Na última quarta-feira (12) foi celebrado o Dia Mundial da Fibromialgia. E não é apenas o nome da doença que assusta: seus sintomas e o caminho até fechar o diagnóstico correto também são atormentadores. De acordo com a Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), cerca de 5% das brasileiros são acometidos por essa incompreendida enfermidade.

Dores difusas por todo o corpo, cansaço extremo para realizar as atividades diárias, dores de cabeça, alterações de ritmo intestinal e sono não reparador (acordar cansado, como se não tivesse dormido) são alguns dos principais sintomas. “Cerca de 30 a 50% dos pacientes com fibromialgia apresentam depressão, ansiedade ou alterações de humor”, afirma ao Olhar Digital a reumatologista Mariana Ortega Perez, especialista pela SBR e doutora pela Faculdade de Medicina e Saúde da Universidade de São Paulo (FMUSP), onde atua como pesquisadora.

Mariana Ortega Perez é reumatologista da Clínica Cobra Reumatologia e do HC-FMUSP. Especialista pela Sociedade Brasileira de Reumatologia e doutora pela FMUSP, onde atua como pesquisadora.
Imagem: Arquivo Pessoal

Segundo a médica, a patologia não tem uma causa definida. “Não sabemos ao certo a causa da fibromialgia. Acredita-se que tenha componente multifatorial, com participação de fatores genéticos e ambientais. Alguns pacientes relatam que desenvolveram a doença após um gatilho ambiental, como trauma físico ou emocional, o que necessita ser sempre avaliado e abordado adequadamente”.

É o caso da professora Jaqueline Umezaki, 36, de Curitiba (PR). Ela conta que, em 2007, trabalhava como atendente de telemarketing e, por utilizar muito a mão direita para digitar no teclado numérico, com apenas 15 minutos de descanso por dia, acabou contraindo dores quase insuportáveis, que a levaram a procurar atendimento médico.

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“Comecei a sentir muita dor na mão e procurei um clínico geral, que me deu remédio para tendinite e me encaminhou para um ortopedista”, recorda Jaqueline. “Tirei várias radiografias, fiz exames de sangue, tratamento com acupuntura, fisioterapia e nada resolvia. Fui em especialista em dedos da mão, depois ombro, cotovelo, braço. Até que um me encaminhou para um reumatologista, dizendo que era fibromialgia”.

Além do esforço repetitivo, Jaqueline conta que havia muita cobrança e pressão por cumprimento de metas no trabalho que realizava na época, o que lhe ocasionava um elevado grau de estresse. “Então, eu acredito que tenha um fundo emocional sim”, afirma.

O mesmo aconteceu com Patricia Alves Barbosa, 42, que é gestora em Recursos Humanos em Pindamonhangaba (SP). “Eu acredito que as dores podem ser psicossomáticas, pois meu trabalho é muito estressante e passei por muitas situações difíceis, como um relacionamento abusivo que chegou a situações extremas, minha mãe com câncer, entre outros problemas”, explica Patricia.

Ela relata que acabou ficando desempregada, o que, somado a outros fatores, a impediu de dar andamento às investigações e a fechar um diagnóstico preciso, mas que tudo indica que realmente é um caso de fibromialgia, de acordo com os médicos que a atenderam na época.

“Sinto muitas dores pelo corpo todo: braços, pescoço, pernas, tudo. Em uma consulta clínica, relatei sobre as dores, a vontade de não fazer nada e, muitas vezes, nem de levantar da cama. Parecem dores tensionais, mas podem ser por eu ter síndrome de Hashimoto, uma doença autoimune”, revela a paulista.

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Dificuldade em fechar diagnóstico

A psicóloga Marta Tiefensee, 57, de Santo Ângelo (RS) levou dez anos para descobrir o motivo de tantas dores pelo corpo. “Nesse tempo, fui a vários médicos. Sempre com reclamação de dores no corpo, cansaço, alterações no humor, interferência na qualidade do sono, depressão, ansiedade generalizada. Na maioria dos dias, me sentia sem energia para realizar qualquer atividade”.

