Pesquisadores do Observatório Konkoly, em Budapeste, na Hungria, desenvolveram um modelo para analisar o potencial para o afloramento de água líquida na superfície de Marte. De acordo com os resultados, as horas da noite e da manhã durante a primavera e o verão marcianos poderiam ser os momentos ideais para o processo ocorrer, com condições mais favoráveis no hemisfério norte do planeta

Bernadett Pál, estudante de pós-graduação do Centro de Pesquisa em Astronomia e Ciências da Terra da Rede de Pesquisa Eötvös Loránd, é a principal autora do estudo (publicado na revista científica Icarus) junto ao professor Ákos Kereszturi. Eles examinaram o quão efetivamente os sais higroscópicos, que têm capacidade de absorver vapor de água da atmosfera, entram em soluções para formar salmouras.

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Probabilidade de deliquescência para sais percloratos de cálcio e formação de água líquida. Os rótulos marcam as maiores características da superfície e os locais de pouso mais importantes do planeta. Crédito: Pál & Kereszturi

Água líquida é procurada por cientistas para buscar sinais de vida nos planetas

Uma das características que procuramos ao buscar a vida (como a conhecemos) fora da Terra é a água líquida. Marte já teve maiores quantidades de água líquida, mas devido à sua menor gravidade e à falta de campo magnético global, grandes volumes escaparam para o espaço. 

Agora, a água restante no planeta está presente principalmente nas formas de vapor de água e gelo. Por causa do frio (-60°C em média) e da baixa pressão do ar, mesmo que o gelo derreta, ele sublima rapidamente — transformando-se em vapor — em vez de permanecer como um líquido estável na superfície.

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No entanto, segundo os cientistas, soluções salgadas podem permanecer líquidas a temperaturas muito mais baixas. Percloratos, que auxiliam o processo de liquefação, foram encontrados pela sonda estacionária Phoenix e, posteriormente, pelo rover Curiosity. 

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Durante esse processo, chamado de deliquescência, o sal absorve vapor d’água suficiente da atmosfera para se transformar em uma solução líquida. Vários projetos de pesquisa laboratorial na Terra estudam a deliquescência, que é importante em muitas áreas: da ciência alimentar à agricultura.

Rover Rosalind Franklin vai investigar deliquescência em Marte

Como ainda não estão disponíveis dados experimentais in-situ para Marte, o principal método de pesquisa atualmente é a modelagem computacional. O programa ExoMars, da Agência Espacial Europeia (ESA), investigará o processo de deliquescência em Marte, pela primeira vez, em 2023. 

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Rover Rosalind Franklin abrigará o instrumento HABITAbility: Brine Irradiation and Temperature (Habitabilidade: Irradiação e Temperatura) contendo o experimento BOTTLE (sigla em inglês para Transição da Observação da Salmoura para a Experiência Líquida) para inspecionar a deliquescência em Marte. Imagem: ESA/Divulgação

A plataforma russa de aterrissagem Kazachok, que carrega o rover Rosalind Franklin, abrigará o instrumento HABITAbility: Brine Irradiation and Temperature (Habitabilidade: Irradiação e Temperatura) contendo o experimento BOTTLE (sigla em inglês para Transição da Observação da Salmoura para a Experiência Líquida) para inspecionar a deliquescência. 

Tal experimento, no qual os cientistas húngaros também estão envolvidos, examinará as capacidades de formação de salmoura de múltiplos sais. Para que as soluções líquidas salgadas se formem, devem ser atendidas as temperaturas mínimas específicas do sal e os níveis de umidade relativa do ar. Perclorato de magnésio e perclorato de cálcio, os sais modelados no estudo, permanecem líquidos em torno de -70°C se a umidade relativa for alta o suficiente.

“Mal posso esperar pelos primeiros resultados do Experimento BOTTLE-ExoMars. Venho trabalhando na modelagem das possibilidades de formação de água líquida na superfície marciana há anos, e poderemos aprender muito com os primeiros resultados experimentais verdadeiros lá”, disse Pál.

De acordo com os resultados do estudo húngaro, ao simular um ano marciano inteiro, ambos os hemisférios podem se tornar ideais para a deliquescência de perclorato de cálcio desde a primavera local até o final do verão. Segundo Pál, a maior probabilidade é esperada do final da noite até as primeiras horas da manhã, hora local de Marte.

Olhando globalmente para todo o planeta, quase qualquer lugar acima de 30°N de latitude pode ser ideal para o surgimento de salmoura à noite, enquanto nas primeiras horas da manhã as grandes bacias (Acidalia Planitia e Utopia Planitia) são promissoras. 

Um resultado importante adicional é que no local de pouso planejado do rover ExoMars, Oxia Planum, tanto o final da noite quanto as primeiras horas da manhã parecem ideais para a formação de salmoura líquida. Já no hemisfério sul, uma pequena quantidade de líquido poderia emergir após a calota polar recuar.

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