Poucas obras dos séculos XX e XXI tiveram um impacto tão amplo e profundo no público quanto as criações de Mauricio de Souza tiveram em todos os seus leitores desde a década de 1960 até hoje. Sucesso em todas as plataformas por onde se aventurou, a ‘Turma da Mônica’ está de volta aos cinemas em ‘Lições’, que estreia no próximo dia 30, em seu segundo longa-metragem com atores reais, ainda melhor e mais emocionante.

Falando por mim, tenho 36 anos e acompanho as histórias da Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali e companhia desde antes de saber ler (via as figuras e imaginava as histórias). A lembrança mas antiga que eu tenho da minha vida é uma mamadeira azul da Turma da Mônica que tinha ainda bebê. Então tentar segurar as lágrimas a cada cena, fala e referência em ‘Lições’ foi uma tarefa hercúlea – da qual falhei miseravelmente.

Assim como ‘Laços’ (2017), o novo filme é baseado em uma graphic novel de Vitor e Lu Cafaggi (parte do projeto Graphic MSP, que convida artistas brasileiros a reimaginar histórias da turminha) e dirigido por Daniel Rezende (‘Bingo: O Rei das Manhãs’), com roteiro de Thiago Dottori. Mas enquanto o primeiro filme tinha um tom nostálgico de aventura dos anos 1980, ‘Lições’ é parte do gênero que se convencionou chamar “coming of age”, lidando com a passagem dos personagens da infância para a pré-adolescência.

Na trama, depois de uma tentativa frustrada de fugir da aula, Mônica (Giulia Benite), Magali (Laura Rauseo), Cascão (Gabriel Moreira) e Cebolinha estão numa enrascada: foram pegos no ato e a líder da turminha acabou quebrando o braço.  O acidente leva a escola a sugerir que as crianças devam gastar seu tempo com outras atividades, que as tirem da zona de conforto da amizade do grupo. E num movimento mais radical, Dona Luísa (Monica Iozzi) e Seu Souza (Luiz Pacini), pais da Mônica, decidem mudá-la de colégio e proibida de encontrar os amigos. Isso coloca em risco a peça ‘Romeu e Julieta’ que o grupo estava preparando para o Festival do Bairro do Limoeiro dali a alguns dias.

publicidade
Turma da Mônica: Lições
Spoiler: a fuga do colégio não dá certo para a turminha. Imagem: Serendipity Inc/Divulgação

Até aí, HQ e filme são bem parecidos. Mônica tem dificuldade em se enturmar na nova escola, Cebolinha parte para uma fonoaudióloga para parar de trocar o “r” pelo “l” e Cascão começa as aulas de natação (só que não). Mas o enredo do filme faz alterações que ao mesmo tempo ampliam e aprofundam alguns dos temas debatidos na história, com o medo de crescer e a insegurança de lidar com os problemas “de adulto”.

A Magali é um dos principais pontos dessa mudança. Se na revista (que é belíssima por sinal, e todos devem ler) ela começa a fazer aulas de etiqueta e não devorar toda comida que vê pela frente, na versão carne e osso da personagem seus pais a colocam no curso de culinária como uma forma de controlar sua ansiedade. Magali come porque é ansiosa, e na falta da sua melhor amiga começa a comer mais ainda, sem controle. Sem sua maior rival, Cebolinha está livre para ser “o dono da Rua”, mas não para evitar o bullying de Tonhão e sua gangue – e agora tem que passar o recreio na biblioteca, escondido.

Turma da Mônica: Lições
Do Contra ( Vinícius Higo) dá muito trabalho ao professor de natação. Imagem: Serendipity Inc/Divulgação

Em outro ponto, mais do que um castigo de uma semana que prende a Mônica em casa, seus pais acreditam que Cebolinha é uma má influência para ela, e o garoto não deve mais vê-la. Da mesma forma, Dona Cebola (Fafá Rennó) e Seu Cebola (Paulo Vilhena) não querem ver mais o menino chegando todo estrupiado em casa – resultado dos seus “planos infalíveis” – e o proíbem de ver a amiga.

E no melhor estilo ‘Vingadores’ no final de ‘Guerra Infinita’, a turminha está separada e derrotada. Mas uma das intenções dos pais das crianças dá certo, e elas começam a fazer novos amigos. A desenhista Marina (Laís Villela) é a primeira a se aproximar da Mônica na nova escola, enquanto Milena (Emilly Nayara) percebe que Magali também precisa de companhia – e talvez um novo amigo, que nem precisa ser humano. Cebolinha troca muitas ideias com Humberto (Lucas Infante) na sala de espera da fono, e o jeito único do Cascão chama logo a atenção de Do Contra (Vinícius Higo).

Turma da Mônica: Lições
Tina (Isabelle Drummond) e Rolo (Gustavo Merighi) são algumas das novidades de ‘Lições’. Imagem: Serendipity Inc/Divulgação

Comparado com a graphic novel, ‘Turma da Mônica: Lições’ corta alguns personagens mas adiciona muitos outros, além de ampliar o escopo narrativo e trazer novas situações. Uma dessas adições é o núcleo inteiro da Tina (Isabelle Drummond), com Rolo (Gustavo Merighi), Pipa (Camila Brandão) e Zecão (Fernando Mais), numa pegada hippie-ecológica, que ajudarão a Mônica nessa caminhada de amadurecimento. O filme também é lotado de referências, que vão desde as mais óbvias, como o próprio Mauricio de Souza comandando a cantina da escola, até as mais obscuras, como a participação da Estrelinha Mágica e a reprodução fiel dos figurinos de ‘Mônica e Cebolinha – No Mundo de Romeu e Julieta’, de 1979.

Ver ‘Turma da Mônica: Lições’ é a melhor forma de garantir que você terá um fim de 2021 (ou começo de 2022) com os olhos cheios de lágrimas, um sorriso besta no rosto e o coração bem quentinho.

Leia também:

Já assistiu aos novos vídeos no YouTube do Olhar Digital? Inscreva-se no canal!