Um estudo que está sendo conduzido por pesquisadores do Departamento de Engenharia Mecânica Paul M. Rady, em parceria com cientistas do Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) da Nasa, desenvolveu um experimento que recria o clima real dos planetas além do nosso sistema solar, conhecidos como exoplanetas.

Ryan Cole, pós-doutorando em engenharia mecânica e coautor do estudo, criou o simulador dentro de um instrumento de 907 kg no laboratório do professor Greg Rieker no campus da Universidade do Colorado, em Boulder, nos EUA.

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Ao atingir as mesmas condições de alta temperatura e alta pressão encontradas em muitos exoplanetas, o instrumento pode mapear os gases em suas atmosferas, o que poderia um dia ajudar a humanidade a encontrar vida em outros planetas.

“Se olharmos para a atmosfera da Terra, sabemos que a vida está aqui porque vemos metano, dióxido de carbono, todos esses marcadores diferentes que dizem que algo está vivendo aqui”, disse Rieker. “Podemos olhar para as assinaturas químicas dos exoplanetas também. Se virmos a combinação certa de gases, pode ser um indicador de que algo está vivo lá”.

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Experimento combina medições com modelos computacionais

Segundo o site Phys, o trabalho de Rieker e Cole pode contribuir para a espectroscopia de trânsito de exoplanetas – um método de pesquisa para observar a composição da atmosfera de um exoplaneta em que os cientistas usam um telescópio para observar a luz que passa por ele. À medida que a luz interage com os gases na atmosfera, esses gases absorvem os fótons conforme eles se movem.

“Os cientistas precisam de um mapa para interpretar o que a luz está nos dizendo quando chega aqui”, disse Rieker. “É aí que entra o experimento de Ryan. À medida que criamos este pequeno microcosmo da atmosfera daquele exoplaneta em nosso laboratório, enviamos nossa própria luz caracterizada com lasers e estudamos os fótons que saem. Podemos medir as mudanças e mapear como a luz é absorvida”.

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As condições de alta temperatura e alta pressão encontradas em exoplanetas são recriadas dentro deste instrumento. Imagem: Universidade do Colorado em Boulder

Esse experimento combina medições de sensores com modelos computacionais para ajudar a detectar os diferentes gases em exoplanetas. 

Enquanto Cole construía o instrumento que replica os climas dos exoplanetas e mede como a luz está sendo absorvida nessas condições exóticas, o laboratório do vice-gerente da seção, Brian Drouin, forneceu a ferramenta que interpreta as medições.

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Essa pesquisa pode otimizar observatórios como o Telescópio Espacial James Webb. “O Telescópio Espacial James Webb e outros, como o Hubble, estão olhando para o horizonte final do que os humanos podem ver”, disse Cole. “Greg e eu estamos tentando deixar suas visões um pouco mais claras. Nossas medições de laboratório podem ajudar a interpretar as observações dos telescópios de atmosferas planetárias distantes”.

Existem extensões infinitas do universo para esses telescópios explorarem – mais de 4,8 mil exoplanetas confirmados e cerca de 7,9 mil mais que estão sob análise da Nasa. Com o experimento de Rieker e Cole incluído na expedição, nossa compreensão dos exoplanetas e dos gases em suas atmosferas pode ser melhorada.

Como funciona o simulador de atmosfera de exoplanetas

“Não existem muitos sistemas por aí que possam alcançar as condições de alta temperatura e alta pressão que alcançamos”, disse Cole. “Não precisamos apenas atingir essas condições, também precisamos que a temperatura e a pressão sejam extremamente uniformes e conhecidas. Atingir esses critérios é um dos aspectos mais exclusivos de nosso experimento”.

Segundo Cole, o tamanho e o escopo do instrumento são o que lhes permite atingir as altas temperaturas e altas pressões que são vistas em exoplanetas. O experimento dentro do equipamento pode chegar a 1.000 graus Kelvin, o que é cerca de 727ºC.

O instrumento tem paredes espessas de aço projetadas para atingir 100 atmosferas. Para colocar isso em contexto, a pressão média da Terra ao nível do mar é uma atmosfera.