De acordo com a doutora Mariana, por ser uma doença de diagnóstico clínico, para a qual não existe um exame laboratorial específico, realmente não é fácil de se identificar. “No entanto, devemos solicitar exames para afastar outros diagnósticos, isto é, outras doenças que também causam dor e podem ser confundidas com fibromialgia”, explica a médica.

Mulheres entre 30 a 50 anos são as mais acometidas

Segundo a reumatologista, a fibromialgia acomete, na maioria dos casos, mulheres por volta dos 30 a 50 anos, exatamente como as nossas entrevistadas. “Mas pode ocorrer, em menor frequência, em crianças, adolescentes e idosos”, afirma.

Patricia, 42. Marta, 57. Jaqueline, 36. Mulheres nessas três faixas etárias são as principais vítimas da fibromialgia. Imagens de arquivo pessoal cedidas pelas entrevistadas

Marta é uma das pacientes mais características, sendo mulher na casa dos 50 anos. Ela foi diagnosticada no ano passado, em plena pandemia de Covid-19. “Depois de uma crise muito forte, o médico queria me internar no hospital. Só não o fez devido ao grande número de contaminados pela Covid”, relata. “Ele me orientou a ficar em casa e fazer o tratamento. Quando me foi revelado o quadro, eu passei a pesquisar sobre o assunto.  Já li vários artigos a respeito. Alguns deles falam em conflitos emocionais, já outros falam em genética. Existem aqueles que citam um processo inflamatório em uma região específica do cérebro, a qual exacerba a dor”.

Fibromialgia não tem cura e exige tratamento constante

Por ser uma doença crônica, que exige tratamento contínuo, não se fala em cura, mas em controle. “O paciente com fibromialgia deve ser tratado de forma multidisciplinar, com terapia não-medicamentosa e medicamentosa. Deve-se dar muita atenção ao tratamento não-medicamentoso, que envolve atividade física aeróbica e abordagem psíquica cognitiva-comportamental. É comum o paciente com fibromialgia iniciar a atividade física e se sentir desmotivado, pois as dores podem piorar”, explica Mariana.

Ela orienta, no entanto, que o paciente não desista. “O exercício físico deve ser sempre insistido, uma vez que os ganhos e a sensação de melhora são muito grandes. A atividade física tem muitos benefícios na fibromialgia, como alívio da tensão muscular, ganho na qualidade do sono, redução do estresse e ansiedade e melhora da disposição física”.

Em relação ao tratamento medicamentoso, a reumatologista explica que a terapia envolve a associação de analgésicos comuns, opioides, relaxantes musculares e moduladores da dor. “Na rede pública, há tratamento com reumatologistas, que são os especialistas no tratamento da fibromialgia. Além disso, o SUS oferece alguns medicamentos, como os analgésicos e os moduladores da dor”, afirma. O tratamento correto e levado a sério pode reduzir as dores em até 80%, de acordo com a SBR.

Pacientes com fibromialgia podem tomar a vacina contra Covid-19

Mariana explica que, pela fibromialgia em si, não existe contraindicação para a realização da vacina contra a Covid-19, “porém, é muito importante que o paciente converse com seu reumatologista”.

Em relação aos fatores de risco para quem é infectado pelo novo coronavírus, a médica afirma que pacientes com fibromialgia não estão no grupo propenso a formas graves de Covid-19. “Por não ser considerada um fator de risco, até o momento, a fibromialgia não está enquadrada no grupo prioritário para a vacina”.

Entretanto, o momento pede atenção redobrada. Para o reumatologista André Marun Lyrio, os casos dessa patologia devem apresentar um considerável aumento neste momento de pandemia, devido aos impactos psicológicos e emocionais que a Covid-19 tem causado.

Lyrio acredita que é importante usarmos a data para informar as pessoas sobre a doença e o que ela causa. “Conheço, inclusive, médicos que não acreditam na patologia, o que é muito grave. Quem convive com uma pessoa que tem esse problema de saúde, precisa entender que a dor não é uma frescura”, disse o médico ao jornal Correio de Campinas.

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