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O clima extremo de 2023 fez deste ser considerado pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) o ano mais quente já registrado. O “Super El Niño” ganhou destaque nas manchetes como o principal responsável pelas intensas ondas de calor que ocorreram em praticamente todo o globo e apesar do ano ter chegado ao fim, as mudanças climáticas ainda podem estar apenas começando

Julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro. Foram seis meses consecutivos em 2023 em que tiveram sua maior temperatura histórica registrada este ano. A situação fica ainda pior se levarmos em conta que esse não foi um evento isolado, os últimos cinco anos estão entre os mais quentes já vistos. Entenda os impactos das mudanças climáticas em 2023.

El Niño

El Niño
Nasa capta imagem do El Niño – fenômeno meteorológico que eleva as temperaturas — Foto: Sentinel-6 Michael Freilich / Nasa

O El Niño é um fenômeno meteorológico que eleva a temperatura do Oceano Pacífico. Como consequência, há recordes de temperaturas em várias partes do globo. Esse tipo de evento costuma ocorrer a cada cinco ou sete anos, mas dessa vez chamou a atenção justamente por sua intensidade, que o fez ser informalmente classificado como “super”.

El Niño é basicamente uma mudança na força e direção dos ventos alísios que sopram do leste para o oeste no Oceano Pacífico, o que faz com que a água quente encontrada na parte ocidental do Oceano Pacífico se mova para a região central e oriental do Pacífico”, explica Ángel Adames Corraliza, professor de ciências atmosféricas da Universidade de Wisconsin, nos EUA, à BBC News.

“O aumento das temperaturas nas proximidades do Equador amplia a diferença térmica entre as latitudes equatoriais e polares, o que traz como consequência uma maior intensidade e estabilidade dos ‘jatos’, que são canais de ventos intensos que ocorrem na alta atmosfera e que controlam o comportamento das frentes frias”, diz um trecho da nota do o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais.

“Assim, durante anos do El Niño, esses jatos tendem a se posicionar sobre a Região Sul, motivando a alta frequência de passagens frontais sobre essa região e, em decorrência, um maior acumulado pluviométrico”, completa ainda o órgão.

Incêndios florestais/fenômenos
Incêndios florestais (Imagem: shutterstock/Toa55)

O El Niño deixa a atmosfera mais quente, o que o conecta a outros fenômenos naturais, piorando questões relacionadas ao aquecimento global. Some isso ainda à atual onda de calor, que, entre 1998 e 2017, mataram mais de 166 mil pessoas no mundo todo, segundo dados da OMS – e seguem “atacando” nos EUA e Europa, por exemplo.

No Brasil, o El Niño atuou principalmente na formação de tempestades no Sul do país, ondas de calor no Centro-oeste e Sudeste, secas no Nordeste e incêndios florestais na região Amazônica. Lembrando que os efeitos do fenômeno ainda não acabaram, já que o evento deve se extender ainda por 2024. 

De acordo com as previsões, o fenômeno deve ter um pico em 2024, indicando um verão forte pela frente. Depois disso, o aquecimento do oceano deve amenizar por um tempo.

Ondas de calor 

População enfrenta forte onda de calor no Rio de Janeiro na terça-feira (14), com sensação térmica de 58,5ºC. Crédito: Tomaz Silva/Agência Brasil

As altas temperaturas não foram resultados apenas dos efeitos do El Niño. O meteorologista Petteri Taalas, secretário-geral da OMM, diz que o calor sentido por todo globo é uma combinação entre o fenômeno e as mudanças climáticas causadas pelas emissões de gases do efeito estufa, como o dióxido de carbono e o metano.

Taalas ainda aponta que nos próximos meses algumas regiões do globo ainda sofrerão com o aumento de eventos climáticos extremos, como secas, incêndios florestais, ondas de calor e enchentes. A partir de análises de padrões históricos e atuais, foi possível prever o comportamento do El Niño.

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o número de dias com ondas de calor no Brasil aumentou de 7 para 52 em 30 anos. Em 2023, esse número chegou a 68, um recorde histórico.

As ondas de calor ocorreram em todas as regiões do país, mas foram mais intensas no Centro-Oeste, Sudeste e Sul. 

Termômetro marcando 40 graus num dia marcado por muito calor na cidade de São Paulo
Termômetro marcando 40 graus num dia marcado por muito calor na cidade de São Paulo (Imagem: Rovena Rosa/São Paulo)

Em um recente relatório, o Inmet cita julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro como meses com médias de temperatura acima da média histórica. “Dentre os meses consecutivos mais quentes deste ano, setembro apresentou o maior desvio (diferença entre o valor registrado e a média histórica) desde 1961, com 1,6ºC acima da climatologia de 1991/2020 (média histórica)”, diz o Inmet.

O órgão ainda classifica 2023 como o mais quente registrado desde a década de 1960. “Em 2023, os meses citados foram marcados por calor extremo em grande parte do País e eventos de onda de calor, reflexo dos impactos do fenômeno El Niño (aquecimento acima da média das águas do Oceano Pacífico Equatorial), que tende a favorecer o aumento da temperatura em várias regiões do planeta. Desta forma, o cenário indica que o ano de 2023 será o mais quente desde a década 60”.