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A partir de 2016, quando se juntou ao laboratório de Rieker, Cole teve que trabalhar cerca de cinco iterações da célula de alta temperatura e alta pressão antes de acertar. “Ryan é o primeiro a fazer isso”, disse Rieker. “Ele criou conjuntos de dados realmente próximos da perfeição”.

Uma vez que as condições são alcançadas dentro do instrumento, a equipe envia luz através do experimento de lasers de pente de frequência, uma tecnologia que foi a base da pesquisa ganhadora do Prêmio Nobel da Universidade de Colorado Boulder e do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia. 

De acordo com os pesquisadores, o laser tem centenas de milhares de comprimentos de onda de luz que são muito bem comportados, o que o torna uma ferramenta ideal para estudar as interações luz-matéria.

“Passamos o laser por este ambiente e, ao fazer isso, registramos como a luz do laser interage com o gás que confinamos no núcleo deste experimento único”, disse Cole. “Medimos como a luz foi absorvida em diferentes frequências, o que pode ser usado para interpretar observações de atmosferas exoplanetárias reais”.

Então, essas medições passam pela ferramenta de interpretação do JPL. Esse modelo computacional extrai os parâmetros quânticos fundamentais que permitem à equipe mapear como as moléculas de gás da atmosfera irão interagir com a luz em qualquer condição.

Rieker comparou a relação entre as medições obtidas e os parâmetros que o JPL fornece a um JPEG, o formato padrão para dados de imagem. Enquanto vemos a foto, os dados JPEG são o código, ou conjunto de instruções, para a imagem.

Nesse caso, o equipamento do laboratório de Rieker fornece a foto – as condições do exoplaneta e a luz que passa por sua atmosfera. E a ferramenta JPL fornece o código JPEG – os dados que descrevem como a luz está interagindo com os gases na atmosfera.

Equipamento pode ajudar numa melhor compreensão de Vênus

Segundo Rieker, o trabalho não começou com o objetivo de mapear as atmosferas de exoplanetas. O objetivo original era entender a combustão dentro de um foguete ou motor de aeronave. Ele começou a mapear as emissões provenientes desses motores, o que pode ajudar a sociedade a encontrar maneiras mais eficientes de queimar combustível.

“Acho interessante que você possa ligar as aplicações do instrumento de um motor a jato no Aeroporto Internacional de Denver à atmosfera de um exoplaneta distante da Terra”, disse Cole.

O alcance da função da tecnologia ainda permite que a equipe imite o interior de um motor a jato e mapeie os gases sendo emitidos. Ao construir o equipamento, Cole reconheceu que as condições dentro do motor simulado eram muito semelhantes às condições na superfície de Vênus – alta temperatura e alta pressão.

Vênus é um planeta realmente interessante porque fisicamente, Vênus e a Terra são muito semelhantes em termos de tamanho e densidade”, disse Cole. “Há uma questão em andamento na comunidade científica planetária que diz que você pode fazer uma comparação interessante entre Vênus e a Terra. Vênus nos dá outro ponto de dados sobre como os planetas semelhantes à Terra evoluem?”

Vênus tem uma atmosfera de quase 460ºC e 95 vezes a pressão da atmosfera terrestre. O planeta é completamente inóspito, em grande parte devido ao efeito estufa descontrolado causado pela alta quantidade de dióxido de carbono na atmosfera. O potente gás retém o calor da atmosfera de Vênus, levando a temperaturas superficiais extremamente altas.

Embora a atmosfera da Terra não esteja nem perto dos níveis de dióxido de carbono encontrados em Vênus, os estudos da atmosfera de Vênus podem avançar nas pesquisas sobre mudanças climáticas.

“Nosso equipamento pode ajudar os cientistas a entender melhor Vênus e a evolução das atmosferas que estão cada vez mais sobrecarregadas com dióxido de carbono”, disse Cole. “O experimento pode ajudar a nossa compreensão das atmosferas de planetas semelhantes à Terra com um tamanho de amostra de dois planetas, em vez de apenas um”.

Do interior de um motor à superfície de Vênus e exoplanetas distantes, o objetivo fundamental do trabalho de Rieker e Cole é entender como a luz interage com as moléculas de gás. Não importando o escopo, todas as aplicações das pesquisas de Rieker e Cole, segundo eles, têm o mesmo tema – promover a vida. Aqui ou em outro lugar.

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