 1674 quilômetros por hora (km/h). Um choque a essa velocidade, mesmo com um objeto tão pequeno pode ser suficiente para destroçar um satélite, tirando-o de órbita e talvez até fazendo-o cair na superfície da Terra. Agora, imagine isso acontecendo em uma cidade.

De acordo com o Escritório das Nações Unidas para Assuntos do Espaço Sideral (UNOOSA), ao final de janeiro de 2022, foram registrados 8261 satélites em órbita – um aumento de 12% em relação aos 10 meses anteriores. Com empresas como a Starlink, a plataforma de internet da SpaceX, ambicionando levar mais e mais satélites para a órbita, esse número tende a aumentar – grosseiramente. E colisões entre satélites, apesar dos avanços tecnológicos de cada um deles, já foram registradas.

Por causa disso, os EUA estão apostando na ideia de que usar armas antissatélite para destruir objetos no espaço não é uma proposta tão inofensiva quanto possa parecer. Então dar início a algum tipo de conversa que estipule regras de convivência no espaço – assim como tropas militares em terra têm as chamadas “Regras de Engajamento” (que determinam se e quando soldados podem reagir, e como reagir, a situações de risco) – pode ser um caminho para evitar todas essas possibilidades.

“Existem várias discussões sobre diferentes normas em curso — não existe uma solução específica que sirva para todos nem tampouco uma forma de desenvolver uma. A abordagem que você tomar provavelmente será muito diferente dependendo de cada conteúdo e contexto”, disse ao Phys.org Robin Dicky, analista chefe no Centro Aeroespacial de Política e Estratégia Espacial.

O problema é que nações tendem a priorizar interesses próprios: eventos recentes viram a Rússia e a China se desvincularem de grandes blocos econômicos, por exemplo, e por isso, uma solução mais universal parece estar cada vez mais distante, já que, pelo princípio da soberania nacional, cada país é livre para desenvolver o que quiser, como quiser e quando quiser. Na prática, isso significa que qualquer consenso atingido será uma questão de escolha – e os países que não concordarem podem simplesmente decidir não seguir regra alguma.

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