Nos anos 90 as ondas de calor não ultrapassam um limite de cerca de 1,5 °C em comparação com a média histórica. Mas nos anos 2010 elas atingiram 3°C a mais em alguns locais do Brasil. Ainda houve uma uma queda na taxa média de chuvas, variando entre 10 e 40%, no Nordeste, em partes do Sudeste e no Brasil central.

“Nossas análises revelam claramente que o Brasil já experimenta essas transformações, evidenciadas pelo aumento na frequência e na intensidade de eventos climáticos extremos em várias regiões desde 1961, que irão se agravar nas próximas décadas proporcionalmente ao aquecimento global”, disse Lincoln Alves, pesquisador do Inpe para a BBC.

Dados sobre a onda de calor de 2023 no Brasil:

  • Número de dias com temperaturas acima da média: 68;
  • Regiões mais afetadas: Centro-Oeste, Sudeste e Sul;
  • Dia mais quente já registrado na história do Brasil: 44,8°C, no dia 19 de novembro de 2023 em Araçuaí, Minas Gerais.

Ciclone e chuvas no Sul do Brasil

ciclone
Enchente do Rio Taquari na cidade de Lajeado (RS). (Imagem: marcelocaumors/Instagram via Agência Brasil)

Além do calor, 2023 ainda foi marcado por mortes resultantes de tragédias climáticas no Brasil. O Sul foi a região mais afetada e em dois momentos: primeiro com um ciclone devastador em setembro e depois pelas fortes tempestades em novembro.

O ciclone se formou no Oceano Atlântico Sul, a cerca de 500 quilômetros da costa do Rio Grande do Sul. Ele se intensificou rapidamente, atingindo a costa gaúcha com ventos de até 100 quilômetros por hora.

As chuvas fortes associadas ao ciclone provocaram inundações e deslizamentos de terra em todo o Rio Grande do Sul e em partes de Santa Catarina. Em alguns casos, os acumulados de chuva chegaram a mais de 200 milímetros em apenas 24 horas.

As inundações deixaram 49 mortes e 10 desaparecidos. Além disso, grandes prejuízos materiais, com muitas casas e prédios destruídos, com com custo da destruição estimado em R$ 2 bilhões.

O ciclone foi o maior desastre natural no Sul do Brasil em mais de seis décadas. Em toda a região foram registradas mais de 100 mil ocorrências, incluindo alagamentos, deslizamentos de terra e inundações. 

Além do ciclone em setembro, novembro e dezembro foram marcados pelas chuvas na região. De acordo com o Inmet, as chuvas no Sul do Brasil em 2023 foram as mais intensas dos últimos 50 anos:

  • No Rio Grande do Sul, o acumulado de chuva entre novembro e dezembro de 2023 foi de 2.743 milímetros, o que corresponde a 148% da média histórica;
  • Em Santa Catarina, o acumulado foi de 2.545 milímetros, o que corresponde a 146% da média histórica;
  • No Paraná, o acumulado foi de 2.167 milímetros, o que corresponde a 136% da média histórica.

Algumas cidades foram especialmente afetadas pelas chuvas:

  • Em Porto Alegre, o acumulado de chuva em novembro foi de 1.082 milímetros, o que corresponde a 159% da média histórica;
  • Em Florianópolis, o acumulado de chuva em novembro foi de 1.002 milímetros, o que corresponde a 170% da média histórica;
  • Em Curitiba, o acumulado de chuva em novembro foi de 839 milímetros, o que corresponde a 131% da média histórica.

A tragédia deixou pelo menos 8 pessoas mortas, além de milhares de desabrigados e mais uma vez a região que se recuperava de uma tragédia foi novamente atingida.

Tragédia em São Sebastião

vítimas das chuvas no litoral de SP
vítimas das chuvas no litoral de SP / Reprodução/Defesa Civil de São Sebastião

No final de semana do carnaval de 2023, um temporal histórico atingiu o Litoral Norte de São Paulo. A cidade mais afetada foi São Sebastião, onde a chuva chegou a 350 milímetros em 24 horas, o maior registro da história do Brasil.

Os deslizamentos de terra foram a principal causa de mortes e destruição. A Vila Sahy, na Costa Sul do município, foi a região mais atingida. Casas, comércios e até mesmo uma escola foram soterradas.

No total, 64 pessoas morreram na tragédia. Outras 200 ficaram feridas e 1.500 ficaram desabrigadas. O governo do estado de São Paulo mobilizou equipes de resgate e socorro para a região. Também foi decretado estado de calamidade pública.

A tragédia em São Sebastião causou comoção nacional. Voluntários de todo o Brasil se mobilizaram para ajudar as vítimas.

Estragos em São Sebastião após fortes chuvas
Deslizamento no litoral de São Paulo (Imagem: Divulgação/Prefeitura de São Sebastião)

Após a tragédia, o governo do estado de São Paulo anunciou a criação de um plano de ação para reduzir os riscos de desastres naturais no Litoral Norte. O plano prevê ações como reflorestamento, contenção de encostas e regularização fundiária.

2023 foi o ano em que a Terra ferveu. Em uma época em que a pandemia e as recentes guerras na Ucrânia e em Israel deixaram o debate sobre mudanças climáticas em segundo plano, a natureza mostra que o clima extremo exige ações imediatas e que não dá mais tempo de adiar as metas climáticas globais. 

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