É isso mesmo que leram, caros colegas líderes! Nossa permissividade está sendo colocada à prova como jamais havia acontecido. Você se sente pronto para compartilhar seus executivos com outras empresas? Pois muito bem, isso já é realidade em muitos casos, enxergue quem quiser.

Se de um lado há chefes inconformados simplesmente porque alguém da equipe não liga a câmera durante as reuniões, do outro há jovens que se organizaram e estão atuando em várias posições em diferentes organizações ao mesmo tempo.

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Dias atrás almocei com um brilhante executivo a quem, de tempos em tempos, dou mentoria. Fiquei surpreso e animado quando ele me descreveu sua atual rotina de trabalho. Ele é CIO e trabalha em uma companhia de base tecnológica que fatura cerca de 300 milhões de reais por ano. Até aí tudo bem. O interessante é que, ao mesmo tempo, ele ocupa o cargo de CEO em outra empresa, que poderíamos chamar de startup (tem apenas quatro anos da fundação) na área de prestação de serviços especializados. Disse-me que trabalha muito, mas está bem contente com a remuneração de CIO em combinação com a possibilidade de comandar o crescimento da startup que, ele acredita, se tornará em breve mais um unicórnio.

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Não aguentei e fiz a óbvia pergunta: seus superiores sabiam de seu duplo emprego/jornada e, se sim, aceitavam bem essa situação? A resposta foi intrigante. Após uma longa e evasiva explicação, entendi que os superiores sabem e fingem que não sabem. O profissional é bem valioso nas duas posições e seria uma terrível perda para as duas empresas deixar de contar com sua contribuição. Em outras palavras, não é, pelo menos até o momento, uma poligamia explícita como em alguns países do Oriente Médio, onde um homem tem várias esposas. Poderíamos dizer que é mais parecido com um casamento aberto que tolera a infidelidade colocando na balança as consequências de um eventual divórcio.

Para pessoas que cresceram admirando a fidelidade ao emprego dos japoneses e sonharam com uma trajetória ascendente e duradoura dentro de uma organização, estou certo de que a poligamia será bem chocante. Mas é esse o mundo novo, e temos que abrir nossas mentes para impensáveis realidades. Voltando ao caso descrito, cabe explicar que a startup está muito bem, comandada por um profissional que não conseguiria de maneira nenhuma contratar plenamente por uma questão de custos. A empresa na qual ele é CIO deve também estar satisfeita com as entregas, pois, se não estivesse, não aceitaria compartilhar, nem tacitamente. E o profissional, como dissemos, está contente. Pronto! Todos atendidos.

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É uma situação evidentemente instável. Preocupante, se pensarmos nos princípios de transparência que as empresas dizem perseguir. Pior ainda se considerarmos o compliance e a LGPD: será possível acomodar uma situação assim? Seria de fato ético? E se não for, poderia passar a ser em determinadas condições? Será possível que um arranjo desses, com todas as suas nuances, dê certo a médio e longo prazos? Ou é uma clara fase de transição para o empregador e para o empregado, convenientemente acobertada? Não tenho, nem eu nem ninguém, todas as respostas, mas vale estarmos atentos e abertos a uma possível nova realidade.

Presumo que esse tipo de arranjo tenha começado a surgir nas áreas de tecnologia, na qual alguns desenvolvedores têm um cargo fixo e, em paralelo, preenchem sua jornada ampliada com outros trabalhos transitórios. O mesmo acontece em publicidade e design com funcionários que são ao mesmo tempo fixos e freelas. Imagino também que o trabalho remoto tenha alavancado enormemente essas dualidades e até mesmo trinalidades.

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Para ser sincero, tenho esperança de que esse movimento seja o prenúncio de uma revolução nas relações de trabalho atuais. A verdadeira e conclamada reforma trabalhista. Deveríamos olhar para o que está acontecendo com uma boa dose de otimismo e enxergar que talvez estejamos evoluindo para uma realidade com maior liberdade e mais ganhos para todos. Tanto para os que chamávamos antigamente de empregadores quanto para a espécie em extinção chamada empregados. Regras que tratavam diferentes como iguais vão se derretendo para dar lugar à possibilidade de arranjos do tipo “trabalhe quanto quiser ou quanto precisa de fato”.

Resta saber se estamos todos prontos para deixar nossos preconceitos de lado, encarar uma realidade dessas e ser felizes.

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