Nesta quarta-feira (23), foi apresentada uma pesquisa na reunião de primavera da American Chemical Society (ACS) que descreve como os cientistas aproveitaram um fungo para converter resíduos de alimentos em couro sintético sustentável, bem como produtos de papel e substitutos de algodão, e com propriedades comparáveis ​​aos materiais tradicionais. 

Será que sua próxima bolsa da moda será feita de “couro de fungo”? Se isso será aplicado tão logo, não se sabe, mas o couro fúngico, segundo seus descobridores, leva menos tempo para ser produzido do que os substitutos já existentes no mercado e, ao contrário de grande parte deles, é 100% de base biológica.

Assim como os têxteis e o couro à base de petróleo, a produção de algodão está associada a preocupações ambientais. Ao mesmo tempo, muita comida vai para o lixo. Diante desse cenário, a Ph.D. pela Universidade de Borås, na Suécia, Akram Zamani, decidiu fazer uso de novos materiais sustentáveis ​​de base biológica derivados de fungos. “Esperamos que possam substituir o algodão ou fibras sintéticas e couro animal, que podem ter aspectos ambientais e éticos negativos”, diz Zamani, principal pesquisadora do projeto. “Ao desenvolver nosso processo, tivemos o cuidado de não usar produtos químicos tóxicos ou qualquer coisa que pudesse prejudicar o meio ambiente”.

Para alimentar os organismos fúngicos, a equipe coletou pão amanhecido de supermercado, que eles secaram e moeram em migalhas. Os pesquisadores misturaram as migalhas de pão com água em um reator em escala piloto e adicionaram esporos da espécie Rhizopus delemar, que normalmente podem ser encontrados em alimentos em decomposição. 

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À medida que esse fungo se alimentava do pão, produzia fibras naturais microscópicas feitas de quitina e quitosana que se acumulavam em suas paredes celulares. Após dois dias, os cientistas coletaram as células e removeram lipídios, proteínas e outros subprodutos que poderiam ser usados ​​em alimentos ou rações

Por sua vez, o resíduo gelatinoso restante, consistindo nas paredes celulares fibrosas, foi então organizado em fios, que poderiam ser usados ​​em suturas ou tecidos para cicatrização de feridas e talvez em roupas.

Alternativamente, células fúngicas foram disponibilizadas na horizontal para serem secas para fazer materiais semelhantes a papel ou couro. Segundo Zamani, os primeiros protótipos de couro fúngico que a equipe produziu eram finos e não flexíveis o suficiente.

Agora, o grupo está trabalhando em versões mais grossas que consistem em várias camadas para imitar mais de perto o couro animal real. Esses compósitos incluem camadas tratadas com taninos derivados de árvores – que dão suavidade à estrutura – combinados com camadas tratadas com álcalis que lhe conferem resistência. 

Além da resistência, a flexibilidade e o brilho também foram melhorados pelo tratamento com glicerol e um aglutinante de base biológica. “Nossos testes recentes mostram que o couro fúngico tem propriedades mecânicas bastante comparáveis ​​ao couro real”, diz Zamani. 

Fio derivado do fungo Rhizopus delemar, que pode ser usado na produção de couro biodegradável. Imagem: Universidade de Borås

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Tipos de couro feitos de fungo disponíveis no mercado não são biodegradáveis

Alguns outros couros fúngicos já chegaram ao mercado, no entanto, poucas informações sobre sua produção foram publicadas, e suas propriedades ainda não correspondem ao couro real, segundo Zamani. 

Pelo que ela pode apurar, os produtos comerciais são feitos a partir de cogumelos colhidos ou de fungos cultivados em uma camada fina sobre restos de alimentos ou serragem por fermentação em estado sólido. 

Segundo Zamani, esses métodos exigem vários dias ou semanas para produzir material fúngico suficiente, enquanto o fungo submerso em água leva apenas alguns dias para produzir a mesma quantidade de material. Alguns outros pesquisadores também estão experimentando o cultivo submerso, mas em uma escala muito menor do que os esforços da equipe de Zamani.

Além disso, alguns dos couros fúngicos já disponíveis no mercado contêm revestimentos prejudiciais ao meio ambiente ou camadas de reforço feitas de polímeros sintéticos derivados do petróleo, como o poliéster. Isso contrasta com os produtos da equipe da Universidade de Borås, que consistem apenas em materiais naturais e, portanto, serão biodegradáveis.

Zamani diz que sua equipe está trabalhando para refinar ainda mais seus produtos fúngicos. Eles também começaram recentemente a testar outros tipos de desperdício de alimentos, incluindo frutas e legumes. Um exemplo é a pasta que sobra após o suco ser espremido da fruta. “Em vez de ser jogada fora, poderia ser usada para o cultivo de fungos”, diz a cientista. “Portanto, não estamos nos limitando ao pão, porque esperamos que venha um dia em que não haja desperdício de pão”.

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